segunda-feira, 16 de março de 2015

GENARO DE CARVALHO

ARTE PICTÓRIA - TAPEÇARIA

A cor da Bahia

 Genaro criando

Crônica de Luiz Carlos Facó

Da obra de Picasso, diz-se que ela comunica todo prazer lúdico pelo artista para executá-la. Do mesmo modo, pode-se falar das composições de Genaro de Carvalho. Acrescentando, ainda, que elas encantam porque fluem da alegria dele ao concebê-las, acomodando nelas todas as cores raras e vigorosas que iluminam a Bahia. Principalmente porque são, acima de tudo, apaixonantes e transcendentais. Para falar de arte na Bahia, há de se tomar como referência a figura de Genaro de Carvalho. Sem esquecer os demais balizadores de toda concepção estética contemporânea desta província, os geniais Carlos Bastos, Carybé, Sante Scaldaferri e Mário Cravo Júnior. Aliás, todos responsáveis pelo movimento da “Arte Moderna” na Bahia, deflagrado  em 1948, numa célebre exposição ocorrida na Biblioteca do Estado – ainda situada na Praça Municipal – movimento que é o marco mais visível da contestação ao academicismo abraçado e defendido vigorosamente pelos artista de antanho: Alberto Valença, Mendonça Filho, Presciliano Silva, dentre os mais significativos.



Bastaria esse fato para marcar definitivamente a biografia de Genaro. Entretanto, como a sua genialidade se faz assustadoramente incisiva e a sua obra possui tantos predicados de grandeza, pecaria, no mínimo  por omissão, se não me detivesse em registrar seus atributos, menos para louvá-los, muito mais para dizer que, mesmo com o passar dos anos, eles se tornaram cada vez mais presentes, palpáveis, consistentes.

Nascido na Ladeira da Gamboa, Salvador, de onde se descortinam a esplendorosa Baía de Todos os Santos, a Ilha de Itaparica, a Igreja do Senhor do Bonfim, o poente com todo seu colorido arrebatador, ele só poderia vir a ser o artista imortal que sempre admirei. A volúpia das cores que dali visualizava, haveria um dia de se materializar na sua pintura, arte que foi sua primeira paixão, seguida da que dedicou a Nair, companheira amada e modelo vivo.

E não foi só com as cores que Genaro lutou durante a curta existência que experimentou. Sua preocupação passava pelos temas, formas e matérias, sobretudo pelo desejo  de não se afastar de suas raízes de seiva rica e propícia. Propósito de que jamais abdicou. Tanto assim que, mesmo em seus girassóis, peixes, borboletas, mulheres nuas – temas repetidos compulsivamente em sua obra – fez questão de imprimir as cores vivazes, primárias e luminosas só encontradas nesta encantadora terra imaginada e construída pelo sopro do Senhor Todo-Poderoso.


Há muito mais a dizer sobre Genaro. Jorge Amado o chamava de “tapeceiro, pintor, poeta... Um artista em plena maturidade criadora, ou seja, no instante do completo domínio do seu ofício, quando tudo se torna mais difícil, mais duramente conquistado, quando a obra se realiza numa complexidade de buscas e soluções. Igual a uns quatro ou cinco artistas modernos da Bahia, Genaro atingiu... sua maturidade”. Dessas palavras ditas com muito carinho pelo mestre Jorge, só devemos retirar o ”igual”, vez que Genaro era inigualável. Não só como pintor, mas também como tapeceiro, ombreando-se ao francês Jean Luçart.

É pena que Genaro tenha nos abandonado tão cedo. Talvez haja partido em busca de novos caminhos sonhados incessantemente, para dar vazão a sua sensibilidade e imaginação  aguçadas. Quiçá, nas trilhas terrenas já lhe era impossível captar os assuntos que o saciassem  e fizessem vibrar o seu pincel mágico. Daí ter ido procura-los no éter, na seara divinal. Se assim foi, eu e os seus mais achegados amigos, compreendemos, agradecendo  a reciprocidade da sua amizade e o imenso patrimônio que nos legou, embora a saudade de sua figura cativante continue obstinadamente a nos perseguir.


Meu desejo é que Deus o abrigue e os Orixás o protejam na sua nova trajetória. E, Epa hei! É a saudação dos seus amigos e admiradores, invocando Iansã ou Oiá, esposa de Xangô, para que preserve, nas sendas que ora segue, os dotes que aqui forjou, mantendo incólume a sensibilidade do artista maior  que sempre aplaudimos e reverenciamos.

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