Quem não quer?
A definição de sorte costuma variar conforme o contexto emocional,
filosófico, religioso ou místico, de quem a interpreta. Segundo o
clássico dicionário Noah Webster, Sorte é "uma Força
sem propósito, imprevisível e incontrolável, que modela eventos de forma
favorável ou não para determinado indivíduo, grupo ou causa". Já
o autor Max
Gunther a define como evento ou série de eventos, aparentemente
fora de nosso controle, que influencia(m) nossas vidas.
Em português, a palavra que designa especificamente má sorte, ou sorte desfavorável é Azar. O conceito em torno da sorte é um quase-sinônimo de destino, exibindo como principal diferença a divisão entre "boa sorte" e "má sorte" (quando se fala em destino, essa divisão é inadmissível) remetendo fatalmente, a um maniqueísmo mundano, provavelmente controlado por forças sobrenaturais. No entanto, imaginar que existe sorte é supor que existe a possibilidade de alteração do destino, conforme determinadas condições que geram os eventos (merecimento, por exemplo) já que destino é que é o sinônimo de fatalidade, programação ou desígnio imposto por forças maiores, afetados por nossa atuação direta ou indireta.
Apesar da
separação prática entre as palavras destino e sorte, elas são algumas vezes
usadas semanticamente de forma idêntica, ou em hibridismo, como por
exemplo: o sujeito mudou o seu destino para melhor. Jogou na mega sena.
As forças
que dão origem às várias situações em torno da sorte derivam de realidades ou
imaginários cosmogônicos, metafísicos, místicos ou divinos, dedução
que se obtém não do termo lexicografado, mas da crença popular.
A concepção
de sorte é profundamente enraizada no imaginário popular, interferindo na
conduta dos que nela acreditam, conforme a forma em questão. Em muitas
culturas, imagina-se que a sorte possa ser obtida através de artifícios mágicos, como
ferraduras de cavalo, trevos de quatro folhas, amuletos, etc., confundindo-se
muitas vezes com questões relativas à influência de forças do além-vida.
Culturas nômades
como os ciganos utilizam-se
de diversos métodos de leitura do futuro ou da sorte dos desavisados, com o
mais comum objetivo de lhe arrancar algum valor pecuniário ou provisório, a
despeito de muitos deles realmente acreditarem em tais eventos, e também
praguejando ou bendizendo o destino dos que com eles se encontram (conforme o
pagamento).
Diversas
figuras do imaginário popular buscam representar e explicar a sorte. Na mitologia grega clássica,
a sorte é representada pelas Moiras, que são
três mulheres de aspecto lúgubre, responsáveis por fabricar, tecer e cortar
aquilo que seria o fio da vida de todos os indivíduos. Durante o trabalho, as
Moiras fazem uso da Roda da Fortuna, que é o tear utilizado para se tecer os
fios.
As voltas
da roda posicionam o fio do indivíduo em sua parte mais privilegiada (o topo)
ou em sua parte menos desejável (o fundo), explicando-se assim os períodos de
boa ou má sorte de todos, dada a dinâmica da roda. Conta-se que o deus Ares fora
o único ser capaz de submeter as Moiras à vontade dele; fora esta exceção, as
Moiras jamais foram manipuladas, e nada se pode fazer para detê-las, ou
ganhar-lhes o favor (até porque as Parcas entendem que o trabalho delas está
mesmo acima delas próprias). Dessa forma a figura mitológica representa a
sensação de impotência diante da dinâmica do universo e da vida.
A mitologia romana clássica
oferece a figura da Fortuna, profundamente explorada por Nicolau Maquiavel em
"O Príncipe", sua obra maior. Diferente das Parcas, a Fortuna é uma
mulher disposta a conceder favores. De acordo com Maquiavel, este se obtém
através da virtu, termo melhor traduzido não como virtude, mas
virilidade, evidenciando portanto, o aspecto necessariamente ativo da busca
pela sorte, ou seja, o de que a sorte é consequência até certo ponto, de
trabalho e não do acaso. De acordo com o autor, se a Fortuna é mulher, nada
mais natural que esta venha a se lisonjear com homens que estejam dispostos a
domá-la. A ousadia, por exemplo, seria uma forma de "humilhá-la" e,
portanto, lisonjeá-la. Vale lembrar que a abordagem de Maquiavel é destinada à
leitura por um aristocrata absolutista, e dessa forma, os argumentos vão ao
encontro dos interesses e perfis psicológicos do Rei, tanto quanto do próprio
Maquiavel.
Para o
imaginário popular, a sorte é um elemento real, presente e ativo no cotidiano.
Porém para a ciência, não há meios de se provar que ela existe realmente, e
portanto, é uma denominação adequada a uma sequência de eventos cuja
importância fantástica leva a classificação na categoria das ocorrências
dominadas pela sorte. Filmes como The Secret tentam
inserir um elemento científico ( a Lei da Atração) para que se afirme a consistência tanto da
existência da sorte quanto dos meios de se obtê-la racionalmente. Porém, apesar
de a ciência não poder provar a verdade dos dados informados. Uma
pequena
brecha entre a ciência e o imaginário surgiu novamente quando da descoberta de
que a presença do observador interfere nas probabilidades das presenças de
elementos quânticos em experimentos "controlados". Porém, apesar da
possível contiguidade entre a sorte e a realidade subatômica, a ciência não
teve a sorte de chegar ainda a nenhum novo axioma.
Para
a neurolinguística, a sorte é consequência da conduta gerada por um
comportamento continuado e insistente, marcante ou não. Falar sempre a palavra
"azar" ao invés de "sorte" podem, conforme a teoria, levar
ao sucesso ou ao azar por criar toda uma malha de comportamentos derivados da
essência neurolinguística da palavra, que contaminaria todo o restante do
comportamento. Assim, ela torna-se também uma hipótese de didática, e também
uma possibilidade comportamental relacionada ao sucesso.
A questão
da boa sorte nos jogos de azar serviu
de inspiração para a matemática. Conta-se que, durante a França do século XV, um certo
jogador profissional chamado De Mére indagou um de seus amigos, o matemático
francês Blaise Pascal, sobre como prever racionalmente os resultados de
uma partida de cartas ou dados. De posse sobre as questões do jogador, Pascal
iniciou uma vasta troca de correspondência com outros colegas de estudos e
profissão. Os resultados desse debate evoluiriam posteriormente para uma
bem-ordenada teoria da probabilidade.
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