Publicado em recortes por Vital Silva, em obvioumagazine,
é apaixonado por artes, história, arqueologia e por pessoas
sensatas e sinceras.
Gosta da natureza e tem uma relação conturbada
de amor e ódio com este mundo louco, fluído e imprevisível.
Aclamada por muitos como terra do futebol, das mulheres bonitas e do
povo hospitaleiro, o Brasil surge como um imenso paradoxo não só para nós
tupiniquins. Então lhe indago: Você realmente tem orgulho de ser brasileiro?
Ilustração
de Maurício Planel
Ultimamente
com a repercussão de constantes escândalos na ordem política e social, a
percepção de pequenas e grandes corrupções diárias, andei refletindo se
realmente tenho orgulho de ser brasileiro. Nós brasileiros, nascidos na terra
de Vera Cruz, nos constituímos um verdadeiro paradoxo, enquanto demonstramos
nossa insatisfação com políticos corruptos, vestimos a camisa verde e amarela
da CBF e batemos no peito para comemorar o orgulho de não desistir nunca.
Enquanto
canalizamos a culpa de todas as mazelas sociais na figura de nossos
representantes políticos, esquecemos aquela vez que estacionamos na vaga de
deficiente, jogamos papel na rua, xingamos o próximo por motivo fútil,
utilizamos produtos piratas, aceitamos o troco errado... e por aí uma
infindável lista de pequenos atos que só contribuem para piorar a sociedade em
que vivemos.
E
ainda por cima, criamos o conceito do “cidadão de bem”, para designar o cidadão
que paga seus impostos, acorda às 5 da manhã para trabalhar e colocar comida na
boca de um monte de brasileirinhos em casa. Este termo, da mais alta
repugnância e cinismo, visa dividir a sociedade em duas, de um lado os bandidos
que matam à queima-roupa, assaltam na rua e estupram, do outro o “cidadão de
bem”. De um lado os responsáveis por todos os problemas sociais do país, e do
outro, os “cidadãos de bem”, privados de culpa.
Jornal Good
Citizen (Cidadão de bem) da Klu Klux Klan.
Em
uma sociedade cínica e patológica é por vezes impensado declarar o seu amor
incondicional ao Brasil, um conceito tão abrangente, que envolve desde o solo,
sua representação política e ao seu povo na totalidade. Me desculpem, mas eu
não me orgulho da pobreza do meu país, nem de nossas principais cidades
figurarem entre as mais violentas do mundo, nem daqueles que não respeitam o
espaço do próximo e muito menos do modus operandi da “carteirada” – cada dia
mais comum –, ou das indagações de alta conjectura e refino como: “Aeroporto ou
rodoviária?”, onde o único intuito é segregar ainda mais.
Depois
de um considerável tempo de reflexão descobri que o que me orgulha não é o
Brasil, e sim alguns brasileiros. Alguns notórios, outros nem tanto. Certas
histórias me enchem de orgulho de seus protagonistas, como a do garoto Thompson
Vitor de apenas 15 anos, morador da Comunidade Paço da Pátria em Natal, que
estudando através dos livros que sua mãe, catadora de lixo, encontrava
descartados, conseguiu ser aprovado em primeiro lugar no Instituto Federal do
Rio Grande do Norte.
Thompson
Vitor e sua mãe Rosângela.
Ou
quem sabe aqui ter sido pátria do maior imunologista do Brasil, o médico Vital
Brazil, fundador do Instituto Butantan e inventor do soro antiofídico, que até
hoje salva milhares de vidas.
Vital
Brazil.
Ou
a milionária e filantropa Eufrásia Teixeira Leite, filha de prósperos
fazendeiros de café do século XIX. Possuía investimentos nos cinco continentes,
preferiu não casar para assim poder administrar sua fortuna, morreu sem deixar
herdeiros, legando sua fortuna para a caridade em Paris, que tanto amou,
Instituto das Missionárias do Sagrado Coração de Jesus – instituição romana com
vários projetos sociais no Brasil – e para os pobres de Vassouras no Rio de
Janeiro.
Eufrásia
Texeira Leite, cuja figura já focamos neste Blog
Me
orgulho também de ser do mesmo estado da cearense Maria da Penha, mulher forte
e perseverante que uniu forças para que seu ex-marido e agressor fosse
condenado pelas constantes agressões que sofria em casa, e que em uma delas
ficou paraplégica. Em 2007 foi sancionada pelo então presidente Lula a Lei
Maria da Penha, importante marco para a luta contra a violência doméstica, e
que é parte da luta de Maria, que é uma das brasileiras que me traz orgulho, e
coincidentemente Maria, igual minha mãe.
Maria da Penha.
Um
salve a todos os brasileiros que fazem a diferença em nossa sociedade, tanto
aos que viraram notícia, quanto aos anônimos que cruzamos no nosso dia a dia.
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