quinta-feira, 24 de julho de 2014

A DECADÊNCIA DA HUMANIDADE

 Fernando Alcoforado*


Um observador atento ao que acontece no mundo percebe a decadência vivida pela humanidade. Por maior que seja o avanço científico e tecnológico a cada dia os valores básicos de moral, honra e respeito estão se perdendo em nossa sociedade. Os seres humanos destroem aquilo que constroem, luta com seus semelhantes pelos motivos mais fúteis possíveis e vulgariza-se e se sujeita as piores humilhações em busca do poder e da riqueza. Os seres humanos nascem e crescem se sujeitando às banalidades
criadas e aceitas passivamente pela maioria.

Talvez estejamos num caminho sem volta, sem recuperação caminhando para um abismo. Os seres humanos construíram e valorizaram um liberalismo capitalista desprezível que destrói e corrompe o homem a cada dia, deixando-o alienado e distante das grandes virtudes morais. Para a maioria é mais simples e prático acompanhar o pensamento tradicional e aceito pela sociedade e julgado como correto e normal, ao invés de desenvolver um pensamento crítico e oposto ao que é imposto como normal e correto.


Torna-se cômodo continuar com a vida tranquila e ao mesmo tempo fútil do que se arriscar indo contra a maioria. A verdade é que assim caminha a humanidade. Este é o resultado da maior crise de valores que se vive cada vez mais nos tempos atuais na grande maioria dos países do mundo onde os governantes revelam grande incapacidade para gerirem a situação, podendo mesmo levar á crise de governos e ao surgimento de ditaduras que acabem com as parcas liberdades existentes.

Tudo isto acontece no momento atual ao mesmo tempo em que ocorre a crise do sistema capitalista mundial e sua débâcle iminente em que os Estados Unidos podem arrastar consigo toda a Europa e criar mais situações de violência e desigualdade social que se multiplicaram no século atual. Na verdade está-se acelerando o processo de decadência da humanidade que está carecendo urgentemente de uma grande transformação. Só poucos estão atentos e conscientes aos “sinais” dos tempos e difundem a verdade para os que nada sabem sobre os dias difíceis que se aproximam.

Que fim terá nosso mundo, nossas vidas, se o mundo de hoje virou um caos ingovernável no qual os seres humanos só pensam em poder e riqueza e destrói a natureza? Pode o homem ser chamado de ser mais inteligente da Terra? Um ser inteligente pregaria a guerra e colocaria em risco seu futuro e dos seus descendentes? É o que fazem hoje com nosso mundo, destroem por dinheiro, matam por riqueza e poder, as vidas já não valem mais nada, nada mais tem valor, tudo isso por poder e riqueza!

É vergonhosa a situação a que chegou a humanidade com sua forma de civilização, onde a fome mata todos os dias milhões de pessoas em todo o mundo, a maior parte crianças que não chegam à idade adulta por falta de alimento, enquanto outras comem demais e ficam obesas pelos erros e excessos alimentares como o fazem seus próprios pais. Vivemos em um mundo de contrastes entre luxo e lixo, riqueza material e miséria.

É inaceitável viver em um mundo em que, nos últimos 6.000 anos da história da humanidade, houve apenas 292 anos de relativa paz entre os povos.

A história do mundo é, em larga medida, uma história de guerras, porque os Estados em que vivemos nasceram de conquistas, guerras civis ou lutas pela independência. Os registros históricos mais antigos que se conhecem já falam de guerras e lutas. Não é, pois, de causar espanto que agora, na época da colheita de todas as más ações geradas pela humanidade, o número de guerras e revoluções cresça em escala jamais vista, tanto em quantidade como em intensidade. A violência dos conflitos em nossa época não tem paralelo na história.

As guerras do século XX foram “guerras totais” contra combatentes e civis sem discriminação. O século XX foi sem dúvida o mais assassino de que temos registro, tanto na escala, frequência e extensão da guerra que o preencheu como também pelo volume único das catástrofes humanas que produziu, desde as maiores fomes da história até o genocídio sistemático. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial o mundo
conheceu 160 guerras quando morreram cerca de 7 milhões de soldados e 30 milhões de civis. Todas as "megamortes" ocorridas desde 1914 chegaram a um total de 187 milhões de mortos.

As guerras continuam fazendo parte de nosso cotidiano como demonstram o conflito entre Rússia e Ucrânia que deixa evidenciado o propósito das potências ocidentais (Estados Unidos e União Europeia), aliadas da Ucrânia, de enfraquecerem a posição geopolítica da Rússia que busca retomar o papel mundial antes exercido pela ex- União Soviética. A insolúvel questão palestina, que perdura desde o fim da 1ª Guerra Mundial quando as potências vencedoras contribuíram para a ocupação da Palestina pelo povo judeu e facilitaram a criação do Estado de Israel em detrimento do povo palestino, faz com que os povos palestino e judeu vivam em guerra permanente. A intervenção militar recente no Iraque, Afeganistão, Síria e Líbia completam o quadro de conflitos no Oriente Médio.

