segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

URGE A CONSTRUÇÃO DE UMA NOVA ALTERNATIVA DE PODER NO BRASIL

 Colaboração de Fernando Alcoforado*


A vitória do Syriza nas últimas eleições da Grécia sinaliza na direção de que é possível reverter a situação vivida pelos povos do mundo inteiro de serem governados pelos detentores do capital financeiro que impôs sua vontade em escala mundial a partir de 1990 quando foi implantado o modelo neoliberal na quase totalidade dos países do mundo. A postura assumida pelos novos dirigentes gregos difere do posicionamento dos governantes brasileiros a partir de 1990 durante os governos Fernando Collor, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff que aceitaram de forma pusilânime as imposições do capital financeiro nacional e internacional de introduzir o modelo neoliberal no Brasil que contribuiu para provocar uma verdadeira devastação na
economia brasileira de 1990 a 2014 configurada: 1) no crescimento econômico pífio; 2) no descontrole da inflação, sobretudo no governo Dilma Rousseff; 3) nos gargalos existentes na infraestrutura econômica e social; 4) na desindustrialização da economia brasileira; 5) na desnacionalização da economia brasileira; 6) na explosão da dívida pública interna e externa; 7) no agravamento da crise financeira do setor público; 8) no fracasso da política social governamental; 9) no aumento das desigualdades regionais; e, 10) no agravamento da situação do meio ambiente.


Cabe observar que o neoliberalismo tem como princípios básicos: 1) mínima participação do Estado nos rumos da economia nacional; 2) política de privatização de empresas estatais; 3) não intervenção do governo no mercado de trabalho; 4) livre circulação de capitais internacionais e ênfase na globalização; 5) abertura da economia para a entrada de multinacionais; 5) adoção de medidas contra o protecionismo econômico; 6) desburocratização do Estado com a adoção de leis e regras econômicas mais simplificadas para facilitar o funcionamento da economia; 7) diminuição do
tamanho do Estado para torná-lo mais eficiente; 8) não interferência do Estado nos preços de produtos e serviços que devem ser determinados pelo mercado com base na lei da oferta e procura; 9) controle da inflação pelo Estado através de políticas monetárias com base em metas de inflação; 10) adoção pelo Estado da política de câmbio flutuante; e, 11) obtenção de superávit fiscal para pagamento da dívida pública. O baixo crescimento econômico do Brasil e a elevação desmesurada da dívida pública federal, sobretudo durante os governos FHC, Lula e Dilma Rousseff demonstram a
inviabilidade do modelo neoliberal implantado no País.

O programa econômico do Syriza, partido vencedor das últimas eleições na Grécia, já era conhecido há vários meses tendo como objetivos acabar com a política de austeridade imposta pelo FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia com base no receituário neoliberal, renegociar a dívida e impulsionar o crescimento econômico nacional. O novo governo grego, liderado por Alexis Tsipras, líder do Syriza vencedor das últimas eleições, anunciou na reunião do Conselho de Ministros suas primeiras medidas: 1) parar a privatização do porto de Pireu e de Tessalónica e da companhia de
eletricidade DEI; 2) aumentar o salário mínimo; 3) reintegrar milhares de funcionários públicos; e, 4) aumentar as pensões dos pensionistas mais pobres. Tsipras prometeu não criar mais do que 10 ministérios. Em seu discurso de abertura, ele reafirmou formalmente o seu compromisso de negociar o alívio da dívida, que deseja encontrar "uma solução justa, viável e mutuamente útil" com os credores da Grécia. O montante da dívida equivale a 175% do produto interno bruto (PIB), cerca de 300 bilhões de euros. Os credores, em vez de um alívio, admitem discutir seu reescalonamento. Alexis Tsipras, líder do Syriza, eleito primeiro ministro, salientou que o povo grego queria
"mudanças radicais" e sublinhou que a luta contra o desemprego, que afeta 25% da força de trabalho, seria a prioridade da sua ação.

Muito dificilmente, o PT e os partidos que dão sustentação ao governo Dilma Rousseff agirão da forma que atuaram os novos dirigentes gregos porque não reúnem condições políticas para realizarem as mudanças econômicas e sociais que contribuam para superar a crise atual e atendam os interesses da nação. A falta de condições políticas para adotar as mudanças econômicas exigidas na quadra atual ficou materializada na submissão da presidente Dilma Rousseff ao capital financeiro nacional e internacional com a escolha de sua equipe econômica e a adoção da política econômica de austeridade seguindo o receituário neoliberal que levou a Grécia ao desastre econômico e social. A
falta de condições políticas para realizar as mudanças econômicas ficou materializada também com a compra de votos de parlamentares no Congresso Nacional comprovada pelo processo do Mensalão durante o governo Lula e, mais recentemente, com a corrupção sistêmica que envolveu a Petrobras.

