Colaboração de João Eudes Costa,
Presidente da Academia
Quixadaense de Letras – Ceará
Buscando alívio para minha impetuosa angústia,
tentando fugir da depressão que se aproximava como uma avalanche esmagadora,
abriguei-me no silêncio acolhedor de um templo. Na imensidão daquele espaço,
sem que ninguém tentasse desfolhar o livro secreto de meu pensamento, poderia
esconder o nada monstruoso que não me deixava em paz.
Ao adentrar, mais ficou caracterizado o peso enorme que
carregava. Por mais que me esforçasse, as passadas tocavam no piso com tamanho
furor que, ao meu ouvido, ecoavam, como um estrondo ensurdecedor.
Quase ninguém no templo, apenas duas religiosas. Uma
genuflexa, quase imóvel, meditava, com tamanho fervor, que o corpo inerte
parecia desprezado pelo espírito que subia às alturas para conversar com Deus.
A outra se movia de um lado para outro do altar mor,
com tamanha agilidade e lenidade que seus pés levitavam, como se não tocasse no
solo. Embora em silêncio, seu rosto estampava um sorriso constante. Seus olhos
eram pequenos focos que se confundiam com a luz que cintilava, ao lado do
sacrário.
Naquele ambiente de paz, onde duas pessoas, mesmo com
postura diferentes, mostravam-se igualmente felizes, minha inquietude interior
tornava-se cada vez mais agressiva. Mesmo imóvel, sentia o corpo sacudir, como
se, dentro de mim, estivesse um vulcão em violento processo de erupção.
Não conseguindo deter o ímpeto, levantei-me, com
rapidez, e interpelei a irmãzinha que passava perto de mim: o que a faz assim
tão alegre, envolta em tanta serenidade e tão feliz, indiferente à excitação
que, lá fora, sufoca o mundo?
A jovem freira, sem deixar de sorrir nem ofuscar o
brilho de seu olhar tranqüilo, respondeu: - “Como não posso estar feliz, se
estou ao lado de Jesus e nada é tão importante na vida?”
Sorri, ao ouvir a sábia resposta, como se, naquele
momento, houvesse descoberto a receita para ser feliz. Quietei-me certo de que
aquela tristeza que não se identificava, a inquietude que me atormentava e a
depressão que já me envolvia, poderiam ser, facilmente, debeladas. Nada mais
fácil do que invocar Jesus, pedir Sua proteção e dizer que iremos amá-lo cada
vez mais.
Acontece que o Jesus que proporcionava tanta alegria e
tranqüilidade àquelas religiosas, não era a figura decorativa a quem,
constantemente, nos referimos, a quem nos dirigimos nas horas de agonia e de
quem nos esquecemos nas horas dos prazeres.
O verdadeiro Jesus, realmente, está sempre ao nosso
lado. Pena que não queiramos identificá-Lo e O fazer eternamente nosso
companheiro. Como poderemos encontrar Jesus, filho de Deus, se O deixamos na
última esquina, ao lado da criança pobre, sem lar e sem destino, que jogamos na
rua? Será possível conviver com Jesus, se O desprezamos na mão do mendigo
abandonado, que o nosso espírito impiedoso não acolheu e não ajudou, no difícil
caminhar de um homem velho?
Será que, de fato, queremos ter Jesus ao nosso lado,
se O deixamos sentado à mesa, sem pão, daquela família que espoliamos e de quem
roubamos o sustento para esbanjar nos banquetes festivos de nossa vaidade?
Como merecer a companhia de Jesus, se O abandonamos na
podridão dos cabarés, quando, para saciar a volúpia da carne, jogamos a ingênua
e indefesa criança no lamaçal da prostituição?
Será que queremos a companhia de Jesus, quando
cercamos milhares de hectares e negamos uma pequena fatia de terra para que o
homem trabalhe e tire dela o sustento para sua numerosa e faminta família?
Como desejamos a presença de Jesus, se O trocamos,
diariamente, por Barrabás, para agradar a massa enfurecida que, enganada mais
uma vez, nos levará à mordomia do poder, nem que, para tanto, tenhamos que
condenar inocentes?
Será que encontraremos a paz com Jesus, se caminhamos
pela estrada da perversão, tangendo crianças para o antro do crime e, depois,
jogá-las nos porões dos cárceres, enquanto, indiferente, nos aquartelamos nos
palácios da luxúria e dos prazeres?
Carregando no coração tanta maldade; vestindo a roupa
de seda do orgulho e da ambição, sem a necessária humildade de abraçar o irmão
carente, não poderemos conviver com o verdadeiro Cristo, fonte da
tranqüilidade, da felicidade e do amor.
Aquela irmãzinha, de vestes simples e sem posse de
bens materiais, confessou que era rica porque possuía Jesus. Realmente,
deixando de lado a ambição e a roupa que veste nossa vaidade, levando no
coração a fraternidade e o amor não nos sentimos desabrigados. Jesus cobrirá o
nosso corpo desnudo e a nossa alma cheia de fé com o manto protetor que nos
abrigará, nos fará sorri e dizer para o mundo angustiado: “Sou feliz e muito
rico porque tenho Jesus em minha companhia”.
A verdadeira paz de espírito não se compra com o
dinheiro da traição que Judas jogou fora, mas palmilhando a estrada do sacrifício,
da solidariedade, da compreensão, da resignação, da humildade, da renúncia, da
fé e do amor ao próximo.
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