Fernando Alcoforado*
O
patriotismo que os brasileiros procuram demonstrar na Copa do Mundo é falso
porque é
provocado pela alienação pela qual o povo é submetido com base na ilusória
cidadãos.
Como pode uma pessoa ser patriota apenas na época da Copa do Mundo
torcendo
pela vitória da Seleção Brasileira e depois nada fazer para melhorar seu país?
O futebol
em geral e a Copa do Mundo, em particular, são instrumentos dos detentores
do poder
político e econômico para manter a ignorância entre as massas populares de
analfabetos
e miseráveis e obter o apoio dos mais instruídos e abastados que não
possuem um
senso crítico político-social.
É
lamentável vermos o falso patriotismo brasileiro surgir com força total na
época dos
campeonatos
mundiais de futebol, enquanto o verdadeiro patriotismo não acontece entre
os
brasileiros para impedir que seus governantes entreguem as riquezas nacionais
ao
capital
estrangeiro como vem ocorrendo no Brasil desde o período colonial até os
tempos
atuais. Durante a Copa do Mundo, os brasileiros compram bandeiras e camisas
verde e
amarela para exibirem seu “amor à pátria” e paralisam suas atividades durante
os jogos
para verem vinte e dois homens correrem atrás de uma bola. Quem não
conhece o
Brasil, acha que existe um patriotismo verdadeiro aqui, mas infelizmente não
é o que
ocorre. O “patriotismo” é apenas sazonal no Brasil, só ocorrendo em época de
jogos da
seleção de futebol e de Copa do Mundo.
O futebol
se transformou em um circo para o povo brasileiro ao fazer com que muita
gente
alienada considere a Copa do Mundo como o que há de mais importante em suas
vidas.
Cabe observar que, durante o Império Romano, a política do pão e circo (panem
et
circenses, no original em Latim) como ficou conhecida,
era o modo com o qual os
líderes
romanos lidavam com a população em geral, para mantê-la fiel à ordem
estabelecida
e conquistar o seu apoio. Esta política era adotada pelos imperadores
romanos
contemplando a distribuição de cereais e a promoção de vários eventos para
entreter e
distrair o povo dos problemas mais sérios existentes na sociedade romana.
Durante o
Império Romano, em épocas de crise, as autoridades acalmavam o povo com
a
construção de enormes arenas, nas quais se realizavam sangrentos espetáculos
envolvendo
gladiadores, animais ferozes, corridas de bigas, acrobacias, bandas,
espetáculos
com palhaços, artistas de teatro e corridas de cavalo. Outro costume dos
imperadores
era a distribuição de cereais mensalmente no Pórtico de Minucius em
Roma.
Basicamente, estes "presentes" ao povo romano garantiam que a plebe
não
morresse
de fome e tampouco se revoltasse contra os detentores do poder. A vantagem
de tal
prática era que, ao mesmo tempo em que a população ficava contente e
apaziguada,
a popularidade do imperador entre os mais humildes ficava consolidada.
Guardadas
as devidas proporções, no Brasil, o programa Bolsa Família funciona como
se fosse o
“pão” e a Copa do Mundo como se fosse o “circo”. A realização da Copa do
Mundo este
ano opera como se fosse “circo” para o povo brasileiro para aliená-lo
afastando-o
da luta pela solução dos graves problemas nacionais. A vitória da Seleção
Brasileira
na Copa do Mundo pode atuar como “ópio” para o povo brasileiro não se
revoltar
contra os atuais detentores do poder que não atendem suas demandas e aspiram
renovar o
mandato presidencial nas próximas eleições de outubro.
Cabe
observar que o uso repetido do ópio conduz ao hábito, à dependência química e,
a seguir, a uma decadência física e intelectual do indivíduo. Este foi um dos
instrumentos de dominação da China pelo Império Britânico.
