quarta-feira, 4 de março de 2015

2015 – ANO DO TRICENTENÁRIO DO TRÂNSITO DE MADRE VITÓRIA DA ENCARNAÇÃO – SALVADOR, BA.

 Madre Vitória da Encarnação
   
Considerada pelo povo como a primeira santa brasileira
Colaboração de Paulo Thadeu Souza Santos
Filsdorf, Luxembourg, 03 de março de 2015.


 Há trezentos anos, falecia numa cela do Convento de Santa Clara do Desterro, em Salvador, a mais célebre das monjas clarissas daquele mosteiro, a Madre Vitória da Encarnação. Dotada de dons extraordinários, como profecia e transfiguração, esta religiosa, chamada de «a primeira santa baiana », cativou, com sua vida exemplar e inumeráveis virtudes, a clérigos, religiosos e leigos daquele século em que viveu, e continua a cativar a muitos nos tempos hodiernos. Dentre ilustres escritores, escreveram sobre ela, Dom Sebastião Monteiro da Vide, Sebastião da Rocha Pita, Frei Jaboatão, Pedro Calmon e Amélia Rodrigues.

Lápide da sepultura da madre no convento do Desterro


Nasceu a Madre Vitória em Salvador da Bahia, então capital da Colônia, em 6 de março de 1661. Filha do capitão de infantaria Bartolomeu Nabo Correia e de Dona Luísa Bixarxe, teve um irmão e três irmãs, uma das quais entrou com ela no convento. Batizada na antiga Sé da Bahia, teve uma infância tranquila e piedosa até chegar a adolescência, quando começou a ter aversão pela vida religiosa a ponto de dizer ao seu pai que prefiria que lhe cortassem a cabeça de que ser mandada para um convento. Tal repulsa à religião preocupou seu pai que foi pedir auxílio ao padre João de Paiva, um jesuíta considerado santo em vida, que profetizou que a menina entraria anos mais tarde no mosteiro e que seria uma grande religiosa.


Estava Vitória com 16 anos de idade quando foi fundado o primeiro mosteiro feminino da Colônia, o Convento do Desterro, e desde então começou a ter sonhos e visões com a Virgem Maria e o Menino Jesus indicando-lhe o caminho do Desterro, ao que ela sempre respondia um não. Por volta dos 25 anos de idade teve uma terrível visão na qual se viu numa embarcação que naufragava e que somente eram salvos aqueles que estavam seguros na religão. Decidiu então entrar para o mosteiro e viver em penitência e oração. Sua entrada, juntamente com sua irmã Maria da Conceição, deu-se em 29 de setembro de 1686, dia de São Miguel Arcanjo, o santo da sua devoção, e cinco anos após o falecimento do padre João de Paiva que havia feito tal profecia.

Com sua entrada no mosteiro, a Madre Vitória passou e viver radicalmente os votos religiosos de pobreza, castidade e obediência e a exercitar-se na prática das virtudes. Viveu tão desapegada de si mesma, que tudo o que possuia ou ganhava, doava aos


pobres que batiam à porta do convento. Tanto que quando adoeceu e estava prestes a falecer, tiveram de levá-la para morrer na cela de outra religiosa, pois a sua estava desprovida de tudo. Tinha doado tudo, até a banca de táboas sobre a qual dormia, passando a dormir no chão sobre uma esteira de palha. Sua imensa caridade ultrapassava os muros do mosteiro e se ficava a saber de pobres ou doentes precisando de auxílio, mandava avisar seus parentes que cuidassem deles. Seu amor ao próximo, não limitava-se apenas aos vivos. Sufragava continuamente as almas do purgatório com orações e penitências em favor das mesmas e as chamava de «minhas amigas».

Foram suas companheiras na penitência e oração a Madre Maria da Soledade, também natural de Salvador e falecida em 1719, e a Madre Margarida da Coluna (segunda deste nome naquele convento), nascida em Cairu e falecida em 1743. Juntas são chamadas de «as três santas do Desterro», pois dentre outras monjas que lá viveram com fama de santidade, são elas as mais conhecidas, sendo a Madre Vitória a primeira e a mais ilustre dentre todas.

Após vinte e oito anos, nove meses e vinte dias no exercício da caridade, penitência, oração e de tantas outras virtudes, como monja clarissa, faleceu a Madre Vitória em 19 de julho de 1715, numa sexta-feira às 15 horas, tendo de idade cinquenta e quatro anos. A notîcia de sua morte levou uma multidão à porta do convento. Muitos entregavam lenços, terços e medalhas às religiosas pedindo que tocassem os mesmos no corpo da bendita madre e tais objetos eram guardados como verdadeiras relíquias. Foi sepultada no dia seguinte e anos mais tarde seus ossos foram exumados e depozitados no coro inferior da igreja daquele convento, onde encontram-se ainda hoje.

Após a morte da Madre Vitória muitas curas e graças teriam se realizado no Convento do Desterro por intercessão da mesma. Isso fez com que cinco anos após seu falecimento o então arcebispo da Bahia, Dom Sebastião Monteiro da Vide, fosse à Roma publicar a sua biografia na esperança de abrir sua causa de canonização. Mas o generoso arcebispo veio a falecer 2 anos após, não podendo levar a causa adiante.

Hoje, na expectativa da celebração do tricentenário do trânsito da Madre Vitória para o céu, que se dará em 19 de julho deste ano, seus devotos e admiradores esperam mais um milagre da santa monja: que ela desperte na Igreja da Bahia o interesse pela sua causa e que levem adiante a obra começada por Dom Sebastião.


Fontes sobre a Madre Vitória da Encarnação:

VIDE, Sebastião Monteiro. História da Vida, e Morte da Madre Soror Victória da Encarnação: Religiosa Professa no Convento de Santa Clara do Desterro da Cidade da Bahia. Roma: Na Estamparia de Joam Francisco Chracas, 1720;
PITA, Sebastião da Rocha. Historia da America Portugueza desde o anno de mil e quinhentos do seu descobrimento, até o de mil e setecentos e vinte e quatro. Lisboa Occidental: Na officina de Joseph Antonio da Sylva, 1730;
JABOATÃO, Antonio de Santa Maria. Novo orbe seráfico brasílico, ou, Crônica dos frades menores da província do Brasil. Rio de Janeiro: Typ. Brasiliense de Maximiniano Gomes Ribeiro, 1858;
RODRIGUES, Amélia. Uma flor do Desterro: Biografia de Madre Vitória da Encarnação. Niterói: Escolas Profissionais Salesianas, 1934;
CALMON, Pedro. História Social do Brasil (vol. I - Espírito da Sociedade Colonial). São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1935;
CALMON, Pedro. Figuras de azulejo: perfis e cenas da história do Brasil. Rio de Janeiro: A Noite, 1939;
MOTT, Luiz. Santos e santas no Brasil Colonial. Fortaleza: Fundação Waldemar Alcântara, 1994;
NASCIMENTO, Anna Amélia Vieira. Patriarcado e religião: as enclausuradas clarissas do convento do Desterro da Bahia, 1677-1890. Salvador: Conselho Estadual de Cultura da Bahia, 1994;
VAINFAS, Ronaldo (dir.). Dicionário do Brasil colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: Objetiva, 2000;
AZZI, Riolando. A Sé Primacial de Salvador. A Igreja Católica na Bahia (1551-2001), vol. I. Petrópolis: Vozes, 2001.

Um comentário:

  1. Viva a Madre Vitória da Encarnação! Que ela interceda pela nossa Bahia e pelo Brasil.

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