terça-feira, 13 de outubro de 2015

SEMELHANÇAS ENTRE AS CRISES DE 1930 E 2015 NO BRASIL

  



Colaboração de Fernando Alcoforado*

As crises política e econômica que abalam o Brasil no momento apresentam algumas semelhanças com aquelas que ocorreram em 1930 e levaram à deposição do então presidente da República Washington Luis. A crise política em 1930 foi produto do esgotamento do regime oligárquico inaugurado em 1889 com a Proclamação da República e a crise econômica foi consequência do esgotamento do modelo agroexportador existente no Brasil desde o período colonial que sofreu duro golpe com a crise econômica mundial de 1929. Por sua vez, a crise política de 2015 no Brasil é produto do esgotamento do contrato social instituído com a Constituição de 1988 e a crise econômica atual é consequência do esgotamento do modelo econômico neoliberal dependente do exterior em vigor desde 1990 e está sofrendo também as consequências da crise econômica de 2008 que eclodiu nos Estados Unidos e se espraiou pelo mundo.


A deposição de Washington Luís da presidência da República do Brasil ocorreu em 1930. O fim do regime oligárquico esteve relacionado tanto à crise econômica que assolou o Brasil, principalmente após a quebra da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, quanto à crise política no contexto da própria oligarquia que comandava o Poder Executivo Federal. A quebra da Bolsa de Nova Iorque, em outubro de 1929 e a subsequente Grande Depressão influenciaram diretamente o declínio da economia brasileira, já que o café representava ¾ das exportações brasileiras e, por conta da crise econômica mundial, o País estava em precária situação financeira. O resultado foi uma profunda crise na economia brasileira, que se refletiu também nas alianças políticas da própria oligarquia agrária do país. Washington Luís não atendeu ao pedido de salvação econômica exigida pelos fazendeiros do café que haviam sofrido os prejuízos com a queda do preço do produto no mercado internacional. Com isso, acabou cultivando uma insatisfação de sua base de apoio política.

Na relação com as oligarquias dos demais estados, o fato de ter indicado outro paulista para sua sucessão, Júlio Prestes, resultou no abandono da aliança com os políticos de Minas Gerais, conhecida como política do “Café com Leite”. Frente a essa situação, foi formada a Aliança Liberal, cuja chapa, encabeçada por Getúlio Vargas, era composta pelos oposicionistas de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, com uma plataforma política que buscava atrair os interesses das camadas urbanas do Brasil. A eleição de 1930 que resultou na eleição de Júlio Prestes foi considerada fraudulenta, fato este que fez com que as alas mais radicais da Aliança Liberal iniciassem um processo de conspiração com vistas à derrubada do presidente Washington Luís. A conspiração ganhou força após o assassinato de João Pessoa, candidato a vice-presidente, em Recife. À época, havia denúncias de que este crime havia sido ordenado por Washington Luís.

Os membros da Aliança Liberal conseguiram o apoio de parte dos oficiais que haviam participado do movimento tenentista, nome dado ao movimento político-militar e à série de rebeliões de jovens oficiais de baixa e média patente do Exército Brasileiro no início da década de 1920, descontentes com a situação política do Brasil. Em outubro de 1930, as movimentações militares iniciaram-se em Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, com a tomada do poder nesses estados. Em 24 de outubro de 1930, as forças militares no Rio de Janeiro conseguiram a deposição de Washington Luís, passando a 2 ocupar provisoriamente o cargo de presidente o gaúcho Getúlio Vargas. Era o fim da República Oligárquica ou República Velha e o início da Era Vargas.

A grave crise econômica que afetava o Brasil foi enfrentada e superada pelo governo Getúlio Vargas. O modelo agrário-exportador foi substituído pelo modelo nacional desenvolvimentista depois da Revolução de 1930, quando Getúlio Vargas sobe ao poder e inicia o período de industrialização no Brasil. Vargas baseou sua administração nos preceitos do populismo, nacionalismo e trabalhismo. A política econômica passou a valorizar o mercado interno, o que favorecia o crescimento industrial e, consequentemente, o processo de urbanização. A Era Vargas marca, portanto, a mudança dos rumos da República, transferindo o núcleo do poder político da agricultura para a indústria. No entanto, a crise política que levou Getúlio Vargas ao poder através de um golpe de estado resultou na implantação de um regime de exceção sob seu comando, que ficou conhecido como o “Estado Novo”, que só terminou em 1945.

