quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

O MÉXICO REUNE: HISTÓRIA, CULTURA, ARTE E GASTRONOMIA



O mundo sempre associa o povo mexicano a uma alegria ímpar. E não é à toa: essa terra de arte, cultura e cores intensas, de gênios como a excêntrica Frida Kahlo e seu Diego Rivera, também brinda
quem a visita com gastronomia destacada, história envolvente e ruínas arqueológicas intrigantes. Some-se a isso uma variedade de tequilas, fiestas e muito bom humor: eis o México. E a verdade é que nenhuma parte do país – a despeito de Cancun ser há anos a queridinha dos brasileiros e dos norte-americanos – é tão autenticamente mexi­cana quanto a capital. A Cidade do México (ou simplesmente DF, de Distrito Federal, para seus moradores) reúne um mix curioso de história, cultura, arte e gastronomia mais pulsante que em qualquer outra parte do país.
Enquanto muita gente pensa nela somente como a porta de entrada para os destinos do Caribe mexicano, quem resolve ficar uns dias por ali acaba se apaixonando. Considerada por muitos um dos lugares mais fascinantes do continente americano, DF (que está a 2.250 metros acima do nível do mar) funciona como uma espécie de resumo da alma mexicana. O metrô eficiente cruza a cidade de ponta a ponta e custa uma ninharia. O trânsito confuso e uma certa insegurança nos bairros peri­féricos e em alguns pontos do centro lembram cidades como São Paulo e Rio de Janeiro.
Os mexicanos são simpáticos e acolhedores – e, é claro, galanteadores com as mulheres. Para os homens, ao saber que são brasileiros, a primeira pergunta que fazem é: “Já foi visitar o Estádio Asteca?”. Foi nesse estádio (aberto para visitas guiadas) que o Brasil conquistou o tricampeonato Mundial na Copa de 1970 – e quase todo mexicano ainda sabe a escalação daquela seleção brasileira de cor.
A valorização das raízes mexicanas é tão onipresente – inclusive nos hotéis mais cultuados – que nem o trânsito caótico da capi­tal parece incomodar os moradores ou os cala­díssimos motoristas de táxi. Entre um congestio­namento e outro, você se depara repentinamente com uma escultura arrojada bem em frente a um edifício colonial. Ou com um resquício milenar ao lado de um arranha-céu ultra contemporâneo. 
História e devoção

O moderno e extenso Paseo de la Reforma, famoso por entrecortar a Cidade do México de um extremo a outro, com bancos de arquitetura arrojada e esculturas imponentes ao lado de monumentos quase barrocos em home­nagem a heróis nacionais, contrasta com a mítica Plaza Garibaldi, de arquitetura colonial co­lorida, repleta de mariachis. Os icônicos cantores ficam dia e noite pela praça, vestidos a caráter atrás de turistas que estejam dispostos a ouvi-los tocar. Dependendo do montante acer­tado – geralmente em dólares em vez de pesos mexicanos –, você aprecia a música típica com um, três, cinco ou mais músicos.

No entanto, não há lugar melhor para entender a história mexicana e a formação curiosa de seu povo que a Plaza de las 3 Culturas. É ali que estão os pilares do México: as bem-conservadas ruínas arqueológicas de Tlatelolco, a área em que centenas de estudantes foram massacrados pela ditadura militar em 1968 e a igreja dotada da primeira pia batismal mexicana, construída pelos índios sob o comando dos jesuítas. No interior da igreja, onde foi batizado o jovem Juan Diego, para o qual apareceu a Virgem de Guadalupe, é possível ver imagens sacras interessantíssimas, pintadas por índios recém-catequizados.
É justamente na devoção à Nossa Senhora de Guadalupe que a face mais religiosa do México se mostra: o país para em 12 de dezembro, quando se celebra a aparição da Virgem padroeira, com festas elaboradas em todas as vilas e cidades do país. A Basílica de Guadalupe original, ainda que sob pesadas reformas desde que o solo cedeu nos anos de 1970, pode ser parcialmente visitada; a nova basílica, em frente, tem ousada arquitetura contemporânea e concentra hoje todas as celebrações locais. Atrai milhares e milhares de peregrinos nacionais e internacionais diariamente.
Caminhar despretensiosamente pela frenética DF guarda surpresas impagáveis, como trombar com uma aparição dos Voladores. O grupo é composto por artistas que há anos mantêm viva uma tradição secular dos índios nahuas, provocando um verdadeiro hipnotismo em adultos e crianças ao fazer performances em locais públicos em busca de trocados e aplausos. O espetáculo – que pode acontecer em qualquer hora ou local, sobretudo se houver muita gente – consiste em dançar e tocar flautas nahuas girando ao redor de uma grande haste de madeira, de quase 30 metros de altura. Os acrobatas ficam presos por cordas amarradas ao mastro, pendurados de ponta-cabeça, e giram 52 voltas numa melodia emocionante e cativante – as 52 voltas representam os 52 ciclos do calendário mesoamericano. Os Voladores só terminam o espetáculo quando suas cabeças estão praticamente tocando o solo, entre “ohs!” da plateia boquiaberta.
Um dos locais prediletos para apresentações do grupo é o Zócalo, o centro histórico da capi­tal, que concentra o palácio governamental, a praça principal e a Catedral. Foi somente na década de 1970, durante escavações em pleno centro, que se descobriu que a Catedral fora erguida no começo do século 16 pelos coloni­za­dores espanhóis para esconder um templo asteca. Hoje, desenterradas, as ruínas do Templo Mayor de Teocalli ficam abertas ao público de terça a domingo, completadas por um museu construído dentro do mesmo perímetro para abrigar peças de vestuário, artefatos de guerra e relíquias arquitetônicas. 
O sopro da arte

