ARTE PICTÓRIA -
TAPEÇARIA
A cor da
Bahia
Genaro
criando
Crônica
de Luiz Carlos Facó
Da obra de
Picasso, diz-se que ela comunica todo prazer lúdico pelo artista para
executá-la. Do mesmo modo, pode-se falar das composições de Genaro de Carvalho.
Acrescentando, ainda, que elas encantam porque fluem da alegria dele ao
concebê-las, acomodando nelas todas as cores raras e vigorosas que iluminam a
Bahia. Principalmente porque são, acima de tudo, apaixonantes e
transcendentais. Para falar de arte na Bahia, há de se tomar como referência a
figura de Genaro de Carvalho. Sem esquecer os demais balizadores de toda
concepção estética contemporânea desta província, os geniais Carlos Bastos,
Carybé, Sante Scaldaferri e Mário Cravo Júnior. Aliás, todos responsáveis pelo
movimento da “Arte Moderna” na Bahia, deflagrado em 1948, numa célebre exposição ocorrida na
Biblioteca do Estado – ainda situada na Praça Municipal – movimento que é o
marco mais visível da contestação ao academicismo abraçado e defendido
vigorosamente pelos artista de antanho: Alberto Valença, Mendonça Filho,
Presciliano Silva, dentre os mais significativos.
Bastaria
esse fato para marcar definitivamente a biografia de Genaro. Entretanto, como a
sua genialidade se faz assustadoramente incisiva e a sua obra possui tantos
predicados de grandeza, pecaria, no mínimo
por omissão, se não me detivesse em registrar seus atributos, menos para
louvá-los, muito mais para dizer que, mesmo com o passar dos anos, eles se
tornaram cada vez mais presentes, palpáveis, consistentes.
Nascido na
Ladeira da Gamboa, Salvador, de onde se descortinam a esplendorosa Baía de
Todos os Santos, a Ilha de Itaparica, a Igreja do Senhor do Bonfim, o poente
com todo seu colorido arrebatador, ele só poderia vir a ser o artista imortal
que sempre admirei. A volúpia das cores que dali visualizava, haveria um dia de
se materializar na sua pintura, arte que foi sua primeira paixão, seguida da
que dedicou a Nair, companheira amada e modelo vivo.
E não foi só
com as cores que Genaro lutou durante a curta existência que experimentou. Sua
preocupação passava pelos temas, formas e matérias, sobretudo pelo desejo de não se afastar de suas raízes de seiva
rica e propícia. Propósito de que jamais abdicou. Tanto assim que, mesmo em
seus girassóis, peixes, borboletas, mulheres nuas – temas repetidos
compulsivamente em sua obra – fez questão de imprimir as cores vivazes,
primárias e luminosas só encontradas nesta encantadora terra imaginada e
construída pelo sopro do Senhor Todo-Poderoso.
Há muito
mais a dizer sobre Genaro. Jorge Amado o chamava de “tapeceiro, pintor,
poeta... Um artista em plena maturidade criadora, ou seja, no instante do
completo domínio do seu ofício, quando tudo se torna mais difícil, mais
duramente conquistado, quando a obra se realiza numa complexidade de buscas e
soluções. Igual a uns quatro ou cinco artistas modernos da Bahia, Genaro
atingiu... sua maturidade”. Dessas palavras ditas com muito carinho pelo mestre
Jorge, só devemos retirar o ”igual”, vez que Genaro era inigualável. Não só
como pintor, mas também como tapeceiro, ombreando-se ao francês Jean Luçart.
É pena que
Genaro tenha nos abandonado tão cedo. Talvez haja partido em busca de novos
caminhos sonhados incessantemente, para dar vazão a sua sensibilidade e
imaginação aguçadas. Quiçá, nas trilhas
terrenas já lhe era impossível captar os assuntos que o saciassem e fizessem vibrar o seu pincel mágico. Daí
ter ido procura-los no éter, na seara divinal. Se assim foi, eu e os seus mais
achegados amigos, compreendemos, agradecendo a reciprocidade da sua amizade e o imenso
patrimônio que nos legou, embora a saudade de sua figura cativante continue
obstinadamente a nos perseguir.
Meu desejo é
que Deus o abrigue e os Orixás o protejam na sua nova trajetória. E, Epa hei! É
a saudação dos seus amigos e admiradores, invocando Iansã ou Oiá, esposa de
Xangô, para que preserve, nas sendas que ora segue, os dotes que aqui forjou,
mantendo incólume a sensibilidade do artista maior que sempre aplaudimos e reverenciamos.
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