Publicado em cinema por J. Douglas Alves,
em obviusmagazine.
É Escritor, Pedagogo, Cinéfilo, Desmistificador
de Dálias..
Muitos são os filmes que tratam dos bastidores da política, seja dando
ênfase a alguns personagens e situações, ou abordando de forma mais ampla todo
o processo. Faço aqui uma reflexão sobre o processo eleitoral no cinema,
contextualizando este cenário nos Estados Unidos e no Brasil.
Virada no Jogo e Tudo pelo Poder.
Recentemente
assisti a dois filmes estadunidenses que tratam diretamente dos bastidores do
processo eleitoral naquele país, “Virada no Jogo” (Game Change, 2012) e
“Tudo pelo Poder” (The Ides of March, 2011). Não tem muito tempo, vi “O
Super Lobista” (Casino Jack, 2010), outro que de certa forma retrata os
bastidores da política nos EUA. A lista que se associa a esta perspectiva não é
recente e pequena: “A Mulher Faz o Homem” (Mr. Smith Goes to
Washington, 1939), “Vassalos da Ambição” (The Best Man,
1964), “O Candidato” (The Candidate, 1972), “Bob Roberts”
(1992), “Segredos do Poder” (Primary Colors, 1998), “Recontagem”
(Recount, 2008), “Os Candidatos” (The Campaign, 2012),
entre outros, também trazem uma premissa semelhante.
Tudo pelo Poder e House of Cards.
Ao pensar sobre
estes filmes, podemos refletir sobre o quanto o cinema é importante para a
política nos Estados Unidos – e não apenas no formato mais tradicional para
este tipo de narrativa, como é o caso dos documentários. O cinema comercial,
que abrange a grande massa da população, tem destaque neste cenário,
diferentemente do que, até o momento, tem ocorrido no Brasil – inclusive
destacamos a premiada série “House of Cards” (2013-), da Netflix, que também
aborda as intrigas políticas para chegar ao cargo de Secretário de Estado dos
Estados Unidos, considerada uma das mais altas posições do governo.
Il Divo, No e Escobar.
“Il
Divo: La Spettacolare Vita di Giulio Andreotti” (2008), filme italiano de
Paolo Sorrentino e “No” (2012), filme chileno de Pablo Larraín, bem como
o filme “Escobar: Paraíso Perdido” (Escobar: Paradise Lost,
2015), de Andrea Di Stefano, são outros exemplos recentes, fora do eixo hollywoodiano,
a retratar a questão política contextualizando o que se passa além das salas
fechadas e reuniões secretas e das propagandas eleitorais e discursos abertos
dos sujeitos envolvidos.
O Candidato Honesto e Tropa de Elite 2.
No Brasil,
os casos mais próximos de filmes semelhantes aos apresentados anteriormente,
que possam contemplar os bastidores da política contemporânea em âmbito
nacional, possivelmente são a comédia “O Candidato Honesto” (2014), de
Roberto Santucci, “Lula, o Filho do Brasil” (2009), de Fábio Barreto e
Marcelo Santiago e “Tropa de Elite 2: O Inimigo Agora é Outro”, de José
Padilha. O primeiro, uma comédia que por vezes utiliza de piadas estereotipadas
para retratar o perfil do político profissional brasileiro; o segundo, inspirado
na trajetória do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva,
trata mais da biografia do ex-presidente do que dos trâmites dele na
presidência – ou para chegar até ela; e o terceiro, um trabalho mais bem
acentuado sobre o sistema e sobre aqueles que se mantém nele (e dele).
Banksy.
Isto é algo
a se pensar. Numa época em que “o entretenimento da política e a política do
entretenimento”, como afirma Leonidas Donskis (2014, p. 89), são as únicas duas
coisas que têm valor “no mundo da sociedade tecnológica e consumista”, notamos
que enquanto outros países salientam este movimento através de produções
cinematográficas e televisivas, o Brasil permanece tendo como fio condutor da
memória coletiva e social, sobretudo, a mídia jornalística e as redes sociais.
Sabemos que
o cinema pode ser uma arma política muito forte. Prova disso é o envolvimento
de cineastas e atores/atrizes nas campanhas presidenciais. No Brasil também
temos esse “efeito reality show” em ascensão, com campanhas cada
vez mais caricaturais e com a participação de “celebridades”, não apenas do
cinema e da televisão, demonstrando suas opções em relação aos partidos e
candidatos/candidatas – estes, em muitos casos, outros(as) brilhantes
atores/atrizes. Nada contra quem assume uma posição partidária, seja uma pessoa
conhecida ou desconhecida; no entanto, é preciso ter cuidado quando mais do que
uma posição pessoal, o que se assume pode ser na verdade somente mais uma
engenhosa estratégia partidária do show business para atrair
novos eleitores.
Banksy.
A política
no Brasil chega a ser tão envolvente quanto o futebol e a novela, mas
percebemos que poucos cineastas se aventuram a colocar em tela o jogo – ou as
regras do jogo – deste processo que gera tanta audiência e polêmicas. O que
estaria faltando? Coragem? Criatividade? Liberdade? Não sei, pela quantidade de
bons profissionais que temos, acredito que o problema seja de outra ordem.
Talvez a falta de incentivo financeiro para produzir tais filmes; a abertura
das grandes produtoras e distribuidoras, que dominam o mercado cinematográfico;
e até mesmo a pouca cultura estabelecida na “preferência nacional” – uma
cultura aberta a receber um tipo de filme que esteja mais preocupada em pensar sobre
ele do que somente rir dele – são fatores que devem pesar
sobre isto.
Morpheus, Matrix.
Desde a
Alemanha nazista e a União Soviética revolucionária ao Brasil Varguista e os
Estados Unidos em guerra permanente, o cinema tem influenciado sobremaneira, no
campo da política, o modo de pensar – e possivelmente de agir – de milhões de
pessoas ao redor do mundo. O filme não é apenas um produto/documento histórico,
mas como apontava o historiador francês Marc Ferro já na
década de 1970, o filme deve ser considerado também um agente da história por
meio da relação estabelecida entre o autor, o espectador e o tema.
Destacamos
a relevância da sétima arte na contemporaneidade ao situarmos “o cinema como
uma nova forma de pensamento histórico” (ROSENSTONE, 2010, p. 25), que
influencia de forma direta no itinerário de formação humana (ALMEIDA;
FERREIRA-SANTOS, 2011), sempre associando ao que Valesca G. Litz (2009, p. 27)
ressalta: seu “contexto histórico, social, político e ideológico”.
Referências
ALMEIDA,
Rogério de; FERREIRA-SANTOS, Marcos. O cinema como itinerário de
formação. São Paulo, Képos, 2011.
DONSKIS,
Leonidas; BAUMAN, Zygmunt. Cegueira moral: a perda da
sensibilidade na modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.
FERRO,
Marc. Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
LITZ,
Valesca Giordano. O uso da imagem no ensino de História. Universidade
Federal do Paraná, Caderno Temático do Programa de Desenvolvimento Educacional
do Estado do Paraná – PDE. Curitiba, PR. 2009.
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