Se a arte é um elemento característico da capital mexicana, uma visita à cidade jamais estará completa sem uma jornada por seus museus, capazes de concentrar a verdadeira alma mexicana em seu sentido mais estrito. O imponente Palácio de Belas Artes – chamado de “elefante branco” pelos mexi­canos – exibe no segundo andar o gigantesco e famoso mural que Diego Rivera pintou para o Rockefeller Center, em Nova York. A obra, recusada pelo milionário John D. Rockefeller por fazer claras referências à ciência e ao comunismo, deve ser analisada em detalhes – os simbolismos são tantos que não é raro perder-se horas diante dela. Há visitas guiadas no local e apresentações frequentes de óperas, concertos e espetáculos de balé.
Já o museu mais visitado da cidade é, definitivamente, o Frida Kahlo, na famosa Casa Azul onde nasceu e viveu a mais icônica artista plástica mexicana. Seus cômodos, mantidos em estado muito próximo ao original, retratam de maneira emocionante a vida de dores e amores vivida por Frida, que morreu em 1954 com apenas 47 anos. A primeira sala conquista com muitos de seus aclamados autorretratos e os demais quartos expõem seus vestidos colo­ridíssimos, álbuns de família, cartas para amantes e amigos, além de itens pessoais, como brincos e colares. Nos jardins da casa, muitas esculturas veneradas pela artista e um agradável café.
Falar de Frida é falar também de Rivera, com quem casou e descasou inúmeras vezes, e de Leon Trotsky, o revolucionário russo e o amigo com quem teria vivido um tórrido caso de amor. Por isso, a epopeia pelos museus mexicanos tem que seguir pelos Museu Leon Trotsky, na mesma casa em que ele viveu, e Museu Casa Estúdio Diego Rivera, com o impecável estúdio de Rivera na segunda casa em que viveu com Frida mantido em estado original, com muitos de seus pertences e vários de seus trabalhos e esboços. Vale também a visita, no centro antigo, ao Museu Mural Diego Rivera para ver o Sonho de uma Tarde de Verão na Alameda Principal.
Antes de rumar para as fabulosas ruínas mexicanas, é imprescindível visitar o Museu Nacional de Antropologia, em cujas salas é contada em detalhes a história do surgimento do povo mexicano e de muitos dos povos pré-hispânicos – não perca a ala que guarda relíquias de Teotihuacán, incluindo máscaras e artefatos de guerra. O imenso museu, detalhista em vestuário, mobiliário, arquitetura e armamentos, é passeio para pelo menos uma tarde inteira perambulando por muitas alas. Como o museu fica nos limites dos bucólicos Bosques de Chapultepec, vale, à saída, rumar para o Castelo de mesmo nome, que também conta a história do México em tempos durante e pós-colonização em cômodos mantidos com mobiliário e decoração idênticos aos originais. 
O impacto das ruínas

