sexta-feira, 26 de junho de 2015

BARBA ENSOPADA DE SANGUE - UM FOLDER LITERÁRIO

 Publicado em literatura por Alexandre Coslei
É jornalista e escritor

A literatura contemporânea vem propagando novos e interessantes gêneros, como o exemplo do jornalismo literário. No território do público jovem, fiz a leitura de "Barba ensopada de sangue" percebendo uma novidade: o folder literário. O enredo é um passeio minuciosamente descrito pela praia de Garopaba, no interior de Santa Catarina. Daniel Galera não é a "Vovó Stella", mas nos conduz a uma viagem mística e encantada pelo litoral catarinense.


LIVRO: BARBA ENSOPADA DE SANGUE; AUTOR: DANIEL GALERA; EDITORA: CIA DAS LETRAS / 2012
Visitar a Livraria Saraiva, seja onde for, é como entrar numa Blockbuster literária. São livros de autores celebridades como Pedro Bial, Lobão, Fernanda Torres, etc. Além deles, encontramos uma fartura de edições sobre dragões, ficções com ares medievais, história de vampiros, diários de psicopatas caricatos, livros de amor e toda a quinquilharia produzida para um “público jovem”. Os melhores livros da Saraiva não ficam nos balcões de destaque, mas empilhados no chão como indigentes das letras.

Obrigo-me a superar qualquer preconceito intelectual que ainda habite o meu universo e compro o título de um desses decantados jovens autores alardeados como finalistas e vencedores dos mais significativos prêmios literários (nem sempre um marketing sincero, é preciso saber filtrar). Deixo a Saraiva carregando “Barba ensopada de sangue”, o romance do enaltecido Daniel Galera.
A abertura nos apresenta a um protagonista sem nome, cujo estopim da história brota no suicídio anunciado do pai. Ao mesmo tempo que informa a decisão de se matar, o pai faz o filho prometer que sacrificará a cadela de estimação assim que ele consumar seu intento. O filho promete, mas não cumpre. Ao contrário, adota a cadela e parte com ela para Garopaba com o objetivo de desvendar o mistério ancestral que envolve o assassinato do avô naquele litoral catarinense. Um elemento interessante acompanha o protagonista, ele sofre de uma doença que o faz esquecer o rosto das pessoas e impede que as reconheça mesmo depois de manter contato.
Somados os ingredientes, talvez pudéssemos descortinar uma bela trama. Infelizmente, não é o que acontece. Escrito em terceira pessoa, entremeado por diálogos abundantes e notas de rodapé cansativas que marcam depoimentos e recados, o livro patina num existencialismo raso que não chega a lugar nenhum. Parece se perder até do eixo principal, se exaure num recurso bobo, pouco criativo e recheado de aura mística para a conclusão do enredo. A narrativa ensaia tímidos movimentos de inovação, mas não se arrisca em grandes evoluções, segue a receita do mais simples, preferência das oficinas literárias, onde o autor já confessou ter semeado seus primeiros textos.
Durante o decorrer do calhamaço de 422 páginas, somos conduzidos pela rotina vazia do principal personagem, confirmamos o complexo de corno causado por ter perdido uma namorada para o irmão, testemunhamos a readaptação da cadela ao novo dono e passeamos pelas praias invernais de Garopaba através de descrições intermináveis. Um detalhe intrigante nesta nova geração de jovens autores é que, para alguns, a confecção do romance aparenta ser mais um ato de descrever do que o de contar.
É um livro ruim? Não, se for classificado como um morno entretenimento. Segue com louvor as fórmulas que costumam levar a garotada a querer alcançar a página final.
Ao término da leitura de “Barba ensopada de Sangue” fica a nítida impressão de que não lemos um romance, mas corremos os olhos por um folder turístico. Fiquei com uma vontade danada de conhecer Garopaba, mas só no verão.


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