Colaboração de Conrado Matos*
SIGMUND FREUD CARL GUSTAV JUNG
Antes
do encontro mais marcado da história da psicanálise entre Freud e Jung em 1907,
os dois já trocavam cartas discutindo assuntos pertinentes à nova ciência do
inconsciente e as condições de Jung chegar até Viena, mês e data.
Jung
ao fazer sua tese de doutorado cita a segunda obra de Freud, “Interpretações de
Sonhos“, publicada em 1900, porém, tendo Freud seu primeiro trabalho a ser
reconhecido e aceito por um razoável numero de acadêmicos. A psicanálise já
dava seus primeiros passos.
Infelizmente,
Freud em sua primeira obra “Estudos Sobre a Histeria” editada em 1895 em
parceria com Josef Breuer, ainda não lhe dava fama suficiente como
psicanalista, ao contrario, era criticado, inclusive tratado como charlatão,
por vários estudiosos, principalmente, por filósofos e médicos.
Mas,
lá pela Suíça tinha quem o defendia – o psiquiatra Carl Gustav Jung do Hospital
Psiquiátrico Burgholzli, um dos hospitais mais famosos da Europa. Foi também
considerado a cidadela da psicanálise, o único hospital do mundo em que o
sistema terapêutico de Freud era utilizado no tratamento de doentes.
Jung
percebeu em Freud a pessoa mais importante que ele tinha conhecido. Certamente,
Jung procurava um pai, um mentor, um guia espiritual que ele pudesse confiar.
Sigmund Freud ficou tão entusiasmado com Jung, que o convida para comparecer na
sua casa em Viena, na Áustria. Carl aceita o convite e vai até Freud. Aí
estaria nascendo uma amizade rica, algo também que Freud estava procurando, uma
pessoa que pudesse ser uma herdeira da psicanálise e que assumisse a liderança
do movimento psicanalítico. Carl Jung tinha todo esse perfil pelo gênio que
era, enquanto Freud como pai simbólico aproveitava para conseguir um filho
submisso – onde Jung lutara para nunca ser. Em razão disso, deixava Freud
extremamente irritado e decepcionado durante seis anos com esse filho teimoso,
que desejava frequentemente modificar o conceito de libido e teoria sexual,
diferenciando da teoria psicanalítica. Quando finalmente a paciência dos dois
se esgota e rompem com o relacionamento amigável em 1913. Freud fica
desencantado com Jung pelo resto da vida, sentindo-se traído pelo seu melhor
filho. Freud tivera uma raiva de Jung que não acabara nunca mais. Segundo um
filho de um discípulo de Jung, que estudava em Viena, a quem Freud conhecia,
dizia que quando Freud passava por ele virava a cara num gesto discórdia, por
saber que o rapaz fazia parte da laia de Jung. O orgulho de Freud ainda o
torturava amargamente.
Em
1937, quando Freud estava sendo castigado pela guerra no comando de Adolf
Hitler, o deixara numa carência financeira bastante crítica, em consequência da
falta de pacientes estrangeiros, principalmente dos Estados Unidos, que pagavam
as sessões de psicanálise em dólar. Muitos colegas, discípulos e pacientes o
ajudaram com alimentos, inclusive vindo de navios dos Estados Unidos, e também
em dinheiro.
Na
sua saída forçada de Viena imposta pelos nazistas, que já ocupavam a Áustria,
queimando toda sua obra em praça pública, Freud foi obrigado a deixá-la
correndo depois de resistir até à ultima esperança – Freud adorava Viena.
Para
os preparativos da triste partida, Freud precisava de dinheiro para seguir até
ao exílio em Londres na Inglaterra. Jung sabendo do sofrimento e da dificuldade
financeira do seu ex-amigo e mestre, mandar por um portador uma boa quantia em
dinheiro para desafogá-lo do desespero, e quando Freud confere a tal encomenda
que partiria de Jung, um amigo ingrato, devolve o dinheiro ao portador e envia
friamente um recado para Jung com toda velha mágoa latente que ainda lhe
amargurava de ódio, dizendo: “Diz para Jung, que quando mais precisei dele, nunca
esteve do meu lado. Agora nesta hora está querendo me ajudar. Diga que rejeito
a sua ajuda”. Freud ainda sofria muito com a perda daquele que seria seu melhor
discípulo.
