Há, sem dúvida, uma
quase unanimidade na sociedade em entender que o Poder Judiciário, no nosso
País, costuma atuar com excessiva morosidade. Muitos estudos e trabalhos de
gente capacitada se debruçaram em analisar as principais causas desse grave
problema. É inegável – e reconhecível pelos mais lúcidos – que concorrem para
tanto um complexo de fatores. Existem desde razões históricas
e culturais até outras atuais que envolvem questões estruturais, de limitação
de recursos públicos, de deficiência da formação profissional dos operadores do
Direito, etc. Embora não se possa eleger um fator predominante, com frequência
surge a opinião de que a situação poderia melhorar consideravelmente “se não
fossem tantos os recursos”
Em 2010, o eminente
Ministro do STF Cezar Peluso (hoje aposentado), em entrevista a um jornal
paulista, sustentou uma tese radical e revolucionária, pregando que, contra
decisões desfavoráveis em primeira instância, a parte sucumbente deveria ter
direito a um único recurso. Segundo ele, é um absurdo que, no Brasil, os
processos tenham possibilidade de percorrer nada menos do que quatro instâncias
(vara, tribunais estaduais ou regionais, STJ ou TST e STF). Aos que alertavam
para um possível aumento das injustiças, ele argumentou que caberiam aos
Tribunais Superiores reformar as decisões equivocadas, ilegais ou injustas,
porém o fariam mediante ações rescisórias, começando, de imediato, a execução
da denominada “coisa julgada”. O novo CPC – Código de Processo Civil, já
aprovado no Congresso Nacional e apenas esperando a sanção da presidente Dilma,
infelizmente não adotou as ideias de Peluso. Juristas e parlamentares não
tiveram a coragem de “ousar” tanto. No entanto, deve-se reconhecer que existe
um esforço em aprovar leis e emendas constitucionais na tentativa de, ao menos,
diminuir os efeitos negativos da verdadeira avalanche de recursos que inundam
nossos tribunais. Em apertada síntese, tentaremos informar a seguir, ao público
leigo de jornal, as principais medidas legais que vêm sendo implementadas.
Um primeiro passo
importante com vistas a simplificar a tramitação dos recursos veio com a Emenda
Constitucional n. 45, de 2004, que implantou a Súmula Vinculante no STF. Bem
antes, diversos tribunais adotavam a aprovação de súmulas, ou seja, consagrar
num enunciado claro e preciso um entendimento jurídico que se tornou
predominante na jurisprudência, tornando-o um paradigma para futuros julgamentos.
Leis dificultaram o andamento de certos recursos impetrados contra decisões
contrárias às súmulas, mas faltava algo para terem mais força. Quando expedidas
pelo STF – por serem vinculantes – obrigam todos os magistrados do país e
também a administração pública. Outro avanço foi a Lei n. 11.418, de 2006, que
acrescentou os arts. 543-A a 543-C ao CPC, determinando que o Supremo somente
conheça os recursos extraordinários que venham a receber a classificação de
“repercussão geral”. Isso significa que, não tendo a questão constitucional
relevante interesse econômico, político, social ou jurídica, tais recursos não
serão sequer apreciados. Também a repercussão geral será proclamada na hipótese
em que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou jurisprudência
predominante do Tribunal. Negada a repercussão, os recursos sobre matéria
idêntica serão sempre indeferidos liminarmente. Essa providência legislativa
diminuiu bastante o abuso com expedientes protelatórios mediante os recursos
extraordinários.
O novo CPC vem
trazendo mais uma novidade com a mesma finalidade. Introduziu o chamado
“Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas”. Pelo vigente CPC, tanto o STF
como o STJ podem julgar em conjunto recursos em que há “multiplicidade” deles,
desde que fundamentados em idêntica controvérsia ou idêntica questão de
direito. É comum que determinadas graves questões jurídicas nacionais
controvertidas tomem grande vulto e gerem uma quantidade enorme de ações.
Reunindo-as para um julgamento único, os processos tornam-se mais céleres, mas
o sistema atual tem limitações. O novo CPC, que entrará em vigor após um ano de
publicação da respectiva lei, regula melhor a matéria e até determina que,
julgado o incidente, a tese jurídica resultante será aplicada a todos os processos,
presentes e futuros, que versem sobre idêntica questão de direito.
Na esteira dessas
medidas, a Justiça do Trabalho também dispõe agora de legislação sobre o
assunto. Aprovada em julho/14 (com vigência 60 dias depois), a Lei n. 13.015
alterou vários artigos da CLT para, principalmente, adotar o julgamento único
dos recursos de revista repetitivos em moldes bem semelhantes aos previstos no
novo CPC. A mesma lei modificou outras normas referentes a recursos. O Ministro
baiano Cláudio Brandão, membro daquela alta Corte, acaba de brindar os
profissionais do Direito com uma excelente obra intitulada “Reforma do Sistema
Recursal Trabalhista – Comentários à Lei n. 13.015/2014”, que, desde já, se
tornou um guia imprescindível de consulta para que sejam entendidas e aplicadas
as modificações introduzidas pela recente lei.
Como se observa,
este despretensioso artigo teve por finalidade apenas dar um sucinta notícia do
que, em termos de mudança de legislação, tem-se realizado para combater a
morosidade da Justiça, simplificando e racionalizando a tramitação dos
recursos. O caminho a trilhar ainda é muito longo, mas – reconheça-se – passos
iniciais e firmes estão sendo dados.
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Raymundo Pinto, desembargador
aposentado do TRT, é escritor, membro da Academia de Letras Jurídicas da Bahia
e da Academia Feirense de Letras.
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