História
Publicado por Francisco Ladeira,
é especialista
em Ciências Humanas: Brasil, Estado e Sociedade pela Universidade Federal de
Juiz de Fora (UFJF), articulista do Observatório da Imprensa e professor de
Geografia do Colégio Conexão em Barbacena,MG.
É demasiadamente
simplista conceber o maior conflito armado de nosso subcontinente como
consequência exclusiva da vontade do imperialismo britânico, como se Brasil,
Argentina e Uruguai fossem simples marionetes de Londres, prontas para acatar
incondicionalmente todas as ordens vindas do outro lado do Atlântico.
Geralmente, boa parte dos estudos históricos
são fortemente marcados pelo perfil ideológico do pesquisador. Um bom exemplo
dessa prática parcial pode ser encontrado na bibliografia disponível sobre a
Guerra do Paraguai (1864-1870), considerado o maior conflito armado da América
do Sul, envolvendo, de um lado, a Tríplice Aliança (Brasil, Argentina e
Uruguai) e, de outro lado, o Paraguai.
Segundo interpretações conservadoras, a
Guerra do Paraguai é consequência direta do expansionismo territorial
idealizado por um ditador paraguaio insano, Francisco Solano Lopes, que
precisava ser combatido. Sendo assim, de acordo com essa perspectiva, coube aos
governos brasileiro, argentino e uruguaio a heróica tarefa de defender seus
respectivos territórios das investidas do país guarani.
Em contrapartida, para as linhas
interpretativas marxistas, a Guerra do Paraguai foi induzida pelo imperialismo
britânico. Como a nação de Solano Lopes aspirava uma via alternativa de
desenvolvimento econômico independente das grandes potências da época, o
governo de Londres, com o intuito de extirpar o “mau exemplo paraguaio”, armou
os exércitos da Tríplice Aliança para lutar contra o Paraguai.
O resultado dessa empreitada bélica é do
conhecimento de todos: passados mais de cem anos, o Paraguai ainda não
conseguiu se recuperar das enormes perdas humanas e materiais.
Todavia, é importante evitar interpretações
maniqueístas e simplórias sobre os fatos históricos. Evidentemente, Solano
Lopes não era apenas um “ditador insano”. Em seu governo, o Paraguai atingiu
respeitáveis índices de desenvolvimento econômico e social.
Por outro lado, é demasiadamente simplista
conceber o maior conflito armado de nosso subcontinente como consequência
exclusiva da vontade do imperialismo britânico, como se Brasil, Argentina e
Uruguai fossem simples marionetes de Londres, prontas para acatar
incondicionalmente todas as ordens vindas do outro lado do Atlântico.
O contexto histórico em questão é muito mais
complexo. Como Solano Lopes queria transformar a sua mediterrânea nação em
potência regional, era inevitável garantir um acesso ao mar, via Bacia Platina.
É exatamente nesse ponto que os interesses guaranis se chocavam com os seus
vizinhos.
Para a Argentina, garantir a soberania sobre
a região do Rio da Prata e seus afluentes era uma questão primordial para as
suas pretensões geopolíticas. Já o Uruguai relacionava o controle do lado
oriental da foz do Rio da Prata à sua própria sobrevivência enquanto
Estado-Nacional. Por fim, o Brasil dependia do acesso aos rios da Bacia Platina
para ligar algumas áreas da atual região centro-oeste ao restante do país.
Enfim, apesar da importante particpação
britânica, consideramos ser mais prudente analisar a Guerra do Paraguai como
uma disputa por territórios geopoliticamente estratégicos. Não há como
negligenciar a questão espacial nesse tipo de conflito. Desse modo, não foi por
acaso que Yves Lacoste já dizia que a geografia serve, em primeiro lugar, para
fazer a guerra.
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