Freud
e Jung, jamais pensaram que este relacionamento fosse terminar em tragédia, em
decepção e raiva, como tantos outros no passado. Pela firmeza de Freud e
empolgação de Jung, a amizade seria para sempre.
Mais
tarde, Freud investiga pela psicanálise, que a transferência, provoca uma forte
relação de amizade que resultara em laços infantis, porém de dependência,
inocência e admiração pelo outro, principalmente na pessoa do analista. Isso
ficou claro que ocorreu com Jung em relação a Freud. Depois Freud afirma em
suas descobertas psicanalíticas que a transferência era perigosa e que os
sentimentos transferenciais devem ser interpretados e analisados de acordo com
a técnica psicanalítica.
Um
fato curioso foi um sonho claro e nítido de Jung 24 horas antes do maravilhoso
contato pessoal, o tema edípico do desejo do filho de destruir o pai deu todo o
parecer. E iria obsedá-los pelos próximos seis anos. O filho e o pai se uniam
com toda força para compartilharem com a evolução de uma ciência, mas que
depois o filho se sentindo vencedor do pai, ambos se rejeitam e se tornam dois verdadeiros
rivais. Se a interpretação desse sonho tivesse levada a séria pelos dois, a
decepção tinha sido menor, ou talvez evitada.
Através
de Carl Gustav Jung, a psicanálise em 1906 na Suíça já começava a ganhar
partidários, e Freud sendo bastante respeitado e cortejado. Freud via uma
conquista mais importante de grande esperança. Ali na Suíça a psicanálise tinha
liberdade de respirar sem censura, para por fim ser reconhecida e se espalhar
por toda a Europa e o mundo. Jung em três anos já decorridos de amizade com
Freud é escolhido para ser o presidente da Associação Psicanalítica
Internacional, no dia da sua fundação em 1910 em Zurique. Cargo este,
influenciado por Freud. Era em Jung que Freud dava todo comando e confiança.
Posição esta, gerava fofocas e inveja por parte dos demais discípulos de Freud.
Jung
era sedutor, e com seu comportamento de galanteador soube muito bem seduzir
Freud, assim também era de costume namorar algumas de suas pacientes, como por
exemplo, o caso de Sabina Spielrein, foi uma delas. Encaminhada para Jung em
decorrência de uma psicose, acaba no decorrer do tratamento se apaixonando por
ele, e fantasiava diversas vezes que estava grávida dele. Essa moça que no
futuro se torna uma médica e psicanalista procura Freud para descarregar a
angústia que sentia em função de Jung, e se analisar um pouco mais, já que com
Jung sua análise foi contaminada pela relação íntima amorosa. Por coincidência,
Sabina foi a psicanalista do famoso biólogo Jean Piaget.
Mais
tarde, Sabina em retorno para Rússia, seu país de origem, com o objetivo de
trabalhar como psicanalista naquele país, em um destino infeliz durante o
percurso da viagem, é arrebanhada pelos nazistas, com suas duas filhas e um
grupo de judeus, durante a Segunda Guerra Mundial, e foram todos fuzilados.
Sabina Spielrein morre com um pouco mais de 50 anos de idade. Sabina, com toda
mágoa da ingratidão de Jung, de vez em quando se confidenciava para Freud,
dizendo que ainda o amava.
Pelo
que se sabe, Jung tivera cinco amantes, todas foram suas pacientes. Sua esposa
Emma Jung tinha conhecimento. No começo não concordava, mas, a vida e o ensinou a aceitar tal convivência. Emma Já
sabia viver com tudo isso, para não perder o marido.
Depois
de muitas cartas entre Jung e Freud, finalmente ele desembarca em Viena, no dia
03 de março de 1907, numa ânsia para ver o gênio da psicanálise. Lembra o filho
de Freud, Martin Freud, que no primeiro dia da visita de Jung, ele levara horas
e horas conversando sem parar, sem se dar conta do horário do almoço e a
atenção às demais pessoas da casa. Tamanha era sua alegria diante do mestre.
