sábado, 30 de maio de 2015

“É O CAPITALISMO ESTÚPIDO”

  
Colaboração de Fernando Alcoforado

 “É O CAPITALISMO, ESTÚPIDO!” Fernando Alcoforado* A expressão “é a economia, estúpido!” foi utilizada por James Carville, o estrategista eleitoral de Bill Clinton, para enfatizar a necessidade de o Partido Democrata criticar a gestão da economia norte-americana para derrotar George H. Bush, o pai, na eleição presidencial de 1992. Ao utilizar a expressão "é o capitalismo, estúpido!", busca-se neste artigo enfatizar a necessidade de se atribuir ao sistema capitalista como o grande responsável pela barbárie que caracteriza a era contemporânea. A violência desenfreada e as crises que se manifestam sob várias formas no mundo em que vivemos têm como causa o sistema capitalista mundial. Por isso é fundamental romper com o atual modelo de desenvolvimento, o capitalismo, que já se mostrou incapaz de regular e, muito menos, de evitar e superar a violência e as crises que vem criando ao longo de sua história.

Pode-se afirmar que a humanidade evoluiu até o presente momento do estágio de selvageria ao de barbárie. Selvageria é um estágio característico das sociedades primitivas ou povos primitivos, que são normalmente associados com os povos indígenas. O termo barbárie tem dois significados distintos, mas ligados entre si: falta de civilização e crueldade de bárbaro. Eric Hobsbawm observa que a barbárie significa uma ruptura com os padrões morais que regulam a vida em sociedade e os controles sociais tradicionais dando lugar à violência desenfreada e o desprezo pelo ser humano (Ver La barbarie: guia del usuário no site ). O grande desafio da era contemporânea é fazer a humanidade evoluir do estágio de barbárie em que se encontra no momento ao de civilização.


Civilização é considerado o estágio mais avançado de determinada sociedade humana. Existem alguns elementos geralmente aceitos por todos sobre o que tornaria uma sociedade civilizada: 1) oferecer segurança garantida para todos os cidadãos que não devem temer a perda de suas vidas ou ter danos físicos; 2) prover assistência médica da melhor qualidade possível para todos os membros da sociedade; 3) conceder acesso à comida e água para todos os cidadãos de modo que nenhuma pessoa passe fome ou sede; 4) prover as condições básicas de habitação para todos os cidadãos; 5) possuir um sistema legislativo democrático cujas leis sejam estabelecidas para preservar o bem estar da população; 6) prover um sistema educacional que garanta igualdade de acesso à educação de alto nível para todas as pessoas visando tornar sua população altamente educada; e, 7) assegurar para a população a liberdade de pensamento, crença, religião, afiliação e expressão e o direito de participar das decisões de governo.

Segundo Eric Hobsbawn, nos últimos 150 anos, a barbárie tem aumentado permanentemente. Ano a ano, década a década, a violência e o desprezo pelo ser humano têm aumentado parecendo não haver um limite para este fenômeno. Algo muitíssimo pior: os homens e mulheres se acostumaram com a barbárie já não existindo espanto, estranheza, nem horror frente aos atos desumanos. Marx escreveu em 1847 esta passagem surpreendente e profética: "A barbárie reapareceu, mas desta vez ela é engendrada no próprio seio da civilização e é parte integrante dela. É a barbárie leprosa, a barbárie como lepra da civilização" (Ver Barbárie e modernidade no século 20 de Michael Lowy, publicado no Brasil pelo jornal "Em Tempo"- emtempo@ax.apc.org e, originalmente em francês, na revista "Critique Communiste" nº 157, hiver 2000).

A Primeira e a Segunda Guerra Mundial estabeleceram uma nova forma de barbárie eminentemente moderna, bem pior em sua desumanidade assassina do que as práticas guerreiras dos conquistadores "bárbaros" do fim do Império Romano. Segundo Eric Hobsbawn, a Grande Guerra (1914-1918) abre a etapa mais sanguinária da história mundial. 1914 começa com os sacrifícios ilimitados no afã de eliminar o inimigo. Sacrifício este que incorpora a própria população civil. 1914 começa com a era da guerra total, a ausência de distinções entre combatentes e não combatentes (Ver o artigo de Eric Hobsbawn sob o título La barbarie: guia del usuario no site ). De 1914 a 1990, morreram 187 milhões de pessoas, em atos bélicos ou extermínio sistemático.

 A despeito das reiteradas intenções de todos os países do globo em manter a paz mundial, o Século XX foi palco de duas grandes guerras. Na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), morreram cerca de 9 milhões de pessoas. Apenas vinte anos depois, eclodia a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que matou entre 40 e 52 milhões de pessoas. Além disso, a violência dos conflitos em nossa época não tem paralelo na história. As guerras do século XX foram “guerras totais” contra combatentes e civis sem discriminação. O historiador Eric Hobsbawm (A Era dos Extremos, Companhia das Letras, 2008) complementa: "Sem dúvida ele foi o século mais assassino de que temos registro, tanto na escala, frequência e extensão da guerra que o preencheu, mal cessando por um momento na década de 20, como também pelo volume único das catástrofes humanas que produziu, desde as maiores fomes da história até o genocídio sistemático".

 A tragédia das guerras no século XX atingiu a maioria das famílias ao longo de duas, três ou quatro gerações. O apelo às armas levou milhões de filhos, maridos, pais e irmãos para o campo de batalha, e milhões não voltaram. O genocídio nazista contra os judeus, ciganos e comunistas, o uso da bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki, o Goulag stalinista, a guerra do Vietnã, o ataque terrorista ao World Trade Center em New York, as duas guerras do Iraque, a guerra do Afeganistão, as guerras civis recentes da Líbia e da Síria e a violência indiscriminada praticada pelo Estado Islâmico exemplificam de maneira mais acabada a barbárie que caracteriza o mundo em que vivemos. Nesse quadro de perspectivas sombrias, urge atacar o mal da barbárie pela raiz com a construção de uma nova ordem mundial civilizada em substituição à ordem capitalista dominante geradora dos atentados à Civilização em todos os quadrantes da Terra que se registram há mais de 500 anos.


* Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).

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