Além dos conflitos acima citados, a humanidade se defronta com mais duas grandes ameaças. Uma delas, de natureza econômica, é representada pela crise geral do sistema capitalista mundial que tende a conduzir a economia mundial à depressão com a falência dos governos, a quebradeira de empresas, o desemprego em massa e até mesmo a eclosão de guerras civis e uma nova conflagração mundial como já ocorreu no século XX com a 1ª e a 2ª Guerra Mundial. Outra ameaça, de natureza ambiental, é representada pelo esgotamento dos recursos naturais do planeta, o crescimento desordenado das cidades e a catastrófica mudança climática global que tende a produzir graves repercussões sobre as atividades econômicas e o agravamento dos problemas sociais da humanidade.

Esta situação é coincidente com o fato de os Estados Unidos terem ampliado demais o seu império, ao ponto de não conseguirem mais administrá-lo, como aconteceu com a Espanha no século XVII e o Reino Unido no século XX. A partir de 2001, o governo Bush põe tudo a perder na área fiscal, com crescentes gastos bélicos após o atentado contra as torres gêmeas em Nova Iorque ao promover a invasão do Iraque e do Afeganistão. Pela previsão do Goldman Sachs, a China terá, em 2050, superado os Estados Unidos, com PIB de US$ 45 trilhões, contra os US$ 35 trilhões dos Estados Unidos.

É chegada a hora da humanidade se dotar o mais urgentemente possível de instrumentos necessários a ter o controle de seu destino e colocar em prática uma governança democrática do mundo. Este é o único meio de sobrevivência da espécie humana e de sustar a decadência da humanidade. Porque não existe nenhum outro meio capaz de construir um mundo no qual cada mulher, cada homem de hoje e de amanhã tenham os mesmos direitos e os mesmos deveres, e nos quais os interesses do planeta e de todas as nações, de todas as formas de vida e das gerações futuras, seriam enfim levados em conta, no qual todas as fontes de crescimento seriam utilizadas de maneira ecologicamente e socialmente durável.

Uma governança democrática do mundo não substituiria os governos de cada nação. Seu papel seria o de construir a governabilidade da economia e do meio ambiente global e a manutenção da paz mundial. Por seu intermédio, seria perseguida a defesa dos interesses gerais do planeta. Ela zelaria no sentido de cada Estado respeitar os direitos de cada cidadão do mundo buscando impedir a propagação dos riscos sistêmicos mundiais de natureza econômica e ambiental. Ele evitaria o império de um só e a anarquia de todos. Uma governança com essas características só pode resultar do consenso entre todos os povos e nações do mundo.

A governança democrática do mundo poderia surgir de uma guerra ou ser concebido para evitar seu retorno. Esta não seria a primeira vez: isto foi objeto do Concerto das Nações em 1815, da Liga das Nações em 1920 e da Organização das Nações Unidas em 1945 que foram em vão porque a governança mundial não disporia de nenhum meio de tomar decisões nem de colocar em prática sanções contra aqueles que não a respeitem.

Esta governança mundial poderia resultar de desastres sistêmicos maiores tais como, crise ecológica extrema, crise econômica de grande amplitude, expansão de uma economia do crime organizado, a queda de um meteorito no planeta e o avanço do movimento terrorista que fariam os governos democráticos do mundo a juntar suas forças. A preservação da paz é a primeira missão de toda nova forma de governança
mundial.

Amanhã, quem vai governar o mundo? Ninguém, provavelmente, se nada for feito para construir uma governança global. E este é o pior cenário. Nenhum país por mais poderoso que seja não pode controlar a riqueza e os problemas do planeta. Nenhum país quer uma governança mundial. No entanto, as crises econômica, financeira, ecológica, social, política e o desenvolvimento de atividades ilegais e criminosas de hoje mostram a urgência de uma governança mundial. É preciso entender que o mercado mundial não pode funcionar adequadamente sem o Estado de Direito Internacional, que o Estado de Direito Internacional não pode ser aplicado e respeitado sem a presença de uma governança mundial que seja aceito por todos os países a qual só será sustentável se for verdadeiramente democrático.

A humanidade tem de entender que tem tudo a ganhar se unindo em torno de uma governança democrática no mundo representativa dos interesses das nações, incluindo a mais poderosa, controlando o mundo em sua totalidade, no tempo e no espaço. A nova ordem mundial a ser edificada deve organizar não apenas as relações entre os homens a face da Terra, mas também suas relações com a natureza. É preciso, portanto, que seja elaborado um contrato social planetário que possibilite o desenvolvimento econômico e social e o uso racional dos recursos da natureza em benefício de toda a humanidade. A edificação de uma nova ordem mundial baseada nesses princípios é urgente. Esse governo vai existir um dia mesmo que aconteça após um gigantesco desastre econômico ou ambiental. É urgente pensar nisso para sustar o processo de em curso de decadência da humanidade.

*Fernando Alcoforado, 74, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e esenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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