Entretanto, Freud levara quase todo tempo em silêncio como costumava ser.
Assim
que Freud soube da chegada de Jung, se dirigiu ao hotel com um buquê de flores
para Emma Jung. Freud, um homem de 50 anos se desculpou, dizendo: “
Infelizmente não lhes posso oferecer uma verdadeira hospitalidade. Não tenho
nada em casa, salvo uma mulher de certa idade. Ele se referia a Martha Bernays, a sua esposa.
Na
noite do primeiro encontro de Jung com Freud, ele tivera um sonho. Desta vez
Freud e ele caminhavam pelas ruas de Viena, como tinha feito horas antes do
sonho. Mas no sonho de Jung, Freud parecia diferente. Parecia mais idoso,
frágil e de saúde delicada, como se não tivesse muito tempo de vida.
Ao
amanhecer Jung contou o sonho a Freud e pediu-lhe que o interpretasse. Freud
interpretou e comentou o simbolismo do sonho. Disse para Jung que da parte dele
revelava um desejo inconsciente de morte, que tinha Freud como alvo. Jung
desejava destronar Freud para que pudesse tomar-lhe o lugar. Um Édipo a fim de
destruir de vez com o pai, tomado por uma forte rivalidade.
Em
31 de março de 1907, Jung escreve uma correspondência para Freud confessando
ser fiel a psicanálise, assumindo de vez em um juramento e defende-la em favor
de Freud, escreve Jung: “Espero que meu trabalho em prol da sua causa mostre ao
senhor a profundidade da minha gratidão e veneração. Espero e até sonho que
possamos recebê-lo em Zurique no próximo verão ou outono. Uma visita do senhor
seria para mim pessoalmente o sétimo céu. As poucas horas que me foi permitido
passar com o senhor foram fugazes demais”.
Freud
se sentiu lisonjeado com a postura de Jung, e em resposta a sua lealdade,
escreveu Freud em 7 de abril: “Não podia imaginar que houvesse alguém mais
qualificado para substituir-me um dia á frente do movimento psicanalítico,
levando adiante e completando a minha obra”. Freud apelava para que Jung não
abandonasse a psicanálise, exigindo mais confiança, e que Jung viesse superar
as objeções em relação à sexualidade. O crescente apego de Freud a Jung era não
apenas emocional, mas também intelectual e profissional.
Cada
vez mais a admiração de Jung a Freud desvairava sob uma acentuada dependência.
Em setembro, num tom de bajuladora adoração, Jung disse a Freud de seu “desejo
longamente acariciado e constantemente reprimido. Estimaria muito ter uma
fotografia do senhor, não como o senhor era antes, mas como era quando eu o
conheci. Jung implorava em um dos imensos desejos e dizia que ficaria
eternamente grato porque é imensa a falta que me faz o seu retrato”. E Freud
pediu a mesma cordial retribuição de Jung, que também enviasse para ele uma
foto.
Os
dois formaram um pacto de inteira confiança e fidelidade. Mas, no futuro esse
contrato é mergulhado e afundado no poço, no poço da traição. Freud se sentiu
traído por seu discípulo predileto, “ O príncipe da psicanálise”. Jung o
abandona como também a sua tão defendida teoria da sexualidade. Freud o condena
e nunca mais lhe dar o perdão. Jung sozinho com as suas próprias pernas e
genialidade cria sua própria psicologia, porém fundamentada nos princípios da
psicanálise e com outros conceitos psicológicos, inconsciente coletivo, e os
tipos psicológicos, como atitudes introvertidas e extrovertidas, que denomina
de “Psicologia Analítica”, a qual Freud radicalmente sempre criticou o tempo
inteiro, assim mesmo Jung sobreviveu.
*Conrado Matos é Psicanalista, Licenciado em filosofia, Bacharel em
Teologia e Escritor.
E-mail: psicanaliseconrado@hotmail.com – Tels: (71)
8717-3210/9910-6845.
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