Operação Lava-Jato
Prisão de líder do Governo no Senado
embaralha mais uma vez o tabuleiro político
O líder do governo não poupou a própria
presidente
RODOLFO BORGES / AFONSO BENITES, São Paulo,
Para El País – O JORNAL GLOBAL
Delcídio
do Amaral entre colegas em sessão do Senado do dia 24 de novembro. / JEFFERSON RUDY (AGÊNCIA SENADO)
Não há
analista político no Brasil que se arrisque hoje a fazer previsões de mais de
uma semana sobre os rumos da crise em Brasília. Os mais ousados podem até
ensaiar análises de maior fôlego, de um mês ou até um semestre, mas sempre com
a mesma ressalva: tudo pode mudar por conta da Operação Lava Jato. Nesta quarta-feira, a operação que surgiu de uma investigação sobre lavagem de dinheiro embaralhou o tabuleiro
político do país mais uma vez, com a prisão do líder do Governo Dilma Rousseff
no Senado, Delcídio do Amaral (PT), e do banqueiro André Esteves, do BTG
Pactual. O Governo da presidenta Dilma Rousseff, que desfrutava de um certo alívio com as pressões pelo impeachment
arrefecendo até pelo menos o ano que vem, voltou a mergulhar na crise e pode
ter ainda menos chances de aprovar qualquer medida no Parlamento neste ano.
O Senado era
considerado uma ilha de tranquilidade para o PT, ao contrário da Câmara, onde a
base governista é bastante frágil. Até o furacão Delcídio. A prisão do
líder do Governo na Casa inaugurou as detenções da Lava Jato no âmbito da
Procuradoria Geral da República, de onde o procurador-geral Rodrigo Janot
comanda as ações. Desde a divulgação da "lista do Janot", esse é o primeiro grande evento
da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Marca uma nova fase e ameniza o
receio daqueles que imaginavam que, fora da Curitiba do juiz Sérgio Moro, a operação não seguiria com o mesmo ímpeto.
De acordo
com o regimento interno do Senado, a votação em que os senadores decidirão se
acatam ou não a decisão do STF de prender Delcídio por interferência nas
investigações da Lava Jato é secreta. Mas os governistas foram derrotados e a
votação será nominal, mas não havia ocorrido até a publicação desta reportagem.
A prisão do
senador volta a colocar o Governo Dilma Rousseff e principalmente o PT no
centro da Operação Lava Jato. O caso de fundo que levou o senador petista à
prisão é a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, fechada durante
o Governo Lula e enquanto a então ministra-chefe da Casa Civil Dilma Rousseff
presidia o Conselho de Administração da Petrobras. O senador Humberto Costa
(PT) admitiu que o Palácio do Planalto "está preocupado" com a
questão, mas disse que "nós temos aí assuntos muito importantes que estão
pautados e não queremos que essa pauta seja interrompida por esse fato".
O PT
divulgou nota para dizer que "nenhuma
das tratativas atribuídas ao senador têm qualquer relação com sua atividade
partidária, seja como parlamentar ou como simples filiado"; (um eufemismo que admite os crimes
cometidos pelos petistas já condenados e acirradamente considerados vítimas em
processos anteriores), que "por isso mesmo, o PT não se julga
obrigado a qualquer gesto de solidariedade" aos já condenados. Já a presidenta Dilma não
comentou o assunto, e o Palácio do Planalto se limitou a informar em nota que a
escolha do novo líder no Senado será feita na próxima semana. Dilma se
preparava para um dia de reuniões tranquilas quando se deparou com a
notícia-bomba de que seu principal representante no Senado tinha acabado de ser
preso no hotel em que mora em Brasília, o Golden Tulip. Foi o sinal de que,
apesar da calmaria prevista para os próximos dias, com o arrefecimento do
pedido de impeachment e o foco quase exclusivo em Eduardo Cunha, tinha ido para o espaço.
As
audiências que seriam abertas à imprensa, como a prevista seleção brasileira de
handebol feminino, se fecharam. Entre membros do Governo, a justificativa em
tom de brincadeira era que ela havia acabado de se deparar com uma nova doença,
a gripe Delcidis, e, por essa razão, não queria dar declarações
públicas. Assim, ao invés de se preparar para a viagem a Paris, onde
participará da COP-21, na próxima semana, e uma visita de Estado ao Japão, a
presidenta terá de apagar o incêndio que acometeu o Legislativo. Reuniu-se com
quatro vice-líderes, ministros e conselheiros políticos para analisar as
responsabilidades do caso.
Com a prisão de Delcídio e a Lava
Jato avançando sob o núcleo político a cada dia, a crise só tende a se
amplificar, ainda mais levando em conta que há outros dez senadores
investigados pela Polícia Federal pelo mesmo escândalo. Para a consultoria
Eursia, as prisões de Delcídio, Esteves e do pecuarista José Carlos Bumlai, próximo do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sugerem que os investigadores
estão focando seus esforços em torno da Petrobras. Segundo os analistas da
consultoria, essas prisões devem levar a novas informações, agravando as
consequências da Operação Lava Jato para a estatal. Consequentemente, é de se
esperar o prolongamento das indefinições políticas e surpresas para o Governo a
partir das investigações — talvez essa seja a única certeza da política
brasileira para o próximo ano.
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