Ciência e tecnologia
Molly
FlattDa BBC Earth
Image copyright Image caption Especialistas acreditam em uma colaboração cada vez maior entre
tecnologia e natureza
É muito fácil pensar na
natureza e na tecnologia como duas entidades imersas em uma luta de boxe que já
dura séculos e que está para terminar em nocaute a qualquer instante.
Selfies
atrapalham a vista de um belo pôr do sol. Centenas de milhares de toneladas de
"e-lixo" tóxico são despejadas em rios e pântanos a cada ano. Nomes
de plantas e animais perdem protagonismo nos dicionários para dar lugar a
termos como "banda larga" e… "selfie".
Reclamamos
da invasão do wi-fi nos lugares mais remotos, mas declaramos o acesso à
internet como um direito humano. Repudiamos a caça ilegal, mas acabamos
ajudando bandidos a encontrar animais raros através de nossas postagens nas
mídias sociais. Sonhamos em relaxar uma tranquila praia das Maldivas, mas
exigimos voos baratos e nada ecológicos para chegar até lá.
Não há dúvidas dos motivos por trás desses
conflitos. Como o filósofo científico Christopher Potter afirma, em seu livro How To Make a Human Being (Como fazer um ser
humano, em tradução literal): "O ser humano nunca fez parte da natureza.
Sempre fizemos parte da tecnologia".
Desejo natural por inovação
A
partir do momento em que o homem moderno conseguiu controlar o fogo, ele nos
colocou no caminho de dominar o mundo. E nunca mais olhamos para trás.
A
tecnologia é simplesmente um conjunto de estratégias que nossa espécie
desenvolveu para poder lidar com o fato de ser uma criatura consciente de si
mesma em um planeta caótico e frequentemente hostil.
Isso
torna nossa vontade de inovar algo tão "natural" quanto a estrutura
de nossos cérebros.
Cada
vez mais sacrificamos nosso habitat natural em prol da satisfação instantânea
da mudança e da solução rápida para problemas econômicos e políticos.
Natureza inspiradora
Mas
apesar de muitas de nossas invenções digitais servirem para nos distanciar do
mundo que elas deveriam melhorar, a tecnologia e a natureza também estão
continuamente se alimentando mutuamente, de maneiras altamente positivas.
Pensemos,
por exemplo, no campo da biomimética, em que elementos e processos naturais são
usados como modelo para o desenvolvimento de novos materiais, equipamentos e
ferramentas.
Um
famoso exemplo é a invenção do velcro pelo engenheiro suíço Georges de Mestral,
em 1941, depois que ele observou como algumas plantas das montanhas se
agarravam a suas roupas e aos pelos de seu cão.
Entre
os avanços mais recentes nessa área estão: a criação de um fita adesiva
cirúrgica pós-parto que se molda na estrutura das teias de aranha; a imitação
do vírus para criar nano partículas que se rearranjam sozinhas e levam
medicamentos diretamente a células cancerígenas; ou ainda uma supereficiente
tela para livros eletrônicos, refletiva e colorida baseada na maneira como as
asas de borboleta cintilam sob a luz forte.
Tecnologia para preservação
Além
disso, a tecnologia é cada vez mais utilizada para ajudar projetos de
preservação e sustentabilidade. Um deles é o Technology for Nature, idealizado
pela Universidade de Londres, a Sociedade Zoológica de Londres e a Microsoft.
Entre
as iniciativas do projeto estão um serviço de "nuvem" digital
gratuito e rápido que permite que especialistas acessem dados precisos de
mudanças climáticas de qualquer região do mundo, ou ainda o desenvolvimento de
novos aparelhos para registrar o comportamento de animais em seus habitats.
Lucas
Joppa, um dos gerentes do projeto, admite que ainda há desafios em se unir
cientistas de disciplinas tradicionalmente vistas como opostas. "A
linguagem, a terminologia e as motivações são diferentes. Praticamente
tudo", brinca.
"Mas
temos questões de preservação ambiental que precisam ser combatidas
imediatamente, como o monitoramento de áreas protegidas, o rastreamento de
espécies de alto valor comercial e a detecção online do comércio ilegal de
plantas e animais", explica.
Para
Joppa, a tecnologia teve mais impacto positivo do que negativo sobre a natureza
nos últimos dez anos.
Obviamente,
a natureza não é só pandas e florestas, e a tecnologia está também ajudando a
domar seu lado mais cruel. Tuítes e fotos do Instagram com hashtags e geotags
se tornaram uma maneira valiosa de compartilhar atualizações em tempo real
sobre desastres naturais.
O
Person Finder, do Google, criado para reunir parentes durante o tsunami de 2011
no Japão, está atualmente ativo no Nepal. E nos Estados Unidos o aplicativo da
Agência Federal de Gerenciamento de Emergências permite que comunidades
atingidas por catástrofes consigam fazer um financiamento coletivo para obter
mantimentos.
Fora
tudo isso, ainda temos o conceito das "cidades verdes". Imagine
arranha-céus transformados em lavouras verticais, com plantações forrando o
teto e as paredes; metros quadrados vazios sendo usados para cultivar
biocombustíveis à base de algas; e árvores capazes de iluminar ruas à noite
como resultado de genes bioluminescentes.
Apreço pessoal pelo planeta
Claramente,
as notícias não são ruins em matéria de unir tecnologia e natureza em grande
escala. Mas como esse cabo de guerra está nos atingindo pessoalmente?
Considerando
a natureza viciante das plataformas digitais, é difícil às vezes contestar a
crença de Potter de que "a tecnologia evolui para uma vida entre quatro
paredes". E quando nós finalmente nos aventuramos lá fora, celulares e
outros aparelhinhos conseguem nos manter presos em nosso próprio mundo, mesmo
diante da mais bela paisagem.
Mas,
na realidade, está surgindo todo um ecossistema de softwares que têm por
objetivo intensificar nosso apreço pelo planeta em que vivemos: de aplicativos
que usam tecnologia de reconhecimento facial para identificar espécies de
árvores a outros que nos ensinam a nos reconectarmos com o meio ambiente.
A
tecnologia também nos ajuda a contribuir com a preservação ambiental. Serviços
de compartilhamento de carros ou aparelhos que monitoram o gasto energético de
uma casa são apenas o começo.
O
tecnologista Kevin Kelly acredita que a tecnologia é "uma força da
natureza", que evolui seguindo os mesmos princípios de qualquer espécie
viva.
Talvez
ele esteja certo. Ou talvez a natureza, assim como a humanidade, seja uma
espécie de tecnologia misteriosa.
De
qualquer forma, precisamos parar de ver as duas coisas como rivais e nos
concentrarmos em fazer com que eles se tornem parceiros.
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