Livro: ensaio
A INVEJA DE NICOLAS
FOUQUET
(1615 – 1680)
De origem
aristocrática, Fouquet alcançou precoce
projeção a partir dos treze anos, quando foi nomeado defensor do
parlamento. Daí em diante, foi avançando de posto, ocupando diferentes e
importantes funções na administração pública até 1650 quando, com o apoio do
cardeal Mazarino, passou a ocupar o importante cargo de procurador geral do parlamento de Paris.
Durante o
exílio de Mazarino, responsabilizado pela sedição dos Frondes, ao tempo da
regência da rainha Ana da Áustria, por ocasião da menoridade de Luís XIV,
Fouquet deu-lhe secreta cobertura, pondo-o ao corrente de tudo que acontecia na
cúpula do governo.
Nicolas Fouquet
Quando do
retorno de Mazarino, em 1653, Fouquet recebeu, como compensação por sua
lealdade, o posto de superintendente das finanças, o que o tornou ainda mais
bem situado meio aos ricos da época, ele que já tivera aumentado sua riqueza em razão do casamento, em 1651,
com a rica e nobre Marie de Castille.
A fortuna
pessoal e o charme de sua personalidade contribuíam sobremaneira para a
elevação do crédito da administração pública. Sua influência era tão destacada
que até seu protetor, o cardeal Mazarino, solicitava-lhe liberação de verbas.
Em pouco
tempo, Fouquet, cada vez mais rico, já não fazia distinção entre suas contas e
as do governo que servia. Como sói acontecer, em casos tais. Fouquet, deixa-se
enlear por um sentimento de inefável impunidade. Praticamente, não havia quem
estivesse em posição de opor-lhe embaraços ou cobranças que não tivesse sido
beneficiário de uma ou mais das facilidades que, a seu exclusivo critério,
prodigalizava. O próprio Mazarino, enfermo, encontrava-se envolvido até o
pescoço razão pela qual preferia deixar qualquer acerto de contas para a gestão
do seu potencial sucessor, Jean-Baptiste Colbert. Fouquet, por seu turno,
considerava favas contadas substituir Mazarino, quando, facilmente, poderia
imputar-lhe a responsabilidade pela faltas que pudessem vir a ser descobertas.
Morto Mazarino, em março de 1661, quem assume o seu lugar é Colbert, que não
fazia segredo da antipatia que votava a Fouquet, em razão do seu estilo de
vida.
Luís XIV
acomodava-se, com desconforto, aos excessos de Fouquet, por levar em conta,
talvez, seu prestígio como mecenas da literatura e das artes em geral que
descobrira e projetara para o mundo nomes como os arquitetos Le Vau, Le Nôtre,
Le Brun e Pierre Puget, este último, como François Anguier, também escultor,
além do pintor Nicolas Poussin, e dos geniais Molière e La Fontaine, até
quando, a 17 de agosto de 1661, Fouquet ofereceu, no seu novo castelo, um
banquete cujo brilho apoteótico fez dele uma das três maiores recepções
realizadas em solo francês, em todos os tempos.
Luís XIV
Os convivas,
o melhor da nobreza, inteligência, riqueza e aristocracia europeias, à frente
Luís XIV – porfiavam em escolher o que mais esplendia: o paisagismo dos
jardins, exuberantes de vegetação e beleza? A arquitetura triunfal, os detalhes
do rico acabamento, os móveis, as tapeçaria, os quadros, os vitrais? A
alexandrina biblioteca de treze mil volumes, ricamente encadernados? Ou a
qualidade da música produzida pela diferentes orquestras que se distribuíam nos
vários ambientes internos e externos do colossal palácio? E que lugar ocupariam
os acepipes, de raro sabor, que compunham o ágape babilônico?
Luís XIV,
com apenas 23 anos, mas já há dezoito no poder (isso mesmo, herdou o trono aos
cinco anos de idade), a tudo testemunhava iracundo. Pensadores, poetas,
pintores, arquitetos, escultores, músicos, príncipes, generais, diplomatas se
alternavam nos elogios torrenciais prodigalizados àquele novo Petronius,
espicaçando a inveja do rei.
Fouquet,
radiante, mal disfarçava a sensação de triunfo ao superar o futuro Rei Sol,
como centro das atenções, naquele momento glorioso.. Sim, a vida é bela e vale
a pena ser vivida, sobretudo quando se é Nicolas Fouquet, senhor das finanças e
do bom gosto, na França e na Europa, nesta segunda metade do século XVIII.
Três semanas
depois da grande festa, a 5 de setembro, Luís XIV convida Nicolas Fouquet para
acompanha-lo a Nantes, onde, imediatamente após a chegada, ordena sua prisão
por desfalcar o Erário.
Ao longo de
três anos, Fouquet respondeu, preso, a um processo realizado ao arrepio da lei
em vigor. A pressão da opinião pública e de várias personalidades influentes em
favor, durante as quais La Fontaine e Madame de Sevigné, conseguiu a mais
branda das penas possível diante da inveja irada do rei: a 20 de dezembro de
1664, Fouquet recebeu a pena de banimento e confisco de bens. Inconformado,
Luís XIV “comutou “ a pena de banimento pela, muito mais grave, de prisão
perpétua. Em começos de 1665, Nicolas Fouquet foi transferido para a fortaleza
de Pignerol, onde morreu a 23 de março de 1680.
O cardeal Mazarino
Movido,
provavelmente, pelo propósito de fazer esquecer o mecenato de Fouquet, Luís
XIV, o Grande Rei Sol, que exprimia sua postura autoritária e ególatra dizendo:
l’État c’est moi e suas preocupações com o futuro afirmando: aprés moi, le deluge, fez da França, ao longo de seu
reinado de setenta e dois anos, o grande centro da inteligência mundial do
século XVII e começo do XVIII.
Não se discute a suficiência dos
motivos que justificaram a prisão de Fouquet. O que se quer evidenciar é que o
envolvimento pessoal do rei, agindo fora de sua conduta habitual, nunca teria
ocorrido não fosse a inveja que transbordou do coração do monarca, naquela
festa que se transformou para Fouquet em pesadelo de uma noite de verão. Para sempre (U. V. Châtelain, Le
Superintendant Nicolas Fouquet, 1905).”
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