Colaboração
de Fernando Alcoforado*
Houve dois
grandes acontecimentos da história da humanidade que trouxeram muita esperança
de que seria dado início à construção de um mundo novo e de um homem novo. O
primeiro grande acontecimento diz respeito ao Iluminismo e, o segundo, ao nascimento
da Modernidade. Com o Iluminismo, esperava-se que prevalecesse a tolerância,
o humanismo e o respeito à natureza e se afirmaria o direito à liberdade e à igualdade
entre os homens. Com a Modernidade, esperava-se que a sociedade alcançaria,
por sua vez, progresso ininterrupto em benefício da humanidade graças ao
desenvolvimento
da ciência e da tecnologia.
É preciso observar
que o Iluminismo é o nome que se dá à ideologia que foi sendo desenvolvida
e incorporada pela burguesia na Europa a partir das lutas revolucionárias do final
do século XVIII cujos temas giravam em torno da Liberdade, do Progresso e do Homem. O
Iluminismo tinha como propósito corrigir as desigualdades da sociedade e garantir
os direitos considerados naturais do indivíduo, como a liberdade e a livre
posse de bens. O humanismo iluminista do século dezoito já propunha que o ser
humano e sua dignidade fossem o centro e o valor fundamental de todas as
ciências, impondo assim também que fosse a preocupação máxima de todo
ordenamento jurídico, de todo sistema jurídico.
O
Iluminismo forneceu o lema da Revolução Francesa (Liberdade, Igualdade e Fraternidade)
e fecundou-a na medida em que seus seguidores se opunham às injustiças, à
intolerância religiosa e aos privilégios do absolutismo. No entanto, desde a
Revolução Francesa até o presente momento, as promessas políticas do Iluminismo
foram abandonadas em todo o mundo com a adoção de práticas desumanas cada vez
mais sofisticadas pelos governos e imperialistas pelas grandes potências
capitalistas, o desencadeamento
de 3 guerras mundiais (1ª Guerra Mundial, 2ª Guerra Mundial e a
(Guerra
Fria), o advento do fascismo e do nazismo, a realização de intervenções militares
e realização de golpes de estado em vários países do mundo.
As teses
políticas do Iluminismo fracassaram desde a Revolução Inglesa (1640), a Revolução
Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789). Este fracasso abriu caminho
para o advento da ideologia marxista em todo o mundo que se propunha a dar um
passo à frente em relação ao Iluminismo buscando o fim da exploração do homem pelo
homem com a redução das desigualdades econômicas entre as classes sociais e, no
futuro, sua completa abolição. Os fatos da história demonstram que as teses
iluministas que nortearam as revoluções burguesas no século XVIII e as teses
marxistas com base nas quais foram realizadas as revoluções socialistas no
século XX fracassaram porque não cumpriram suas promessas históricas de
conquista da felicidade humana.
A
Modernidade, por sua vez, nasceu com a Revolução Industrial significando um extraordinário
esforço intelectual dos pensadores iluministas para desenvolver a ciência e a
razão e descobrir as leis universais para serem postas a serviço da humanidade.
Com a Revolução Industrial, a ciência e a tecnologia adquiriram uma importância
fundamental para o progresso humano, mediante as contínuas inovações
tecnológicas. A ideia era usar o acúmulo de conhecimento gerado em busca da
emancipação humana e do enriquecimento da vida diária. É oportuno observar que
a Primeira Revolução Industrial foi o conjunto de transformações
socioeconômicas iniciadas por volta de 1760, na Inglaterra (e mais tarde em
outros países), e caracterizadas especialmente pela substituição do homem pela
máquina (tear mecânico e máquina a vapor, a princípio), seguida da formação de
grandes conglomerados industriais.
A
Modernidade, que está geralmente associada à Segunda Revolução Industrial
ocorrida na segunda metade do século XIX, foi o conjunto de transformações
socioeconômicas iniciadas por volta de 1870 com a industrialização da França,
da Alemanha, da Itália, dos Estados Unidos e do Japão, caracterizadas
especialmente pelo desenvolvimento de novas fontes de energia (eletricidade e
petróleo), pela substituição do ferro pelo aço e pelo surgimento de novas
máquinas, ferramentas e produtos químicos (como o plástico).