A apenas 40 km da capital está um dos pontos mais impactantes do país: as ruínas de Teotihuacán, que chegou a ser a principal ci­dade das civilizações pré-hispânicas por vol­ta do ano 100 a.C., com mais de 20 km2. Acredita-se que Teotihuacán tenha sido a maior cidade do mundo na sua época, abrigando cerca de 125 mil pessoas. Hoje, por entre vendedores de peças escul­pidas em obsidi­ana (espécie de vidro vulcânico), nos mais variados formatos, caminha um mar de turistas ávidos por desbravar essas cons­truções antiquíssimas e bem conservadas.
Faz muito tempo que o mistério das pirâmides mexicanas intriga e encanta tanto seus meros visitantes quanto cientistas e estudiosos. São tantas lendas e histórias envolvendo sua construção que é profundamente desaconselhável chegar ao local desacompanhado de um guia – grande parte da simbologia se perde ao vivo quando simplesmente lida em guias impressos ou revistas.
O local impressiona: pela imensidão, pela imponência e pela exatidão simbólica das cons­truções. As majestosas pirâmides da Lua e do Sol são unidas pela mística Calzada de los Muertos, com inúmeras pirâmides menores ao longo do trajeto. A da Lua tem seu topo atingido pela maioria dos turistas que visita o local. Os degraus íngremes, desprovidos de corrimão, são descidos por viajantes em passos lentos e cuidadosos – ou, muitas vezes, sentados – enquanto meninos mexicanos descem cantarolando e correndo, como se a cons­trução não tivesse o porte de um alto edifício.
O maior desafio do passeio é chegar ao topo da Pirâmide do Sol: a magnífica construção tem quase 250 degraus de pedra íngremes que levam ao topo, equivalente a um prédio de 70 metros de altura. A subida é penosa e a maioria desiste antes do meio do caminho. Mas, para quem chega, a vista compensa o esforço físico despendido na demorada jornada.
Gastronomia e balada
Hoje, os bairros mais gastronômicos da Grande Cidade do México – ou colônias, como preferem seus moradores – são Coyoacán, San Ángel e, sobretudo, Condessa. Para acompanhar vinhos, tequilas e margaritas, o México oferece uma culinária riquíssima, que varia muito de região para região, incluindo as disputadas enchilladas, variadas tortillas, nachos com guacamole ou outras salsas e os completíssimos ovos rancheros.
Para provar algo verdadeiramente diferente, arrisque sem medo na esco­lha da cochinita pibil, leitoa com mo­lho de laranja e urucum. O prato é uma das muitas atrações da peculiar cozi­nha yucateca, da Península de Yucatán, sempre repleta de queijos e carne de porco, e pode ser encontrado em bons endereços na capital. Os famosos tacos – cheios de chilli – são encontrados em qualquer bom restaurante ou barraquinha de rua, com os mais diversos recheios, e acompanham a refeição dos mexicanos seja no café da manhã, almoço ou jantar.
Já para o agito noturno, sobretudo nas noites de quinta, sexta e sábado, a opção é entre as colônias Coyoacán e San Ángel. São muitos os endereços para diversão por lá, dependendo das preferências de cada um: casa noturna, casa de salsa, bar, boliche... Algumas dicas: o La Bipolar (Malintzin, 155) é um dos preferidos entre moradores de DF. O bar é do ator Diego Luna (do filme E sua mãe também) e serve inúmeras opções de cerveja nacionais e internacionais, bem acompanhadas pelos ceviches e tortillas da casa.
O Altavista 154 (Altavista, 154,), na área badaladinha de San Ángel, fica lotado nas noites de final de semana. O El Hijo del Cuervo, em Coyoacán (Francisco Sosa, 17), tem ambiente interessante, com ampla variedade de cervejas e porções. O Lamm (Alvaro Obregón, 99 esquina com Orizaba), numa das partes mais charmosas da colônia Roma, tem ambientes para diferentes tipos de visitantes.
E não deixe a vibrante capital mexicana sem tomar um táxi e rumar até o distante e encantador distrito de Xochimilco. A região, co­nhecida localmente como “lugar das flores”, tem até hoje ruas charmosas, cobertas dos mais variados tipos de plantas e flores, cortadas por canais fluviais de fazer inveja a Amsterdã (na realidade, o que restou do antigo lago Xochimilco). Uma das atrações são os passeios de trajineras – barcos coloridos, típicos do local –, que podem incluir música e comida. Ainda há por lá atividades de agricultura ligada às chinampas, técnica de cultivo em canteiros flutuantes construídos em áreas lacustres, he­rança da antiga civilização asteca.
Bucólico, Xochimilco acabou virando o queridinho de chefs de cozinha e jovens estilistas e artistas plásticos, com uma série de galerias de artes e bons pequenos restaurantes aqui e ali. É o lugar perfeito para fechar uma viagem de descobertas na Cidade do México.

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