Ciência
Camila RuzBBC News Magazine
No centro do Oceano
Ártico ainda há um polo a ser conquistado. E agora uma equipe britânica planeja
uma viagem de mais de 1.000 km para ser a primeira a atingir o lugar mais
remoto do mundo.
Chega-se a esse ponto cruzando uma camada espessa de gelo que cobre um
oceano de até 5,5 km de profundidade. As temperaturas podem atingir -50Cº no
inverno e é escuro de outubro a março.
A expedição do próximo ano será a terceira tentativa de Jim McNeill's
nesse polo. As duas viagens anteriores do explorador não saíram como
planejadas. Na primeira vez, uma infecção por uma bactéria comedora de carne o
manteve no acampamento base.
Na segunda tentativa, em 2006, ele caiu no gelo depois de uma
tempestade. "Os três dias seguintes foram horríveis", ele diz.
"A camada de gelo de três metros e meio estava quebrando de forma
contínua, e dormir se tornou um problema real."
McNeill chegou a 270 km da última porção de terra, mas com o chão se
desintegrando, foi obrigado a interromper a jornada.
Antártica
Na outra extremidade da Terra, na Antártida, também há o ponto mais
distante da costa. Por causa de discordâncias sobre o local em que a costa
acaba, exploradores viajaram a diferentes locais em busca do Polo Sul de
Inacessibilidade.
A tradição diz que esse ponto foi atingido pela primeira vez no final
dos anos 1950, por uma expedição russa. A equipe montou uma estação de pesquisa
no local, com um busto do líder comunista Vladimir Lênin (1870-1924). Quando o
local foi revisitado em 2007, a cabana estava soterrada e apenas a estátua
aparecia em meio à neve.
Enquanto outras equipes alcançaram o Polo Sul de Inacessibilidade, o
Polo Ártico se mostra mais difícil de alcançar. Considerava-se que o explorador
polar australiano Hubert Wilkins havia sobrevoado o ponto em 1927.
O explorador britânico Wally Herbert pensou ter alcançado o local a pé
durante sua jornada de 5,9 mil km pelo Oceano Ártico congelado nos anos 1960.
Mas o polo estava no lugar errado.
McNeill foi o primeiro a suspeitar que as coordenadas estavam erradas.
Um grupo de cientistas seguiu suas pistas, usando dados de satélite para obter
um panorama mais nítido da área.
"Acredite ou não, mas a linha da costa do Ártico até o final dos
anos 1990 e começo dos anos 2000 ainda tinha grandes erros por causa de
mapeamentos incorretos de longa data", afirma Ted Scambos, do Centro
Nacional de Neve e Gelo dos EUA, que participou do estudo.
Eles descobriram que o Polo Norte de Inacessibilidade estava a 214 km de
distância do ponto antigo. Deveria ter sido um erro simples de detectar, diz
Gareth Rees, do Instituto de Pesquisa Polar Scott, na Inglaterra, que ajudou a
calcular a nova localização.
Se você imaginar o maior círculo possível de desenhar em qualquer
oceano, o polo de inacessibilidade está no centro, diz Rees. Ele tocará a terra
em três pontos, e esses locais definem o polo. No entanto, os velhos mapas
apenas mostravam dois pontos, então estavam errados. "É um mistério que
não resolvemos."
A Conquista do Polo Norte
O americano Robert Peary (1856-1920) reivindicou a descoberta do Polo
Norte em 1909 (foto), mas hoje muitos questionam a precisão de sua navegação.
A primeira jornada comprovada foi feita pelo norueguês Roald Amundsen e
pelo americano Lincoln Ellsworth; eles sobrevoaram o polo em 1926.
Os primeiros exploradores a alcançarem o polo integravam uma expedição
soviética de 24 pessoas em 1948.
A primeira conquista comprovada do Polo Norte foi realizada por uma
equipe britânica liderada por Wally Herbert (1934-2007) em 1969.
As novas coordenadas do Polo Norte de Inacessibilidade foram anunciadas
em 2013. Ninguém até hoje atingiu o local de forma deliberada. A escala do
desafio pode ser desconcertante para muitos.
"O gelo pode formar grandes montanhas", diz Nick Cox, da
operação britânica da Antártica e gerente da estação ártica do Reino Unido.
"Sempre há a possibilidade de cair por entre o gelo."
As jornadas até os polos extremos são diferentes. "Na Antártica é
uma longa e gelada jornada de ski cross-country, mas no Ártico é como uma
corrida de obstáculos", explica Scambos.
Nova jornada
Isso não desanimou McNeill a planejar sua terceira
tentativa. Em 2016, um time de voluntários em seu projeto Ice Warrior
(Guerreiro do Gelo) irá dar a largada em seus qajaqs - um
misto de trenó e canoa.
Se tudo correr bem, eles levarão 80 dias para atingir o objetivo. Eles
medirão o gelo no caminho para colher dados sobre como ele está se desfazendo.
Também registrarão a presença de ursos polares, embora ainda não saibam quantos
aparecerão na rota.
"Eu não chamaria a região de um lugar inóspito", diz Donatella
Zona, uma ecologista especializada no Ártico da Universidade de Sheffield. Mas
não há conhecimento suficiente sobre a biodiversidade do Ártico, em parte pela
dificuldade de realizar pesquisas de campo. "É muito duro. São meses de
escuridão completa e temperaturas de -40Cº a -50Cº", ela diz.
A corrida para estudar o Ártico em meio a mudanças climáticas está se
tornando mais urgente. Há quem diga que o Polo de Inacessibilidade não será
inatingível por muito tempo. Há diferentes previsões sobre quando não haverá
mais gelo de verão no Oceano Ártico, tornando a navegação na região mais fácil.
Mas as mudanças no gelo também tornam o polo mais difícil de alcançar a
pé. A camada de gelo está ficando mais fina e o terreno, mais instável.
"Cada vez mais eu penso que as pessoas não irão nem tentar fazer coisas
como cruzar o Ártico", afirma Scambos.
McNeill e sua equipe irão começar a jornada durante o inverno no
hemisfério norte, e esperaram conseguir cruzar o gelo antes que ele comece a
quebrar. Mas precisarão se apressar no meio da escuridão, porque a rota até o Polo de Inacessibilidade está derretendo.
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