quinta-feira, 25 de abril de 2013

LINGUAJAR DE UM MALANDRO BAIANO



(Quem não é da Bahia pode sentir alguma dificuldade pra entender este quase dialeto...)


Certa feita, saí cedinho de casa pra um falapau* na casa de meu primo carnal, na Muriçoca, lá no fim de linha do Pau Miúdo.

Tava o maior auê* no ponto de ônibus. Gente como a porra, uma renca* de menino oferecendo geladinho, um esmolé*, cheio do pau, abusando todo mundo, vendedor de rolete gritando feito a porra e os garotos vendendo menorzinho* no quente-frio colorido.


Junto de mim, um cabo verde todo infatiotado* passava a patapata* na cabeça, enquanto defronte a filha da baiana do acarajé, uma menina cheia de pano branco, mastigava um cacetinho*.

Eu já tava ficando retado*, porque já fazia uma hora de relógio que a zorra do buzu* não passava. Aí a arabaca* chegou, cheia como quê.

Tive que entrar a pulso, mas pra tomar uma, eu faço qualquer coisa, e na paleta é que eu não ia. Apurrinhado* fui me espremendo lá pra frente e consegui passar pela borboleta.

Num daqueles freios de arrumação, fiquei de pinto assanhado, fazendo terra numa graxeira* bem moderninha, toda empiriquitada, mais enfeitada que jegue na Lavagem do Bonfim.

Ela tinha uma inhaca, que misturada com o espanta nigrinha que usava, me causava um certo entojo. Mas eu, que faço terra desde o tempo de dom corno, não ia vacilar. "É hoje que eu vou lavar a jega*", pensei. E fiquei ali, mal sabendo o esparro em que eu ia cair. É que daí a pouco o motorista deu outro freio de arrumação* e eu me desapartei da tribufuzinha* e me encaixei num negão tipo segurança do Olodum. Tá rebocado, eu pensei que ia bater a caçuleta.

O negão virou e fez:

- Qualé meu irmão? Tá procurando frete* comigo, é? Eu lhe dei ozadia* por acaso?
Resultado: levei um cachação que doeu como corno, e fui parar lá na casa da porra. Foi o maior mangue dentro do buzu. Enquanto eu me lenhava, ouvia o povo dizer:

- Pique a porra* nesse chibungo, ôôôôxe*, tem mais é que estabocar com este sacana mesmo!... No meio daquela zuada toda, resolvi tirar o corpo e na primeira sinaleira* que o buzu parou eu me piquei. Jurei que mais nunca entro em carro com enxame de
gente.
Quanto às fubuias*, tive que infonar*, mas de hoje a oito* possa ser que eu passe lá. Só que na próxima vez vou pedir a um taquiceiro* pra me levar, que eu não sou menino nem oreba*, pra ximbar* de novo.

Se não entendeu nada do que leu, das duas uma: ou não é baiano, ou precisa conhecer a Bahia!

Antonio Abreu
NR/ Dicionário do Dialeto (Baianês) Baiano:
Falapau: Festa para tomar cachaça
Auê: Confusão, bafafá
Renca: Quantidade
Menorzinho: Cafezinho
Cacetinho: Pãozinho francês
Esmolé: Pedinte
Cabo verde: Negro de cabelo quase liso
Infatiotado: Todo nos trinques, bem vestido
Patapata: Pente grosso
Retado: Aborrecido
Buzu: Ônibus
Arabaca: Ônibus velho caindo aos pedaços
Apurrinhado: Contrariado, azucrinado
Borboleta: Catraca, torniquete, roleta,
Graxeira: Empregada doméstica
Porra: Interjeição, admiração
Lavar a jega: Conseguir tudo, esbaldar-se, ir às ultimas consequências
Freio de arrumação: freio violento que embola os passageiros de um ônibus
Frete: Se dar bem, obter favores  
Tribufuzinha: mulher feiosa
Fubuias: Histórias, ou mulheres fáceis ou enroladas, quengas
Infonar: Faltar
Oreba: Bobo, tolo
Taquiceiro: Motorista de taxi
Pique a porra: Pegue a reta, siga em frente, vá embora
Ozadia: Ousadia
De hoje a oito: Daqui a uma semana
Ximbar: Cair na esparrela, dançar sem música, cair no ridículo
Sinaleira: Farol, sinal de transito




  











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