terça-feira, 1 de dezembro de 2015

O VÉU DE VERÔNICA

História



Verdade ou mito?


Véu de Verônica ou Sudarium ("lenço para enxugar o suor" em latim), chamado geralmente apenas de "A Verônica" e conhecido na Itália como "Volto Santo" ("Santa Face"), é uma relíquia católica na forma de um pedaço de pano que, segundo a lenda, tem gravado em si a aparência de Jesus e que não foi produzido por mãos humanas (ou seja, um dos acheiropoieton). Várias imagens ainda existentes reivindicam ser a relíquia "original" (ou serem cópias primitivas), mas a evidente natureza lendária da história faz com que haja muito menos pessoas, mesmo entre católicos tradicionais, que defendem a autenticidade da relíquia de forma séria, principalmente quando se compara com a defesa do Sudário de Turim.
A forma final da lenda ocidental conta que Santa Verônica de Jerusalém encontrou Jesus quando ele vinha carregando a cruz pela Via Dolorosa em direção ao Calvário. Quando ela parou um instante para limpar-lhe o sangue e suor do rosto (sudor em latim) com seu véu, seu semblante teria ficado impresso no tecido. O evento é comemorado na sexta estação das estações da cruz. De acordo com algumas versões, Veronica teria depois viajado à Roma para presentear o véu ao imperador romano Tibério e, ainda segundo esses relatos, o véu teria diversos poderes milagrosos, como o de aliviar a sede, curar a cegueira e até mesmo o de ressuscitar os mortos.
Contudo, esta história só adquiriu seu formato atual na Idade Média e, por isso, é muito improvável que seja verdadeira. É mais provável que sua origem esteja relacionada com a história da imagem de Jesus na Igreja Ortodoxa, a da relíquia conhecida como "Mandylion" ou "Imagem de Edessa", somada a um desejo dos fieis de verem a face de seu salvador. No século XIV, o véu tornou-se um ícone central na Igreja Ocidental - nas palavras do historiador da arte Neil Macgregor:"Daí [século XIV] em diante, onde fosse a Igreja romana, a Verônica ia também" .
Não existem referências à história de Verônica e seu véu nos evangelhos canônicos e todo o relato deriva de séculos de tradição. A referência mais próxima é o milagre de Jesus curando a mulher com sangramento, no qual ela é curada ao tocar a barra do manto de Jesus (Lucas 8:43-48). A mulher foi posteriormente identificada como sendo Verônica pelo apócrifo "Atos de Pilatos". Depois, a história foi novamente aumentada no século XI pelo relato de que Jesus teria presenteado a mulher com um retrato de si mesmo num tecido, o mesmo que depois ela utilizaria para curar Tibério. A ligação da lenda com o carregamento da cruz durante a Paixão e a história do aparecimento milagroso da imagem no tecido foi obra da "Bíblia em Francês" de Roger d'Argentuil no século XIII e esta versão tornou-se ainda mais popular depois da publicação da obra internacionalmente popular "Meditações sobre a Vida de Cristo" por volta de 1300 por um autor Pseudo-Boaventurano. Foi a partir daí que as representações artísticas da obra mudaram para incluir também a coroa de espinhos, sangue e a expressão de um homem em intenso sofrimento. A imagem passou a ser bastante comum por toda a Europa católica, passando a integrar as Arma Christi; o encontro de Jesus e Verônica tornou-se uma das estações da cruz, presente em todas as igrejas católicas.
Na Via Dolorosa, em Jerusalém, há uma pequena capela conhecia como "Capela da Santa Face"[4] no local onde tradicionalmente se considera que estava a casa de Santa Verônica e onde o milagre teria ocorrido .
De acordo com a Enciclopédia Católica, o nome "Verônica" é um portmanteau popular da palavra latina "vera" ("verdadeira", como em Vera Cruz), e a grega "icon" ("imagem"); por isso, o Véu de Verônica era amplamente considerado durante a Idade Média como a "verdadeira imagem" e a representação mais fiel da face de Jesus, muito antes do Sudário de Turim.
Não há dúvida que uma imagem estava abrigada em Roma nos séculos XIII, XIV e XV conhecida e venerada como "Véu de Verônica". Porém, a história desta imagem é bastante problemática.
Geralmente se assume que a Verônica estava abrigada na antiga Basílica de São Pedro durante o papado de João VII (705-708), pois uma capela conhecida como "capela de Verônica" foi construída na época; autores posteriores também assumiam assim. Porém, não é possível ter certeza alguma disso, pois os mosaicos que decoravam a capela não fazem referência alguma à história de Verônica. Além disso, escritores contemporâneos não fazem referência à Verônica neste período. Porém, é provável que a relíquia estava ali por volta de 1011, quando um escriba foi identificado como sendo seu guardião.