Entre
1909, quando Henry Ford criou a linha de montagem e inaugurou a produção em série, e o
final do século XX, quase todas as indústrias se mecanizaram e a automação se
estendeu a todos os setores fabris. Por sua vez, a Terceira Revolução
Industrial, que está
associada à Pós-Modernidade, é o conjunto de transformações socioeconômicas iniciadas
a partir da segunda metade do século XX, com o surgimento de complexos industriais
e empresas multinacionais, o desenvolvimento das indústrias química e eletrônica,
os avanços da automação, da informática e da engenharia genética, e
respectiva
incorporação ao processo produtivo, que passou a depender cada vez mais de alta
tecnologia e de mão de obra especializada.
A
Modernidade é identificada com a crença no progresso e nos ideais do
Iluminismo. Entretanto,
a evolução da Modernidade foi marcada por eventos que marcaram negativamente
a sociedade atual. O principal deles foi sem dúvida às catástrofes da 1ª e da
2ª Guerra Mundial. Na verdade, a ciência e a tecnologia contribuíram para a
barbárie de duas guerras mundiais com a invenção de armamentos bélicos
poderosos e destrutivos. A ciência e a tecnologia passaram a ser utilizadas
numa escala sem
precedentes
tanto para o bem como para o mal. Adicione-se o fato de que a ciência perdeu o
seu valor, como resultado da desilusão com os benefícios que associados à tecnologia
trouxe à humanidade. Todo esse desenvolvimento científico e tecnológico culminou
na era atual com uma crise ecológica mundial que pode resultar em uma mudança
climática global catastrófica que pode ameaçar a sobrevivência da humanidade.
Nesse sentido pode-se duvidar dos reais benefícios trazidos pelo progresso científico
e tecnológico com o advento da Modernidade.
Em sua
obra A Dialética do Esclarecimento (Zahar Editora, 1985), Theodor Adorno
e Max
Horkheimer, filósofos vinculados à Escola de Frankfurt, afirmam que a
supremacia da ciência
e da tecnologia na Modernidade preparou também o caminho para o desvario político
em benefício do capitalismo de mercado. O avanço científico e tecnológico, na medida
em que possibilitou tecnicamente a eliminação da miséria, trouxe, também, seu crescimento,
o que, para ambos os autores, denunciaria como obsoleta a razão de ser da sociedade
racional pregada pelos iluministas. Adorno e Horkheimer desconstroem o mito de
que o iluminismo traria a liberdade para que os homens fossem donos de seu próprio
destino e proporcionaria a conquista da felicidade para todos os seres humanos.
A razão
preconizada pelo Iluminismo foi substituída pela razão do capitalismo de mercado
que, ao exercer seu controle sobre as forças da natureza, estendeu sua dominação
também sobre os seres humanos. E o capitalismo de mercado tornou-se a instância
privilegiada dessa modalidade de controle sobre a natureza e sobre os seres humanos.
Sendo global
e onipresente, o capitalismo de mercado dispõe da técnica necessária, fornecida
pela ciência e pela tecnologia, para fazer dos homens engrenagens de seu motor,
anulando-os, através do princípio econômico da concorrência total. O totalitarismo
do capitalismo de mercado está contribuindo para extinguir o pensamento autônomo
e reforçar a uniformidade e a unanimidade em uma sociedade de massa, amorfa
como a que vivenciamos na era contemporânea no mundo.
Coligadas,
distantes dos indivíduos, economia capitalista, ciência e tecnologia, fundidas
agora como se fossem uma instância única, consolidam sua supremacia sobre a
sociedade contemporânea, determinando seus rumos com a mesma desfaçatez e
impessoalidade de uma mão invisível, segundo Adorno e Horkheimer. À
autonomia do mercado se contrapõe a total dependência do indivíduo. O
totalitarismo do mercado é capaz de produzir o homogêneo com o suporte de meios
massivos de comunicação. A contrarrevolução
neoliberal teve como um dos instrumentos fundamentais o paradigma da
Pós-Modernidade que será abordado no próximo artigo a ser publicado A
PÓSMODERNIDADE COMO IDEOLOGIA DO NEOLIBERALISMO E DA GLOBALIZAÇÃO.
* Fernando
Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de
Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento
estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo,
1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel,
São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os
condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado.
Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003),
Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia-
Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea
(EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG,Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global
e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia
Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena-
Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores
Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba,
2012), entre outros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário