terça-feira, 6 de janeiro de 2015

SAUDADES DO ANTIGO CARNAVAL DE SALVADOR

Luiz Carlos Facó

Caminhão da folia

O tempo é inimigo da perpetuidade. Só a admite se convém para si mesmo. Por causa disso, faz desaparecer até as mais comezinhas criações humanas: ritos, usos e costumes, sobremodo, os folguedos urdidos para celebrar a alegria das pessoas.
Sou passageiro da nau da vida, desde o finalzinho da década de trinta, do século passado. Êta! Tempo bom, sem desprezar o atual, apesar do ônus pesado que nos cobra por suas concessões.

Os Mercadores de Bagdá


Vivi, sem conhecer os eventos carnavalescos da cidade do Salvador, entre a infância e a adolescência, à época, denominados entrudos. Era refém de meus pais, em sua casa de Mar Grande, na Ilha de Itaparica, em gozo de férias, entre os meses de janeiro a março, de cada ano.
O carnaval que conhecia era o dos “caretas” margrandenses, os banhos de mar à fantasia, e as festas infantis promovidas pelo Clube dos Vinte, local, animadas por uma orquestra “mequetrefe”, cujo único instrumento de sopro era uma velha tuba, que, numa banda marcial, em desfile, ocupa o derradeiro lugar. Além, é verdade, das composições do carnaval do ano, ecoadas pelas emissoras de Salvador, ouvidas, ocasionalmente, quando a bateria do nosso rádio estava carregada. Na localidade, não existia energia elétrica. 
Só aos quinze anos, tomei contato com o carnaval soteropolitano. E, me encantei. Jamais vira a cidade tão bonita como estava. Cheia de bandeirolas, de gambiarras donde brilhava um luzeiro acachapante, enormes quantidades de serpentinas multicoloridas, passeios de ambos os lados de toda Av. Sete de Setembro – do Forte de São Pedro à Basílica de São Bento – tomadas de cadeirinhas e bancos, ali postadas pelas famílias desejosas em melhor apreciar os bons momentos momesco. E, eram muitos.
Pela manhã a passarela era tomada pelos mascarados. Chistosos, irreverentes, críticos, as mais das vezes, inconvenientes, quando já se podia sentir o cheirinho característico  saído dos tubos dos lança-perfumes, Rodouro e Colombina. À tarde, passavam as escolas de samba, os cordões de índios,

Grupo de “caretas”

batucadas, blocos e, por fim, acontecia o desfile dos grandes Clubes Carnavalescos: o Cruz Vermelha, o Fantoches da Euterpe e o Inocentes em Progresso. Com direito a príncipes, princesas, arautos, carros alegóricos, numa profusão de riqueza, cores e mulheres bonitas, capazes de embasbacar qualquer vivente.
A essa romaria de alegria, sucedia o famoso corso. Quem tinha limusines, sem capotas, na cidade, saía para exibir-se, levando consigo o carro todo enfeitado entupido de gente fantasiada, pulando e dançando numa alegria sem par, e sem hora para acabar.  Dali partiam para as festas dos grandes clubes da elite baiana: Associação Atlética, Iate Clube e Baiano de Tênis.
Era, aos meus olhos de púbere, o maior espetáculo da terra.
Hoje, passados sessenta anos, constato consternado, que o carnaval baiano deixou de ser uma festa democrática. Da mistura de ricos, remediados e pobres, de negros, brancos, pardos e mulatos. E os segregaram. Cada qual ficou no seu canto. Os ricos e remediados, participando de Trios Elétricos acordoados e guardados por severos vigilantes, e, os pobres, acompanhando-os do lado de fora. Como meros “pipocas”, os que pulam fora das cordas.
Decepção maior reside no constatar que acabaram com os blocos críticos sociais: “Cada Ano Sai Pior”, “Mudança do Garcia”, “As Costureiras”, “Elas Vêm Aí”, com as escolas de samba, “Filhos de Amaralina”, “Sem Tirar Nem Pôr” e outros tantos, sobremodo, dos divertidos “caretas” e dos desfiles das grandes sociedades carnavalescas.
O tempo matou-os e, como sempre, fez valer sua máxima: aqui na terra o imortal sou eu.

AS SOCIEDADES CARNAVALESCAS:

CLUBE CARNAVALESCO CRUZ VERMELHA



CLUBE CARNAVALESCO FANTOCHES DA EUTERPE

Corso

CLUBE CARNAVALESCO INOCENTES EM PROGRESSO


Corso

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