segunda-feira, 18 de novembro de 2013

AS LIÇÕES DO JULGAMENTO DO MENSALÃO



(Aleluia!)

  
Fernando Alcoforado*



O resultado do julgamento que condenou a todos os envolvidos no “mensalão” cujas

penas terão início no dia de hoje (15/11/2013) com base na decisão do STF- Supremo
Tribunal Federal é uma decisão histórica para o Brasil porque desnudou as mazelas da
política brasileira na era contemporânea além de possibilitar ao povo brasileiro perceber
que se torna imperiosa a necessidade, não apenas de uma profunda reforma política,
mas também da reforma do Estado e da Administração Pública no Brasil para que não
haja a repetição de fatos tão lamentáveis como os que foram objeto de abordagem neste
processo. Papel relevante nesta decisão histórica do Supremo Tribunal Federal foi
cumprido pelo seu presidente e relator do “mensalão”, o ministro Joaquim Barbosa. A
nação brasileira deve muito a Joaquim Barbosa pelo desfecho do processo do
“mensalão”.

Ao desnudar as mazelas da política brasileira, o processo do “mensalão” deixou
bastante claro que havia um esquema de compra de apoio político de parlamentares pelo
governo federal. A decisão do STF que coloca na cadeia figuras proeminentes do PT e
de partidos aliados, grupo que há uma década governa o Brasil, mostra que os
detentores do poder político no Brasil não merecem a confiança da nação. O PT, que no
governo está colocando em prática políticas econômicas diametralmente opostas ao que
defendia antes de assumir o poder em 2002, deixou de ser também um partido defensor
da ética na política ao ter inúmeros de seus dirigentes condenados por prática de
corrupção e formação de quadrilha. Em outras palavras, o PT traiu ao compromisso
histórico que havia assumido no passado. Outra lição que se extrai do processo do
“mensalão” reside no fato de, ao decidir pela prisão de José Dirceu, José Genoíno,
Marcos Valério e Delúbio Soares, entre outros, o STF mostra que, no Brasil, não há
mais espaço para a certeza da impunidade.

Quando se analisa o caso do “mensalão” ainda em julgamento no Supremo Tribunal
Federal com os denominados embargos infringentes, a maioria das pessoas atribui este
fato a desvios de conduta política do ponto de vista ético que resultam da ambição
humana pelo dinheiro e pelo poder que, se forem devidamente punidos seus
responsáveis, tal fato não se repetiria. No entanto, a punição dos “mensaleiros” pelo
Supremo Tribunal Federal não é suficiente para evitar sua repetição. Novos
“mensalões” poderão ocorrer no futuro de forma menos ostensiva como ocorreu em
2003 e sem delatores como Roberto Jeferson porque a principal causa do “mensalão”
diz respeito à necessidade dos detentores do Poder Executivo de constituir a maioria
necessária no Parlamento a fim de obter a governabilidade, isto é, evitar a paralisia da
ação governamental se o poder central não obtém a maioria parlamentar visando a
aprovação dos projetos de seu interesse. Enquanto existir a atual Constituição, há
grande possibilidade de haver novos “mensalões”.

É importante destacar que o imperativo da maioria parlamentar no Brasil resultou em
grande medida da Constituição instituída em 1988 porque toda a sua concepção foi
baseada no modelo parlamentarista no qual o poder é exercido conjuntamente pelo
Poder Executivo e pelo Congresso Nacional. O sistema político vigente no Brasil é um
misto de presidencialista e parlamentarista, em que o presidente da República precisa de
maioria parlamentar para governar. O “mensalão” surgiu diante da necessidade do
governo Lula de obter a maioria parlamentar visando a aprovação de projetos de seu
interesse no Congresso Nacional.

Nos países politicamente avançados, o Poder Executivo obtém a maioria no Parlamento
através de acordos embasados ideologicamente. No Brasil, o caso do “mensalão” mostra
que o governo Lula tentou constituir a maioria parlamentar visando a aprovação de seus
projetos no Congresso Nacional com a compra de votos de parlamentares ligados a
partidos fisiológicos como o PMDB, PL, PTB, etc. utilizando, de forma fraudulenta,
recursos públicos, da mesma forma que realizou, também, uma deslavada compra de
votos dos “de baixo” na escala social com a institucionalização do Bolsa Família para
alcançar o apoio eleitoral da população pobre do Brasil, sob o pretexto de desenvolver
programa social de apoio aos pobres.