A falta de condições políticas se agravará no futuro próximo colocando em xeque a governabilidade dos atuais detentores do poder com a continuidade do péssimo desempenho da economia brasileira do qual resultará a queda da renda das famílias, dos lucros dos empresários e da arrecadação do governo mesmo com a adoção do arrocho tributário anunciado pelo governo. No plano social, a governabilidade será colocada em xeque porque a piora no desempenho da economia brasileira com a perspectiva de crescimento zero ou negativo em 2015 e 2016 fará com que haja aumento do
desemprego com o consequente incremento das tensões sociais das quais resultarão a multiplicação de greves e dos movimentos sociais em defesa de seus interesses. A falta de condições políticas para realizar as mudanças econômicas que atendam os interesses da nação e garantam a governabilidade dos atuais detentores do poder está também comprometida diante de duas graves crises como a do colapso no abastecimento de água, principalmente dos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, e a de apagões no suprimento de energia elétrica do País as quais afetarão ainda mais o
desempenho da economia brasileira em 2015 e 2016 e poderão fazer com que a ira da população contra os governantes do Brasil atinja níveis insuportáveis.

A falta de condições políticas para realizar as mudanças econômicas que atendam os interesses da nação e garantam a governabilidade dos atuais detentores do poder está também comprometida porque o governo Dilma Rousseff já demonstrou não reunir força política, não possuir competência suficiente e não ter liderança para propor à nação um projeto nacional de desenvolvimento que contribua para reverter a situação atual. O tempo conspira contra o governo Dilma Rousseff cuja tendência é a de piora da situação atual e de queda na aceitação de seu governo por parte da população brasileira. Todo este conjunto de fatores pode contribuir para que haja o crescimento do
movimento pelo impeachment de Dilma Rousseff. Diante desta perspectiva, a nação brasileira tem que construir uma nova alternativa de poder no Brasil com a constituição de um novo partido que seja a antítese dos partidos que ocuparam o poder após o regime militar e demonstram serem incapazes de promover o desenvolvimento econômico e social do país em benefício da grande maioria de sua população, além de muitos deles serem coniventes com a corrupção sistêmica que toma conta das instâncias de poder nacional.

O novo partido a ser constituído no Brasil deveria aderir ao modelo de social democracia nos moldes dos países escandinavos que permitiu avanços econômicos, sociais e políticos simultâneos com o Estado, mesmo a serviço do capital, atuando como mediador dos conflitos entre os interesses do capital e da Sociedade Civil. No Brasil a social democracia resultante do aperfeiçoamento do modelo escandinavo operaria com um tripé estruturado com base em um Estado neutro, Sociedade Civil Organizada ativa e Setor Produtivo (estatal e privado) eficiente e eficaz. O Estado neutro buscaria
compatibilizar os interesses do Setor Produtivo (estatal e privado) com os da Sociedade Civil mediando seus conflitos em várias instâncias dos poderes executivo e legislativo que, quando não se obtém o consenso, a decisão final ficaria a cargo da população que decidiria democraticamente através de plebiscito e/ou referendo.

Um governo no Brasil sob a liderança de um partido social democrata com as características acima descritas deveria adotar um projeto nacional desenvolvimentista de abertura seletiva da economia brasileira contemplando a adoção imediata da renegociação do pagamento da dívida externa e da dívida interna pública visando a redução dos encargos para elevar a poupança pública para investimento. Deveria ser adotada em curto prazo uma política econômica que priorize: 1) a redução drástica do gasto público de custeio; 2) o controle do fluxo de entrada e saída de capitais para evitar
a evasão de divisas e restringir o acesso de capitais especulativos no país; 3) a redução acentuada das taxas de juros para incentivar os investimentos nas atividades produtivas; 4) a importação seletiva de matérias-primas e produtos essenciais do exterior para reduzir os dispêndios em divisas do País; 5) a adoção da política de câmbio fixo em substituição à de câmbio flutuante em vigor para proteger a indústria nacional e controlar a inflação; 6) a reintrodução da reserva de mercado em áreas consideradas estratégicas para o desenvolvimento nacional; 7) a reestatização de empresas estatais
privatizadas consideradas estratégicas para o desenvolvimento nacional; e, 8) a adoção de uma política tributária capaz de assegurar os recursos de que o Estado necessitaria para investir em educação, saúde, previdência social e nos setores de infraestrutura, entre outros e onerar o mínimo possível a população e os setores produtivos. Percebe-se pelo exposto, que o projeto nacional desenvolvimentista de base social democrata permitiria fazer com que o Brasil assumisse os rumos de seu destino, ao contrário do projeto neoliberal em vigor que faz com que o futuro do País seja ditado
pela forças do mercado todas elas comprometidas com o capital internacional.

 * Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, (http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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