Publicado por Mariana
Keller,
É a jornalista que escolheu a profissão para poder viajar pelo mundo
fazendo reportagens, mas que por enquanto, viaja apenas com as próprias
palavras escritas. Acha-se velha demais para fazer tudo o que tem vontade, mas
na verdade, é nova demais para tantas crises. Adora as coisas simples da vida e
atualmente, o que mais a deixa feliz é um passeio de bicicleta.
Ai! Se sêsse!…
(Zé da Luz)
Se um dia nós se
gostasse;
Se um dia nós se queresse;
Se nós dois se impariásse,
Se juntinho nós dois vivesse!
Se juntinho nós dois morasse
Se juntinho nós dois drumisse;
Se juntinho nós dois morresse!
Se pro céu nós assubisse?
Versos despreocupados,
linguajar informal e livretos coloridos. Esses são os ingredientes principais
para compor uma boa literatura de cordel.
Inspirada na literatura de cordel portuguesa,
onde os autores declamavam seus textos para o público acompanhados do som de
uma viola, e também na literatura francesa de colportage do século XVII, que
tinha o objetivo de difundir a linguagem popular, a nossa literatura de cordel
veio com os próprios colonos portugueses e nasceu no Nordeste do Brasil. Seus
versos falam sobre a trajetória do povo do sertão.
Os textos são poéticos, rimados e publicados
em pequenos livros de papel feitos manualmente pelos próprios autores. Eles são
feitos com apenas uma folha dobrada estrategicamente para formar oito páginas,
mas alguns podem chegar até 32. A venda também é feita pelos autores,
geralmente em feiras nordestinas ou nas ruas, onde são expostos em um fio de
barbante.
Os temas são variados e representam,
principalmente, a opinião do autor a respeito de algo na sociedade e no seu
cotidiano. A linguagem não é impessoal e muito menos imparcial, são utilizadas
várias técnicas de persuasão para convencer o leitor a acreditar nos
acontecimentos narrados nos cordéis.
Os assuntos transitam entre aventuras, mitos,
lendas, romances, boatos e histórias cômicas. É muito comum encontrar também
cordéis que reproduzem desafios de ícones nordestinos como Lampião, Padre
Cícero e Frei Damião. Os temas mais sérios como os religiosos, políticos e
sociais também estão muito presentes. Grande parte dos autores aproveita para
criticar a realidade e as condições em que vivem, sempre abusando da ironia e
do sarcasmo.
Podemos dizer que o cordel também tem caráter
jornalístico, já que os desastres, as inundações, as secas, os cangaceiros, as
reviravoltas políticas são retratadas em centenas de títulos por ano. Um bom
exemplo disso é o cordel intitulado “A lamentável morte de Getúlio Vargas",
que foi feito imediatamente após o cordelista Delarme Monteiro da Silva escutar
a notícia do suicido do ex-presidente no rádio. O sucesso foi tanto que ele
vendeu 700 mil exemplares em apenas dois dias. Outros assuntos da mídia que
tiveram grande repercussão foram "O trágico romance de Doca e Ângela
Diniz" e "Carta do Satanás a Roberto Carlos”, este último inspirado
na música "Quero que vá tudo pro inferno”, do rei da Jovem Guarda.
Entre os autores principais estão Leandro
Gomes de Barros e João Martins de Atahyde. Leandro foi o pioneiro na
publicação, edição e venda dos poemas e lançou o primeiro cordel em 1893. Ele
foi o mais famoso e importante cordelista e vendeu mais de um milhão de
exemplares do seu livreto “O Cachorro dos Mortos”.
Já João, foi o que mais produziu, além dos
seus inúmeros escritos, ainda comprou os direitos autorais das obras de Leandro
quando ele faleceu. Cuíca de Santo Amaro, também foi um importante autor e
talvez o mais radical de todos. Fazia denúncias contra corruptos de sua época e
era amigo íntimo de Jorge Amado, que o incluiu como personagem em alguns de
seus contos, como o famoso “A Morte de Quincas Berro D’água”.
Outra característica marcante da literatura
de cordel são as xilogravuras. Esse método de ilustração é primeiramente
esculpido em madeira e depois impresso no papel. As capas dos livretos são
sempre ilustradas com esses desenhos e, atualmente, muitos xilógrafos
nordestinos vendem suas gravuras individualmente.
Esta manifestação popular já foi muito
estigmatizada e sofreu muitos preconceitos pela informalidade de sua estrutura
e linguagem. Com o passar dos anos, passou a ser cada vez mais respeitada e
hoje é admirada por muitas pessoas em diferentes lugares do país, tendo
ganhado, inclusive, uma Academia Brasileira de Literatura de Cordel.
Juntando poesia, gravura e protestos, a
literatura de cordel representa uma das mais interessantes expressões da arte
brasileira. Além disso, influenciou renomados escritores brasileiros como Jorge
Amado, Guimarães Rosa e José Lins do Rego, mostrando que nem sempre o que é
popular é de baixa qualidade.
Ave-Maria
da Eleição Leandro Gomes de Barros
“No dia
da eleição O povo todo corria Gritava a opposição Ave Maria.
Via-se
grupos de gente Vendendo votos nas praças E a arna dos governos, [a urna do
governo] Cheia de graça.
Uns a
outros perguntavam O Sr. Vota comnosco Um chaleira respondia Este é com vosco.
Eu via
duas panellas Com miudo de 10 bois Comprimentei-a dizendo Bemdita sois.
Os
eleitores com medo Das espadas dos alferes Chegavam a se esconderem Entre as
mulheres.
Os
candidatos chegavam Com um ameaço bruto Pois um voto para elles E' bemditos
fructos.
O
mesario do governo Pegava a urna contente E dizia eu me gloreio Do teu ventre.
A
opposição gritava De nós não ganha ninguem Respondia os do governo Amen.”
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