Porém, registros seguros sobre a Verônica só aparecem em 1199, quando dois peregrinos chamados Gerald de Barri (Giraldus Cambrensis) e Gervásio de Tilbury escreveram, em tempos diferentes, sobre suas visitas a Roma citando diretamente a relíquia. Logo depois, em 1207, o tecido ganhou importância depois de ser apresentado ao público pelo papa Inocêncio III, que também concedeu indulgências a quem rezasse diante dela. Esta procissão, entre a Basílica de São Pedro e o Hospital do Santo Spirito, tornou-se um evento anual e, num deles, em 1300 o papa Bonifácio VIII, que a transladou para a Basílica em 1297, teve a ideia de proclamar o primeiro Jubileu no mesmo ano. Durante o jubileu, a Verônica foi apresentada para os fieis e tornou-se uma das mirabilia urbis ("maravilhas da cidade") para os peregrinos que visitavam Roma. Pelos duzentos anos seguintes, a Verônica, abrigada em São Pedro, foi considerada a mais preciosa de todas as relíquias cristãs. Foi ali que Pedro Tafur, um visitante espanhol em 1436, escreveu:
Do lado direito está um pilar alto como uma pequena torre onde está depositada a santa Verônica. Quando ela precisa ser exibida, abre-se um buraco no telhado da igreja pelo qual uma arca ou berço de madeira com dois clérigos dentro é içado até ela; e, depois de descerem, a arca ou berço é puxado de volta e os dois, com a maior reverência, tiram a Verônica e a mostram para o povo, que lá se reuniu na data marcada. É frequente que os fieis corram risco de vida, pela quantidade e pela grande pressão que fazem.
— Pedro Tafur, Andanças e Viajes.


Depois do saque de Roma de 1527, alguns autores relatam que o véu teria sido destruído: Messer Unbano, escrevendo para a duquesa de Urbino, conta que a Verônica foi roubada e estava passando de mão em mão nas tavernas de Roma . Porém, outros afirmam que ela teria continuado no Vaticano e uma testemunha do saque afirma que ela não foi encontrada pelos saqueadores.


Muitos artistas da época criaram reproduções da Verônica, o que também sugere que ela teria sobrevivido ao saque. Mas, em 1616, o papa Paulo V proibiu a criação de novas cópias, exceto se fossem produzidas por clérigos da Basílica de São Pedro. Em 1629, o papa Urbano VIII não apenas proibiu as reproduções como também ordenou a destruição de todas as cópias existentes. Seu édito declarou que todos os que tinham cópias deveriam levá-las para o Vaticano sob pena de excomunhão.
Depois disso, a Verônica desapareceu completamente da vista dos fieis e sua história não foi preservada. Como não existem evidências conclusivas de que ela tenha deixado a Basílica de São Pedro, é provável que lá esteja até hoje, o que também é consistente com as poucas informações dadas pelo Vaticano nos séculos recentes.
Há pelo menos seis imagens que, além da semelhança que têm entre si, alegam serem ou a Verônica original ou uma cópia primária dela (e não uma "cópia da cópia") ou, em dois casos, a Imagem de Edessa. Todas estão fechadas por elaboradas molduras e cobertas por lâminas metálicas banhadas a ouro, através da qual, por uma abertura, aparece a face.
Na Basílica de São Pedro certamente está uma imagem que se alega ser a mesma reverenciada durante a Idade Média. Ela está abrigada numa capela atrás da sacada do pier sudoeste da cúpula.
Há pouquíssimos relatos de inspeções em tempos modernos e não existem fotografias detalhadas. A mais rigorosa inspeção no século XX ocorreu em 1907, quando o historiador da arte jesuíta Joseph Wilpert recebeu permissão para remover duas camadas de vidro para inspecionar a imagem. Ele comentou que viu apenas "um pedaço de um material levemente colorido, um pouco desbotado por causa da idade, com duas leves manchas de marrom-ferrugem ligadas entre si".
Apesar disso, ela ainda é apresentada anualmente aos fieis durante o quinto domingo da Quaresma, o Domingo da Paixão. A benção ocorre depois das vespertinas tradicionais, às 5:00 da tarde, na qual uma curta procissão pela Basílica ocorre enquanto se recita a litania romana. Um sino toca e três canonico segura a pesada moldura na sacada acima da estátua de Santa Verônica. Desta distância, nada se vê da imagem em si e apenas o contorno da moldura interna é visível.
Há duas tradições principais para a iconografia da face representada no Véu de Verônica. Uma (Tipo I), comum na arte italiana, mostra a face de Cristo barbada, sofrendo, cheia de feridas e provavelmente coroada com espinhos. Outra (Tipo II), comum na arte da Espanha e da Rússia, mostra a face de Cristo geralmente em repouso com o cabelo à altura dos ombros e uma barba bifurcada, geralmente rodeada por um halo cortado por uma cruz.

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