Na era contemporânea, a catástrofe que se registra hoje é o produto da crise quase terminal dos sistemas político e econômico do Brasil. A crise política que abala o Brasil resulta da falência do modelo político aprovado na Constituinte de 1988. A falência do modelo político do Brasil está configurada no fato do presidencialismo em vigor ter fracassado totalmente e ser gerador de crises políticas e institucionais, o sistema político do País estar contaminado pela corrupção e a democracia representativa no Brasil manifestar sinais claros de esgotamento não apenas pelos escândalos de corrupção nos poderes da República, mas, sobretudo, ao desestimular a participação popular nas decisões do governo.

A gigantesca crise econômica em que se defronta o Brasil no momento resulta da falência do modelo econômico neoliberal e antinacional. Este modelo faliu no Brasil depois de provocar uma verdadeira devastação na economia brasileira de 1990 a 2014 configurada no crescimento econômico pífio, no descontrole da inflação, nos gargalos existentes na infraestrutura econômica e social, na desindustrialização da economia brasileira, na explosão da dívida pública e na desnacionalização da economia brasileira. Na tentativa de superar a crise econômica, o governo Dilma Rousseff decidiu adotar uma política extremamente recessiva que já está se traduzindo na estagnação da economia, no aumento da dívida pública, no desequilíbrio das contas externas e também no desemprego em massa. A estagnação econômica que atinge o Brasil, além de comprometer os lucros dos capitalistas, elevar o desemprego e afetar negativamente a distribuição da renda, já está reduzindo as receitas do Estado que está a exigir cortes no orçamento do governo e o aumento de impostos.

Nessas circunstâncias, nenhum investidor interno e externo investiria no Brasil com uma economia estagnada como se encontra no momento. A estagnação da economia brasileira em que se encontra faz com que ocorra também queda da arrecadação do governo em todos os níveis o que implica em não haver recursos públicos para investimento em quantidade suficiente para investir na infraestrutura econômica e social. Devido a tudo isto, Dilma Rousseff está perdendo progressivamente o apoio das classes dominantes e também das classes sociais subalternas que está se traduzindo nos baixíssimos índices de popularidade do governo. É preciso deixar bem claro que, para poder governar, todo governo deve buscar assegurar os ganhos dos capitalistas e a melhoria do bem estar material da população. E, para melhorá-lo, o governo precisa promover o desenvolvimento econômico para viabilizar a acumulação do capital e gerar emprego e a renda para a população.

A governabilidade do Brasil e a economia brasileira estão em risco porque o governo Dilma Rousseff não conta com o apoio da grande maioria da população e de suas diversas classes sociais, além de não possuir maioria parlamentar para implementar suas políticas. É preciso observar que a governabilidade diz respeito à capacidade política do governo de decidir, possibilitando a realização de políticas públicas. Dilma Rousseff não reúne nenhuma dessas condições para governar a nação. Esta situação só será revertida com a existência no Brasil de um governo que seja capaz de unir a nação em torno de um projeto comum de desenvolvimento econômico, político e social e seja constituído por gente competente no comando da nação.

Diante da incapacidade do governo Dilma Rousseff de evitar o caos econômico e social em curso que tende a levar a economia brasileira à bancarrota e ao incremento das desigualdades sociais, assegurar a governabilidade política do País e unir a nação em torno de um projeto comum de desenvolvimento, tornar-se-á cada vez mais improvável sua permanência no poder. Diante da gravíssima crise política do Brasil cujo governo sangra sem ter condições de se manter no poder diante da rejeição da imensa maioria da população e da gravíssima crise econômica que está levando o País à bancarrota, urge a substituição do governo Dilma Rousseff por um outro que seja capaz de liderar a celebração de um novo contrato social e unir a nação brasileira em torno de um projeto comum de desenvolvimento. Tudo leva a crer que se Dilma Rousseff não for destituída através de impeachment pelos crime de responsabilidade fiscal ou crime eleitoral, como ocorreu com a eleição de Júlio Prestes em 1930, sua deposição poderá acontecer, da mesma forma que em 1930, através de golpe de estado com o agravamento das crises política e econômica.


* Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).

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