Luiz Carlos Facó
...
Que tal agora trocar de assunto e
passar a comentar sobre a atuação da mulher através dos séculos. Lembrando da
existência de Cleópatra e Messalina, cultivando o vício, Judith e Corday,
honrando a pátria, Staël e Sèvigné, dando brilho à literatura, Vitória e
Isabel, protestante e católica, engrandecendo seus povos, Teodora e Marozia,
fazendo papas, e tantas outras que mudaram o curso da história?
Ou discutir sobre o Acadêmico
Humberto de Campos - escritor maranhense - que, da mulher negra e dos judeus,
disse em suas Memórias:
Humberto de Campos, no seu Diário Secreto - publicado pela Edições O
Cruzeiro –
Segunda-feira, dia sete de maio de 1915:
“Entre os atributos
da beleza feminina, um dos que mais encantam é o cabelo. Daí o meu horror à
mulher negra. Eu me sentiria, parece, desonrado para o resto da minha vida, e
sentiria engulhos até à hora da minha morte, se, arrastado pelo instinto,
realizasse um ato amoroso com uma mulher de cor.
O que, nestas, me parece repelente não é, todavia, a pele; é o cabelo.
Aqueles fios encaracolados, retorcidos, em espiral, dão-me a impressão de coisa
imunda, tirada a um animal abjeto e posta sobre o corpo humano menos como um
ornamento do que como castigo.
O homem branco que beijasse a cabeça de uma preta devia, como no caso do
mercador que comia alho, e de que fala o conto árabe, lavar a boca sessenta
vezes por dia, durante sessenta anos”
Quinta-feira, 18 de julho do mesmo ano, relata o escritor em outra passagem de suas
memórias:
Academia (Brasileira de Letras). À minha chegada, avisa-me Fernando
Magalhães:
- Hoje virá aqui um visitante que quer ser apresentado a você. Trouxe o
seu nome de Portugal, entre os dos brasileiros que deseja conhecer
pessoalmente, É o Ricardo Jorge.
Pelo nome e pela obra que conhecia, eu imaginava um rapaz forte,
vigoroso, de fartos bigodes portugueses, em que se conjugassem a beleza do
nome, do espírito e da figura. É de imaginar, pois, a minha surpresa quando,
começada a sessão, vi entrar na sala, entre Austragésilo (de Atayde) e Coelho
Neto, um tipo autentico de usurário semita, como não encontraria melhor
no Ghetto ou entre as velhas muralhas de Jerusalém.
Estatura mediana, curvado para a frente, ombros largos e magros como um
cabide de madeira a sustentar um velho paletó preto, e ter-se-á uma idéia
física do hóspede notável. Orçando por uns sessenta e tantos anos, usa a
barbicha clássica do judeu ibérico, forquilhada na ponta, e quase inteiramente
branca, ou, antes, com um ou outro fio preto. O nariz é o da raça, idêntico ao
de Guerra Junqueiro, curvo no centro, como o de certas aves de rapina. Boca
aparentemente pequena, pelo feitio estreito da arcada superior, que sustenta
uma dentadura postiça de dentes amarelos.
Prognatismo evidente, pronunciadíssimo; queixo fino, de rosto de
chinela, avançando, como se o lábio inferior fosse aparar o superior. Cabelo
com uma reduzida proporção de fios de prata, despenteados, gordurosos,
resistentes à calvície. Terno preto, usadíssimo, gravata desmazelada, em
colarinho de cor, mal gomado; o todo, enfim, de um homem que vive mais para o
estudo, para as altas cogitações do espírito do que para as preocupações
físicas da elegância. O judeu denuncia-se, todavia, em uma particularidade: em
três anelões de ouro português, pesados e vistosos, os quais patenteiam o
espírito da raça, isto é, o amor ao ouro, não para convertê-lo em conforto mas
para guardá-lo em metal...”
Esses não seriam assuntos candentes, capazes de provocarem novas
polêmicas como a acontecida? Eu, diante do que li, fiquei barbarizado com
tamanhos disparates. Serão tais comentários dignos da apregoada largueza de
inteligência que se debita e esse festejado autor? Eu já não o respeito nem um
pouco. Nossa rede deve ou não polemizar sobre o tema ou, simplesmente, ser uma
caixa de correspondências gentis?
A figura de Humberto, diante de mim, caiu do pedestal! E olhe, eu o
considerava um bom escritor, mas diante de tantas heresias tomei a decisão de
jamais voltar a abrir qualquer outro livro saído da sua lavra. Na história da
literatura universal desconheço autor com tamanho desplante e venenoso rancor
discriminatório. Portanto às favas com ele. Joguei-o no inferno sem consultar a
São Pedro.
Suas palavras sobre mim produzem o encanto que o canto das sereias
produziu sobre a tripulação de Ulisses, na costa da Espanha a caminho do lar.
Como ele, desejei por cera nos ouvidos com o fim de não escutá-lo. Dei-me conta,
porém que estavam impressas, condição impeditiva de usar a mesma estratégia do
guerreiro. Se tais afirmativas não
partissem de alguém tão respeitado intelectualmente, pensaria fossem mofas. No
caso, seguirei a opinião de Jaymão: “...deixe ele falar. Por ser gênio, crê que
os amigos têm o mesmo destino, quando, na verdade, todos eles são seus
admiradores e seguidores”.
Abraços para todos, em especial para sua musa. Ela foi feliz em lhe
inspirar grafar tão belos versos.
Paz e Bem!
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