Quanto ao
verdadeiro patriotismo, antítese do falso patriotismo sazonal brasileiro, é
importante
observar que é um sentimento que significa amar a pátria como se ama um
pai, uma
mãe ou aos próprios filhos, amar o seu povo como se fossem irmãos, sentir e
saber
partilhar a dor e o sofrimento do seu povo, sofrer com a violação e ultraje da
terra mãe, assumir e demonstrar o seu sentimento patriótico perante qualquer
circunstância,
viver o
seu dia-a-dia como um filho da sua terra, mesmo a quilômetros de distância,
denunciar
em alto e bom som, onde quer que esteja, aqueles que oprimem e fazem
sofrer os
irmãos da pátria, não compactuar com criminosos nacionais ou estrangeiros
que
utilizam a pátria-mãe para os seus negócios ilícitos e apenas para proveito
próprio,
não
compactuar com aqueles que incrementam o ódio e o divisionismo entre os irmãos
de pátria,
seja ele com que motivação for, não compactuar com criminosos que usam
meios
violentos para chegarem a liderança do país e não compactuar com criminosos
que fazem
o uso de armas que deviam ser utilizadas para a defesa do povo e não para
oprimir o
próprio povo.
Segundo
Charles de Gaulle, patriotismo é quando o amor por seu próprio povo vem
primeiro e
nacionalismo é quando o ódio pelos demais povos vem primeiro. Pelo
exposto,
ser patriota é muito mais do que ser nacionalista. Os
termos
Nacionalismo e Patriotismo não são sinônimos, embora sejam hoje muito
frequentemente
usados como tal. São termos que têm histórias diferentes. Patriotismo
tem uma
história bastante mais antiga. Patriotismo é uma palavra que tem origem no
grego patris.
Para os gregos antigos, a palavra estava associada à identificação com e à
devoção a
uma língua, tradições e história, ética, lei, e religião comuns. Patriotismo
surgiu
muito antes da noção de Estado-nação. Mesmo no século XVIII, na Europa
Ocidental,
patriotismo era entendido como a responsabilidade individual perante os
outros
cidadãos, uma devoção à humanidade e a uma ética de igualdade e caridade
perante os
mais desfavorecidos e os que faziam parte da comunidade,
independentemente
do seu perfil cultural ou étnico. Isto é, Patriotismo não estava ligado
a uma
etnia, a uma localização geográfica, ou a uma organização política autônoma.
É no
século XIX que surge o conceito de Nacionalismo e de nação como entidade
política,
com direito a um Estado (o Estado-Nação). A Nação surge como algo a
proteger;
daí necessitar de um Estado próprio; daí vários nacionalismos terem
conduzido
a inúmeros conflitos internacionais ao longo da história, muitos deles
devastadores
como a Primeira e Segunda Guerra Mundial. Neste sentido, o conceito
de
Nacionalismo está em profunda contradição com o conceito de Internacionalismo,
ou
cooperação
e ligação fraterna entre comunidades de nações que comungarem a mesma
humanidade.
Essa contradição não existe, entretanto, entre Patriotismo e
Internacionalismo
porque o indivíduo pode ser ao mesmo tempo patriota e
internacionalista.
Pelo
exposto, após a apresentação dos conceitos de patriotismo, pode-se concluir que
são falsas
as manifestações de patriotismo pelo povo brasileiro durante a Copa do
Mundo. É
importante observar que os conceitos de nacionalismo e internacionalismo
foram
apresentados neste texto para diferenciá-los do conceito do verdadeiro
patriotismo.
O lamentável é que o “circo” da Copa do Mundo no Brasil está armado
com boa
parte do povo alienado pensando que está agindo patrioticamente torcendo
pelo sucesso
da Seleção Brasileira enquanto os problemas econômicos do País se
agravam a
cada dia que se passa.
*Fernando Alcoforado, 74, membro da Academia Baiana de Educação,
engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela
Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de
planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e
planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora
Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial
(Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São
Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de
doutorado. Universidade de Barcelona,
http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do
Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development-
The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft &
Co. KG,
Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável-
Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e
Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes
do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre
outros.
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