Economia e finanças
Ruth
CostasDa BBC Brasil em São Paulo
Image copyright Image caption Moeda norte-americana atingiu o maior patamar desde a criação
do Plano Real
O valor do dólar ultrapassou os R$ 4,
atingindo nesta terça-feira a maior cotação desde a criação do Plano Real, em
1994 – no fechamento do dia, estava custando R$ 4,05.
O
real também estaria sendo pressionado pelo rebaixamento da nota de crédito do
país pela agência Standard & Poor’s e pelas perspectivas de revisão das
avaliações de outras agências de classificação de risco.
Para
completar, nesta terça feira, esse clima de incertezas ganhou força com a
possibilidade de que o Congresso derrube os 32 vetos da presidente Dilma
Rousseff a medidas que aumentam os gastos públicos e comprometem o ajuste
fiscal.
A
avaliação de Thiago Biscuola, analista da RC Consultores, é que, mesmo que os
vetos não caiam, é pouco provável que o dólar volte a um patamar abaixo dos R$
3,50 tão cedo.
André
Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, concorda. "Não temos
a perspectiva de que essa crise política e econômica se resolva no curto prazo.
Então, provavelmente o dólar a R$ 4 veio para ficar", diz.
Há
quem ganhe e quem perca com a desvalorização do real, mas é certo que a maior
parte dos brasileiros terá ou já está tendo seu dia a dia afetado pela mudança
no câmbio. Confira abaixo como:
1) Inflação
Já
era de se esperar que a mudança de patamar do câmbio tivesse um impacto sobre
os preços de produtos importados ou setores que dependem de insumos produzidos
fora do país.
"Eletrônicos
como smartphones, por exemplo, tendem a ficar mais caros", diz o
economista da RC Consultores.
Mas,
além disso, a alta do dólar também tem um efeito sobre os preços dos
"exportáveis" – em especial os alimentos.
Biscuola
e Perfeito explicam que, como os exportadores ganham mais vendendo seus
produtos para fora, em geral acabam cobrando um preço um pouco mais alto para
mantê-los no mercado interno.
"E
com a alta do grupo alimentação (nos índices de preços), é razoável esperar uma
inflação um pouco mais próxima dos dois dígitos, ainda que a recessão já esteja
segurando o consumo", diz o economista da Gradual.
2) Viagens e turismo
Para
muitos, planos de viagens e estudos no exterior já estão precisando ser
repensados diante do novo patamar do dólar e da esperada volatilidade dos
próximos meses.
Mesmo
conseguindo uma passagem relativamente barata nas inúmeras promoções que vêm
sendo feitas pelas companhias aéreas, estão cada vez mais caros em real os
gastos com hotéis, alimentação, passeios e despesas no cartão.
Biscuola
recomenda que quem já está de viagem marcada acompanhe de perto o mercado,
comprando dólar em momentos de baixa.
"Essa
nova realidade do câmbio de certa forma faz parte do ajuste que a economia
precisava. Não parecia fazer muito sentido um jantar custar mais em São Paulo
que em Nova York e brasileiro trazer até tubos de pasta de dente de Miami
porque lá, em dólar, tudo era muito mais barato", diz Perfeito.
Os
gastos de brasileiros no exterior já caíram cerca de 20% no primeiro semestre.
E
muitas famílias já estão optando por viajar pelo país em vez de conhecer terras
estrangeiras – o que é uma boa notícia para quem trabalha com turismo interno,
hotéis, restaurantes e agências de viagens.
Além
disso, a desvalorização do real deve ajudar o país a atrair turistas
estrangeiros já que, para eles, o Brasil está uma pechincha. "Será um
atrativo a mais na Olimpíada", opina o economista da Gradual.
3) Emprego e renda
Para
quem trabalha em indústrias e setores que dependem de insumos importados, a
alta do dólar deve representar um maior risco de que a sua empresa tenha de
cortar pessoal.
Outro
grupo vulnerável é o das empresas com dívidas muito altas em dólar. Custos mais
altos devem significar reavaliações nos projetos e cortes de gastos.
Em
contrapartida, alguns exportadores, como setores da agroindústria e produtores
de papel e celulose, estão sorrindo de orelha a orelha com o dólar a R$ 4 –
porque têm custos em real, mas recebem por seus produtos na moeda americana.
Os
produtos brasileiros também tendem a ficar mais competitivos lá fora e algumas
empresas que vendem para o mercado interno podem se beneficiar do encarecimento
de competidores importados.
São
esses setores que tendem a abrir novas oportunidades de trabalho em meio a
crise.
"Mas
isso deve demorar um pouco para ter um efeito significativo no mercado de
trabalho, porque o Brasil se voltou para dentro por muito tempo quando sua
moeda estava valorizada e você não abre as janelas para fora de uma hora para
outra", diz Biscuola.
4) Investimentos
Com
o real em queda e nenhuma perspectiva de solução da crise doméstica no curto
prazo, também já há quem esteja começando a se perguntar: está na hora de
comprar dólar?
Para
Perfeito a resposta é negativa, principalmente em função da atual volatilidade
do mercado de câmbio e dessa instabilidade do cenário político e econômico
brasileiro.
"As
melhores opções de investimento continuam as mesmas", opina.
"As
incertezas são tantas que se é possível que o dólar chegue ao fim do ano na
casa dos R$ 4,30, também podemos ter uma queda para os R$ 3,50. Ninguém
arriscaria cravar o que vai acontecer", concorda Biscuola.
"Em
um país que tem investimentos ligados a títulos públicos pagando mais de 10% ao
ano, com um risco mínimo, hoje só está investindo em dólar quem consegue
acompanhar de perto esse mercado e quer emoção."
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