(narrado por Séptimio em carta enviada a Flávio por aquele
cidadão romano, durante
o reinado do imperador Nero. Isso aconteceu
no ano 54 e 68 d.C.)
“Uma
espécie de gente, muito característica, Flávio, apareceu no Estado.
Encontram-se às ocultas e recusam-se a queimar incenso diante dos deuses
oficiais. Não saúdam César quando ele passa. Diz-se que essas pessoas adoram
divindades estranhas e praticam estranhos ritos.
O imperador Cláudio mandou prender milhares delas para pasto dos leões, Nero mandou enfiá-las em postes e cobri-las com um traje untado de breu e piche. E depois, certa noite, ateou-lhes fogo e felás desfilar pela cidade como tochas ardentes. E aquela gente sofria silenciosamente, ao que parece. Nossos imperadores romanos experimentam profundo prazer em torturar homens, mulheres e crianças que morrem sem uma palavra de protesto.
Meu amigo Petrônio me disse que tem suspeitas de que os indivíduos são confortados por algum poderoso espírito, que paira sobre eles. Na última semana, quando Petrônio foi ver uma moça que ia ser queimada numa estaca, ficou bem perto dela, no momento em que a amarravam, e pôde ouvi-la murmurar: “Virgem Mãe”! Petrônio imagina que são palavras mágicas, de tal poder que tornam os cristãos capazes de morrer tão bravamente. Essa gente, diz ele, deve ser encantada. Suportam os maiores suplícios de rosto impassível. Muitos deles retiram-se para o deserto a viver sozinhos em furnas, flagelando-se e rezando. Cada vez aumenta mais o número de romanos que procuram esses cristãos, os quais lhes prometem salvá-los das orgias dos Césares e mostrar-lhes um reino muito maior que o Império Romano. Negariam eles a divindade de César, esses rebeldes que partem o pão e oferecem vinho e cochicham estranhas orações, quando se encontram?
Assim, ontem, nova turma foi lançada aos leões no Coliseu; o odor de sangue e das entranhas dilaceradas dominou os perfumes árabes com que o Coliseu tinha sido banhado. O espetáculo era repugnante. Contudo exercem mágico efeito sobre os espectadores. Muitos deles desceram para a arena, convertendo-se ao cristianismo.
Que poder humano ou divino, ó Flávio, sustenta esses homens? E que conta mágica é essa que conserva seu número sempre em aumento, a despeito de serem milhares deles queimados na estaca ou devorados pelas bestas selvagens?
Ontem assisti a uma função noturna, no circo, Nero arranjou novo sistema de iluminação para o espetáculo. Em lugar das costumeiras tochas, o circo foi iluminado pelo clarão dos mártires em chamas... Vi-os com meus próprios olhos e nova luz brilhou em mim. Sinto... não diga isso a ninguém... sinto que estou me tornando cristão!”
Fonte:
Henri Thomas
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