Arquitetura
Publicado em arquitetura por Michelle Oliveratto.
É mineira, estudante de música e observadora incansável do mundo.
A arquitetura inovadora do homem que tirou da natureza a inspiração para suas obras.
Você já foi à praia, geralmente na infância, e construiu castelos de areia? A resposta, na maioria das vezes, é sim. Talvez, essa seja a primeira explicação para a sensação de familiaridade ao ver uma obra do arquiteto Antoni Gaudí.
Foi a catedral da Sagrada Família que me apresentou para todo esse universo Gaudiniano. E, ao vê-la, fui automaticamente tele transportada para infância e experimentei da mesma sensação de encantamento. Como se diante de mim estivesse um enorme castelo de areia. E muito me assustava o fato de que aquele monumento, para mim, a princípio desconhecido (de um arquiteto que também desconhecia), provocar sensações tão familiares e íntimas. Foi, então, que a curiosidade por essa ligação imediata me levou às respostas e me apresentou para esse mundo de formas irregulares, porém extremamente sedutoras.
Antoni Gaudí, filho de uma família simples, teve uma infância difícil, pois sofria com febres reumáticas, o corpo fraco impedia-o, muitas vezes, de brincar e frequentar a escola, mas fortalecia seu poder de observação. Pois, ocupava seu tempo a observar a natureza. Mais velho, foi trabalhar com seu pai na oficina de caldeiraria, onde aprendeu as virtudes do trabalho e as transformações das superfícies. O que foi importante para aguçar sua visão tridimensional, que quando arquiteto, claramente, influenciou seu trabalho.
Esses fatores que antecederam sua vida de arquiteto foram de fundamental importância para a assinatura e característica principal das suas obras. Sua infância adoentada estimulou o poder de observação, e encontrou na natureza as normas essenciais para transferir isso à construção. Como na natureza não há linhas retas, suas obras são marcadas pelas curvas, preocupação com a presença da luz natural, movimento das ondas, fundo do mar, troncos das arvores, folhagem e inúmeras outras referências. Seus projetos eram verdadeiros cânticos da natureza. Sua preocupação não era apenas com a estrutura e seu interior, mas também com cada detalhe de decoração. Oferecendo para nossas retinas uma visão minimalista e rica em cores, significado e beleza.
Gaudí desenvolveu com extrema devoção seu oficio de arquiteto, não apenas habitações, mas obras de artes habitáveis. Visitar a “Sagrada Familia”, “Casa Batllò” ou “La Pedrera” é uma oportunidade de estimular todos os sentidos, pois é um contato direto com arte, técnica, matéria e espírito.
Sua preocupação em fazer com que as construções interagissem com o meio, suas referências constantes às lembranças daquele menino com febres reumáticas - que passava seus dias a observar -, retratar o balanço do mar, flores, algas marinhas, troncos de árvores e as cores vivas do meio ambiente, além de revolucionar a arquitetura com sua visão inovadora, intuitiva e original, era uma forma de manter viva aquela criança solitária, sensível e de família humilde, mas com uns olhos tão azuis e lindos que emprestou essa beleza para tudo que via e criava. Com uma humildade que só os verdadeiros gênios têm, uma vez, quando envolvido na obra da Sagrada Família, perguntou a um trabalhador o que ele achava da construção. Teve a seguinte resposta: “Dá gozo”. Eram muitas as testemunhas que observaram Gaudí dizer com os olhos cheios de alegria sobre a opinião recebida.
Se a arquitetura é esse ofício nobre de organizar espaços e criar abrigos, Gaudí foi além. Criou abrigos não só para nossos corpos, mas também para nossa alma e nossa fé. Acolheu nossa retina, provocou o encantamento. Uma catedral que nos remete aos castelos de areia sugere um passeio, também, para nossa infância. Antoni nos mostrou a grandiosidade da natureza, no poder que ela tem de nos encantar a todo o momento, e como ela é acessível. Como ele mesmo disse: “Uma obra de arte deve ser sedutora e universal.” E ele utilizou realmente a linguagem mais universal possível, que é a simplicidade e a sofisticação natural que nos cerca.
Adélia Prado diz: “De vez em quando, Deus me tira a poesia, olho pedra e vejo pedra mesmo.” Acredito que Gaudí era um arquiteto poeta, que talvez Deus tenha tirado a poesia. Ele via pedra, e mesmo tomado pela obviedade da pedra, a retratava com total fidelidade, com suas ondulações, arestas, curvas, texturas. Como somos acostumamos a complicar demais, sofisticar tudo, a simplicidade e sinceridade desse arquiteto acabam sendo poesia para os nossos olhos. Poesia arquitetada.
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