Literatura de cordel
Publicado em literatura por Angelo Rafael
Num tempo de estranhezas, esquecimentos e instantaneidades, a poética de
Leandro Gomes de Barros, desprovida da erudição acadêmica, assume o pódio que
lhe é de direito, nos revelando a essência de um Brasil puro e verdadeiro.
De tempos
em tempos somos surpreendidos por uma explosão de vida. Sem nos darmos conta,
uma aparece e nos encanta, arrebata, congela todo o conhecimento outrora
adquirido, e só pensamos naquela música, soneto, pintura, um acorde de violino
ou o rasgo de uma gaita. Anoitecemos e amanhecemos com aquilo na cabeça. Temos
até medo de adentrarmos nela para conhece-la melhor, participar, olhar de
mansinho sobre o privilégio de ser só o que é: grande! Leandro Gomes de Barros
é vida! Este homem, que viveu na peregrinação e pousos da escrita popular é
hoje considerado o mais notável e importante entre os poetas. Nasceu em 1865,
no dia 19 de novembro, na cidade de Pombal, sertão paraibano. Aos dez anos
começou a escrever e foi o pioneiro na escrita e edição de histórias em
folhetos. Escreveu, editou, publicou, distribuiu e vendeu sua própria produção.
Teve sua própria tipografia.
Muitos
foram as autoridades das letras e da história que falaram sobre ele. Câmara
Cascudo escreveu: “ Viveu exclusivamente de escrever versos populares,
inventando desafios entre cantadores, arquitetando romances, narrando as
aventuras de Antônio Silvino, comentando fatos, fazendo sátiras. Fecundo e
sempre novo, original e espirituoso, é o responsável por 80% da glória dos
cantadores atuais” – Vaqueiros e Cantadores – Ed. De Ouro. Seu espólio
literário foi vendido e muitos usaram de sua poesia e o plagiaram. Alguns se
apropriaram de seus versos a ponto de mudarem o acróstico do fim da história.
Foi o primeiro poeta a lutar por direitos autorais no Brasil. Em 1976, Carlos
Drumond de Andrade publicou no Jornal do Brasil na edição do dia 9 de setembro:
“Em 1913, certamente mal informados, 39 escritores, num total de 173, elegeram
por maioria relativa Olavo Bilac príncipe dos poetas brasileiros. Atribuo o
resultado a má informação porque o título, a ser concedido, só poderia caber a
Leandro Gomes de Barros, nome desconhecido no Rio de Janeiro, local da eleição
promovida pela revista FON-FON, mas vastamente popular no Nordeste do País,
onde suas obras alcançaram divulgação jamais sonhada pelo autor de “Ouvir
Estrelas”. ... E aqui desfaço a perplexidade que algum leitor não familiarizado
com o assunto estará sentindo ao ver defrontados os nomes de Olavo Bilac e
Leandro Gomes de Barros. Um é poeta erudito, produto da cultura urbana e
burguesa média; o outro, planta sertaneja vicejando à margem do cangaço, da
seca e da pobreza. Aquele tinha livros admirados nas rodas sociais, e os salões
o recebiam com flores. Este, espalhava seus versos em folhetos de cordel, de
papel ordinário, com xilogravuras toscas, vendidas nas feiras a um público de
alpercatas ou de pé no chão.
... Não foi
príncipe de poetas do asfalto, mas foi no julgamento do povo, rei da poesia do
sertão, e do Brasil em estado puro. ”
Bebeu na
fonte do poeta ninguém menos que Ariano Suassuna, que no Auto da Compadecida
expõe o cavalo que defecava dinheiro. Suassuna o trata de filósofo numa de suas
últimas entrevistas em que o repórter pergunta de sua crença ou não em Deus. “
– Eu estaria lascado! se não acreditasse em Deus”. Disse o escritor ao recitar
um ícone da coletânea de Leandro:
“Por que
Existem o Mal e o Sofrimento Humano?
Se eu
conversasse com Deus/ Iria lhe perguntar:/ Por que é que sofremos tanto/ Quando
se chega pra cá? / Perguntaria também/ Como é que ele é feito/ Que não dorme,
que não come/ E assim vive satisfeito. / Por que é que ele não fez? A gente do
mesmo jeito? Por que existem uns felizes/ E outros que sofrem tanto? / Nascemos
do mesmo jeito, / Vivemos no mesmo canto. / Quem foi temperar o choro/ E acabou
salgando o pranto? ”
Leandro
Gomes de Barros é patrono da cadeira número um da ACADEMIA BRASILEIRA DE
LITERATURA DE CORDEL. Encontrou a sua grande e única certeza irremediável no
dia 4 de março de 1918, em Recife.
Neste ano
2015 celebramos os 150 anos de nascimento do poeta.
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