Este editorial apareceu no Blog do Noblat e
tem origem em O Globo
*NBFacó:
Ricardo Noblat, é um dos jornalistas político mais confiáveis dentre tantos que
frequentam a mídia brasileira. Vale a pena conferir o seu magnífico Blog. É
isento e correto.
Qualquer sociedade desenvolvida, ou que pretenda se desenvolver,
se sustenta em alguns poucos princípios, seguidos sem concessões. Entres eles,
o respeito ao direito de propriedade, segurança jurídica e estabilidade
política. É fundamental, também, a credibilidade dos poderes constituídos.
No que se refere ao Executivo, o requisito da credibilidade é
crucial, por exemplo, na condução da economia, e, em especial, na comunicação
com a sociedade.
Daí, o que vem acontecendo, com a demolição da credibilidade dos
números das contas nacionais, ser algo de extrema gravidade, capaz de
prejudicar tomadas de decisões de investidores e, assim, sabotar a própria
retomada do crescimento.
Reportagem do GLOBO de domingo deu a dimensão do efeito da
técnica de “contabilidade criativa” aplicada para transferir a instituições
financeiras estatais bilhões arrecadados no lançamento de títulos do Tesouro —
dívida pública, portanto — e que retornam na forma de pagamento de
“dividendos”, para maquiar o superávit primário, um termômetro da solvência
pública.
Não bastasse a receita de dividendos, por instável, não ser a
ideal na composição de superávits fiscais, a maneira como eles são gerados está
sob suspeição. O BNDES tem sido o banco estatal mais usado na “contabilidade
criativa”, neste mágico vaivém de recursos que converte dívida em receita
primária.
Eis por que o mercado acompanha cada vez mais a evolução da
dívida bruta, pois estas operações não aparecem na líquida. E ela se aproxima
de elevados 70% do PIB, à razão de um ponto percentual por ano, desde 2008.
A Caixa Econômica também é parte da ciranda. No ano passado,
embora obtivesse um lucro de R$ 6,4 bilhões, remeteu R$ 7,7 bilhões em
dividendos para o Tesouro — que, por sua vez, se endividou para “capitalizar” a
CEF. A mesma discrepância entre lucros e dividendos transferidos para Brasília
ocorre no BNDES: R$ 8,1 bilhões lucrados em 2012 para dividendos de R$ 12,9
bilhões.
Alega-se que lucros retidos de exercícios anteriores fazem as
cifras das remessas subirem. Ora, esvaziar a única fonte de financiamentos a
longo prazo do país, quando a economia necessita de investimentos, é, no
mínimo, um contrassenso.
Estudo do Instituto Brasileiro de Economia, Ibre, da Fundação
Getúlio Vargas, calcula em 38% a queda do patrimônio do BNDES, entre março de
2011 e março de 2012, segundo “O Estado de S. Paulo”. O banco explica a erosão
pela queda da Bolsa. Então, que se paguem menos dividendos.
O objetivo da “contabilidade criativa” e da pressão em geral por
mais dividendos é mostrar uma realidade de contenção fiscal que não existe na
vida real. Ao contrário, até se criam futuros “esqueletos” (dívidas e rombos
ocultos nas contas públicas) no circuito do setor elétrico, desestabilizado
pela intervenção atabalhoada do Planalto no corte da tarifa. O ex-ministro
Delfim Netto tem razão na irritação crescente com as mágicas em curso no
embonecamento das contas públicas.
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