Publicado por Gisele
Regina
“Estudante de Letras Língua Portuguesa e Literaturas; escritora
entusiasta, virginiana, cristã-espírita, super organizada, detalhista pra
caramba e muito sonhadora. Também é apaixonada por músicas que a fazem tirar os
pés do chão; por livros, natureza (pássaros), chá e caderno.”
Franz Kafka era um
escritor de grande influência em sua época devido às suas autobiografias. Em se
tratando da vida pessoal não se pode comprovar o que é ficção ou realidade na
versão kafkiana, uma vez que seus escritos são recheados de emoções
“engaioladas” e a afetividade não passava de um freio veloz na hora de expô-la
oralmente.
O escritor tcheco tinha a escrita como
ferramenta de escape da realidade tão inflamada, a fim de purgar tais emoções
como: mágoas, ódios, amores, sonhos e assim por diante. E tudo isso porque
'falar' fosse a parte mais difícil em se tratando de afetividade. Às vezes, a
melhor forma de fugir dos problemas, ou até mesmo de não criar outros, é não
dar toda importância às emoções, aos sentimentos e às paixões existentes,
quando se trata de ter que demonstrar ao outro. No caso de Kafka não havia
jeito de demonstração de afeto.
Na personagem de Gregor em Metamorfose ele
se dedica ao trabalho burocrático e a difícil relação com o pai. Bem como o
crítico Walter Benjamin diz: “O mundo das chancelarias e dos arquivos, das
salas mofadas, escuras e decadentes, é o mundo de Kafka”. O escritor tcheco
veste em sua personalidade a introspecção simbólica, depressiva e deveras
abstrata, à medida que se utiliza de figuras de linguagem, que seriam mais uma
forma de não expor a real situação do seu universo particular. E como se fossem
mensagens em códigos para quem quisesse por livre e espontânea vontade o
entender, já que compreender seria impossível. Além disso, ainda em Metamorfose,
Gregor é o inseto que Kafka sente ser com a relação a figura paterna nostálgica
e cancerígena, porque seu estado de espírito nunca fica em harmonia quando se
trata de se dirigir a seu genitor, há uma doença interna que o deprime em consequência
da falta de diálogo e afeto.
Kafka parece que preferia morrer de sofrer em
seu abandono costumeiro do que enfrentar o homem que o colocou ao mundo. E qual
seria o sentido do medo de Kafka? Seria hábito da época ou comprometimento com
as regras sociais para manter as aparências? Já que ambos mantinham distância
em Metamorfose: seu pai por repulsa e Gregor por pânico. O
implícito exibia-se em fragmentos à medida que o drama não era tranquilizado
com harmonia interior.
Havia uma espécie de comodismo relacionado
com o medo de enfrentar a realidade das emoções, por isso, era mais confortável
ficar recôndito e expurgar na escrita todos os sentimentos não mencionados
diretamente ao seu genitor. Além disso na Carta ao Pai, o escritor
tcheco diz: “Minha atividade de escritor tratava de ti, nela eu apenas me
queixava do que não podia me queixar junto ao teu peito”. A soberania paterna o
influência muito em seus escritos literários, visto que quando se tratava de
mostrar pessoalmente a afetividade ao pai não havia coragem. Kafka porventura
via a relação dele com o pai como se estivesse ao tribunal, sempre pensando em
se justificar na carta, e se defender racionalmente, já que emocionalmente não
era cabível.
O escritor viveu no Modernismo
existencialista. Em sua vida particular tinha atitudes de um mulherengo, cuja
vida sexual era ativa, segundo seu amigo Max Brod, e não conseguia se manter em
compromissos firmes com nenhuma mulher até conhecer Felice Bauer, que era
parente de seu amigo Brod, da qual se comunicavam muito por cartas. E suas
intenções de casar era um fracasso atrás de outro, assim como acrescenta na
Carta ao Pai: “De primeiro tu colocas o fracasso de minhas tentativas de
casamento no rol de meus demais fracassos; eu até não teria nada contra isso,
pressupondo que aceites a explicação que dei acerca de meus insucessos até
agora.” Sendo Julie Wohryzek a última tentativa de casamento não consumado, já
que a objeção maior era sobre a conduta da moça. Acusava seu pai de não dar
importância as questões do seu coração, nem ao menos a ele mesmo.
Franz Kafka poderia ser um “bosque”, um
ensaio invisível chamando leitores para se “autodescobrirem” e se auto
interpretarem de acordo com seu mundo, não importa se ele é uma multidão ou uma
solidão. E na visão dele, talvez não fosse possível de se traduzir através da
sociedade, que embora tenha de ser aceita devido à realidade psicossocial, para
construir relações somáticas, o que está interno é o mais importante.
O que faria kafka na realidade do século XXI?
Pois se antes fora um homem que vivia um paradoxo entre a vida boêmia e o
isolamento, num contexto pós-guerra, hoje não seria tão diferente, visto que a
alienação existe até no meio de multidões dentro do mundo tecnológico. Mas há
alguma história (vida) fora do sistema? Creio que Kafka ironizaria e faria o
seguinte: se recolheria para escrever em algum dormitório na vertical, abriria
aleatoriamente uma página do Word no seu notebook. Mas antes disso, para acompanhar
suas tessituras, abriria um site na internet chamado youtube e digitaria o nome
de Ludwig Van Beethoven, procurando por Moonlight Sonata Op.27 No 2,
Mov. 1, para que a música pudesse tapar o barulho urbanizado e robotizado
lá de fora. Enfim, começaria a digitar seus pensamentos e sentimentos sobre a
realidade do mesmo jeito que escrevia no século XX.
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