segunda-feira, 14 de março de 2016

SOBRE O ATO DE ESCREVER E A IRREVERÊNCIA DO ESCRITOR

Arte cinematográfica


Publicado por Sílvia Marques
“Sou paulistana, escritora, idealista em crise, bacharel em Cinema, cinéfila, professora universitária com alma de aluna, doutora em Comunicação e Semiótica, autodidata na vida, filósofa de botequim, com a alma tatuada de experiências trágicas, amante das artes , da boa mesa, dos vinhos, de papos loucos e ideias inusitadas”. 





Muitas vezes, quando um autor diz o que as pessoas não querem ouvir, tocando em temas doloridos e polêmicos, desmascarando as hipocrisias cotidianas, lutando contra as mentiras afetivas, ele gera reações desproporcionais de cólera. Porém, colocar o dedo na ferida faz parte da rotina de quem encara o ato de escrever como algo que extrapola o prazer ou um mero ofício ou passatempo.


Cena do filme Spotlight

Spotlight, vencedor do Oscar de melhor filme 2016, nos faz pensar na importância do Jornalismo investigativo para sacudir e denunciar estruturas perigosas de poder. Para tirar da zona de conforto sistemas injustos, corruptos e cruéis.

Porém, neste artigo, pretendo ir além do Jornalismo investigativo e englobar a figura do escritor de um modo geral. O ato de escrever é um ato de rebeldia. Todo escritor que se preze é um rebelde, é um irreverente, um transgressor. Todo escritor que se preze é um denunciador do seu tempo.

É alguém que enxerga além do verniz das aparências e mergulha nas profundezas da natureza humana, tão complexa e paradoxal. É alguém que percebe as nuances da linguagem e molda as palavras, transformando-as em imagens, sons, gritos, gemidos, cores. Todo escritor que se preze é uma espécie de tradutor. Sim, tradutor dos sentimentos, angústias, obsessões, mazelas de seu tempo. O escritor traduz em palavras o que sentimos, o que nos angustia, o que nos move e nos paralisa e que muitas vezes não conseguimos compreender, muito menos expressar e transformar.

Muitas pessoas enxergam o escritor como uma figura glamorosa, usando óculos de vista e lançando um olhar blasé para o nada. A figura do escritor está muito associada a lançamentos literários, noites de autógrafos, prêmios, o prazer de ver um livro pronto e publicado nas prateleiras das livrarias.

Porém, os bastidores da vida de quem escreve regularmente, como uma missão, pode ser bem penosa, pois apesar do prazer de escrever, existe algo muito pesado na vida de um escritor: a necessidade de sair da zona de conforto para que as outras pessoas também deixem a zona de conforto.

Muitas vezes, quando um autor diz o que as pessoas não querem ouvir, tocando em temas doloridos e polêmicos, desmascarando as hipocrisias cotidianas, lutando contra as mentiras afetivas, ele gera reações desproporcionais de cólera. Porém, colocar o dedo na ferida faz parte da rotina de quem encara o ato de escrever como algo que extrapola o prazer ou um mero ofício ou passatempo.

Sim, escritores precisam incomodar. Por meio da compreensão gerada nos leitores, estes podem expressar e transformar tanto suas realidades íntimas e privadas quanto as coletivas. Um escritor que se preze é um agitador, um subversivo. Alguém que luta pelas minorias, que combate estereótipos, que quebra paradigmas, que se engalfinha com o status quo e denuncia que o rei está nu.


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