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JIM WATSON AFP
Republicano,
um populista imprevisível lança a maior potência global e o mundo ao
desconhecido
Marc Basset
El País – O Jornal Global
Donald Trump, um
magnata do setor imobiliário e estrela de
reality shows sem experiência política e com uma mensagem xenófoba e antissistema, será o próximo presidente
dos Estados Unidos. O republicano Trump derrotou nas eleições de 8 de novembro
a democrata Hillary Clinton, uma
política experiente e associada ao establishment que
não soube se conectar com a coalizão de minorias e jovens que deu duas vitórias
ao presidente Barack Obama. A vitória de Trump, um populista imprevisível no comando da maior potência do
planeta, lança seu país e o
mundo ao desconhecido.
O mundo esperava ver a primeira mulher na presidência dos EUA e encontra um demagogo pela frente, um
homem que reavivou algumas das tradições mais tenebrosas do país.
A chegada de Trump à Casa Branca é
uma ruptura com as melhores tradições democráticas dos EUA, com a tranquila
alternância entre governantes com visões discrepantes do país, mas não nos
valores fundamentais que o sustentam desde sua fundação. Trump, que
prometeu construir um muro na fronteira com o México e proibir a entrada de muçulmanos nos
EUA, demonstrou que um homem praticamente sozinho, contra tudo e contra todos,
é capaz de chegar à sala de comando do poder mundial. Lá terá ao alcance da mão
a valise com os códigos nucleares e controlará as mais letais forças armadas do
planeta, além de possuir um púlpito único para se dirigir ao seu país e ao
resto do mundo. Da Casa Branca poderá se lançar, se cumprir suas promessas, a
batalhas com países vizinhos como o México, a quem quer obrigar a pagar o muro.
O México, vizinho e até agora amigo dos EUA, será o primeiro
ponto na agenda do presidente Trump.
O republicano desmentiu todas as pesquisas
que há seis meses prognosticavam sua derrota. Derrotou os Clinton, a família mais poderosa da política norte-americana nas
últimas três décadas, com
exceção dos republicanos Bush, que também se opunham a ele. Enfrentou a máquina de seu próprio partido, os meios de comunicação, Wall Street,
as grandes capitais europeias e latino-americanas e organizações internacionais como a OTAN.
Seu mérito consistiu em entender o desconforto dos norte-americanos vítimas da
tempestade da globalização, as
classes médias que não deixaram de perder poder aquisitivo nas últimas décadas,
os que viram como a Grande Recessão paralisava a ascensão social, os que observam
desconcertados as mudanças demográficas e sociais em um país cujas elites
políticas e econômicas os ignoram. Os brancos da classe trabalhadora – uma minoria antigamente democrata que
compete com outras minorias como os latinos e os negros, mas que não tem um
status social de vítima – encontrou em Trump seu homem providencial.
Durante a campanha Trump prometeu um Brexit multiplicado por 5, em alusão à decisão da
Grã-Bretanha, em referendo, de sair da União Europeia. E cumpriu. A onda de populismo de ambos os lados do Atlântico consegue
sua maior vitória. É um golpe nas elites norte-americanas e globais. E é uma
prova de que em tempos de incerteza pode ganhar um candidato com os sensores
para identificar os medos da sociedade e uma mensagem simplificadora que
identifique o inimigo interno e externo.
Os intermináveis escândalos, reais ou inventados, de Clinton
derrubaram sua candidatura.
Poucos políticos se identificavam tanto com o establishment como
ela. No final das contas, é a esposa de um presidente e os EUA, uma república
fundada contra as dinastias, já teve o suficiente com os presidentes Bush pai e
filho. Os norte-americanos queriam provar algo diferente, e em um ano de
mudança, após oito com um democrata na Casa Branca, não existia candidato mais
novo do que Trump, nenhum que representasse melhor do que ele um tapa no
sistema, a tentativa de virar a página com a classe política de um e outro
partido.
A vitória eleitoral deixa uma sociedade
fraturada. As minorias, as mulheres, os estrangeiros que se sentiram insultados
por Trump deverão se acostumar a vê-lo como presidente. Deixa também uma
sociedade com medo. O presidente eleito prometeu deportar os 11 milhões de
imigrantes ilegais, uma
operação logística com precedentes históricos sinistros. O veto à entrada de muçulmanos fere os princípios de igualdade
consagrados na Constituição dos EUA.
Sua inexperiência e escassa preparação também
são uma incógnita sobre o modo como governará. Uma teoria é que uma vez no
salão oval ficará mais moderado e que, de qualquer forma, o sistema de controle
de poderes freie qualquer afã autoritário. A outra é que, ainda que esse país
não tenha experimentado um regime ditatorial no passado, as declarações de
Trump em campanha preveem um viés autoritário.
Existem momentos em que as grandes nações dão
viradas bruscas. Quando se trata dos Estados Unidos da América, a virada afeta
a toda a humanidade. O 8 de novembro de 2016 pode passar à história como um
desses momentos.
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