Ambas as ações, parlamentar e social, compõem parte da estratégia de manutenção do
poder do PT no Brasil. No contexto desta estratégia, foram implementadas mais duas
ações: uma, de concessão de facilidades “aos de cima” na escala social, sobretudo ao
sistema financeiro que vem obtendo os maiores lucros na história do Brasil e, outra, de
paralisia dos movimentos sociais em suas reivindicações contra o governo e às classes
dominantes com a oferta de benefícios oferecidos pelo governo Lula às lideranças
sindicais pelegas e partidos ideológicos de apoio que controlam os sindicatos. As
classes dominantes não têm o que reclamar do governo Lula nem do movimento
sindical estagnado nos últimos 10 anos. Só recentemente, durante o governo Dilma
Rousseff é que os movimentos reivindicatórios saíram da letargia em que se
encontravam à revelia de suas lideranças.

Não apenas o “mensalão” é o resultado de uma Constituição mal feita como a de 1988.
Há outras anomalias como a que determina que a escolha dos membros do Poder
Judiciário seja feita pelo presidente da República, muitos dos quais são escolhidos sem
o saber jurídico necessário como é o caso de Ricardo Lewandowsky e Dias Tóffoli que
estão no Supremo Tribunal Federal graças às suas ligações passadas com o ex-presidente
Lula. Apesar de a maioria dos membros do Supremo Tribunal Federal ter
sido indicada pelo ex-presidente Lula, grande parte deles está tendo comportamento de
autêntico magistrado, à exceção dos dois acima citados que tentaram a todo custo evitar
a condenação dos mentores do “mensalão”.

Todos estes fatos demonstram que Maquiavel tinha razão quando afirmou em 1513 que
o que mais ambiciona o político é a conquista, a conservação e a expansão do poder.
Este é o caso de Lula e do PT. Para alcançar e conservar esse poder não importam os
meios. O mundo político no Brasil está sendo governado por atos, ajustes e acordos
nada ortodoxos, que tem suas regras próprias, não seguindo a lógica da Ética que rege
as condutas morais das pessoas em geral como bem sintetiza o “mensalão”. Em regra o
político ético está no meio de gente ambiciosa, corrupta, violenta ou insolente. Se não
souber se comportar "realisticamente", perde seu poder.

A democracia representativa no Brasil manifesta sinais claros de esgotamento não
apenas pelos escândalos de corrupção nos poderes da República mas, sobretudo, ao
desestimular a participação popular, reduzindo a atividade política a processos eleitorais
que se repetem periodicamente em que o povo elege seus ditos representantes os quais,
com poucas exceções, após as eleições passam a defender interesses de grupos
econômicos em contraposição aos interesses daqueles que os elegeram. Na prática, tudo
funciona como se o povo desse a cada dirigente do poder executivo e a cada
parlamentar um cheque em branco para fazerem o que quiserem após ocuparem seus
cargos eletivos.

Os fatos da realidade demonstram a necessidade de que seja dado um basta à escalada
da corrupção no Brasil com a mobilização da Sociedade Civil visando a convocação de
uma Assembléia Constituinte com o objetivo de realizar uma profunda Reforma
Política, do Estado e da Admistração Pública no Brasil. A Assembléia Constituinte não
seria integrada pelos atuais membros do Congresso Nacional. Seus membros seriam
eleitos pela população com a missão exclusiva de aprovar a reforma na Constituição
atual a ser implementada no Brasil no horizonte de 1 ano. Sem a reforma da
Constituição nos termos acima propostos, o Brasil continuará sendo palco do descalabro
ético e político que deu origem ao “mensalão“.


*Fernando Alcoforado, 73, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional
pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico,
planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos
livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem
Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000),
Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento
(Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos
Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the
Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e
combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e

Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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