Mundo: quase no fim
dele.
De Ushuaia navegamos, por vinte
e quatro horas, numa imensidão de águas revoltas do Cabo Hornos e Paso
Drake. As portas do silencioso Continente Antártico são o prêmio compensador.
Foto: Rainer Brockerhoff
Contornamos o Cabo Hornos/Cape Horn na ilha
do mesmo nome. O único lugarejo é Puerto Williams com
1600 habitantes. Em formato de meia-lua a ilha é coberta, em sua maior
parte, por líquens, musgos; daí o nome bosques em miniatura e
a observação deste rico microcosmos ser com lupa. O Parque Nacional Hornos
é um lugar privilegiado na Reserva Mundial de la Biosfera.
Aqui é abundante o arbusto Canelo ou
Casca de Anta, cujas sementes atraem as aves austrais. Estas sementes devem ser
saborosas, pois bandos de aves tropicais — fio fio, Elaena Albiceps — viajam mais de 3500 km até Hornos para
nidificar e encher o papo de Canelo.
As correntes fortes no Hornos, os açoites de
vento, as ondas altíssimas justificam-lhe o apelido de Cementerio Marítimo.
Contam-se 800 naves desaparecidas com tripulação de, pelo menos, 10 mil
marinheiros! Pelas condições de chuva, neve, granizo também chamam-lhe Cabo
de las Tempestades e Cabo Donde se Acaba el Mundo. Em
determinados momentos, deu para avaliar, minimamente, a força destas águas: o
vento de 90 km/h nos impediu de abrir a porta da cabine para a varanda!
Por essas e outras, escolhemos o
grande navio MS Zaandam da Holland-America. É confortável, oferece
concertos de piano e violino, música dançante, cassino, piscina, academia,
pista de cooper, jogos de xadrez, bridge, além de fina gastronomia. A
convidativa biblioteca tem mesas para quebra-cabeças coletivos que se
tornaram um ponto de encontro nos finais de tarde. O lounge tem uma
privilegiada vista panorâmica.
Foto: Rainer Brockerhoff
Tais navios são equipados com estabilizadores
e, assim, pode-se minimizar a temida “gangorra” destas águas. Nos navios
menores as histórias de seasickness/enjoos desta travessia não são
animadoras. Numa viagem transoceânica, de Valparaíso à Austrália, a médica do navio, com bom humor, nos
resumiu dois momentos deste incómodo:
“inicialmente
o passageiro pensa que vai morrer;
depois,
o pior: ele sabe que não vai morrer!”
Com a abertura do Canal do Panamá em 1914, a
navegação é praticamente de entretenimento e desportiva; são desafiadoras
as competições entre solitários e experientes navegadores que se
lançam numa tentativa de circumnavegar o globo terrestre. Para os
aficionados, contornar este cabo, onde Atlântico e Pacífico se encontram,
equivale a atingir o cume do Everest.
Curiosa a aventura de um casal inglês em 1956; numa tentativa de contornar o Hornos
do Pacífico para o Atlântico, o veleiro Tzu Hang naufragou.
Não desistiram; no ano seguinte, lá vão eles! Novo naufrágio... mais uma
vez, salvos miraculosamente. É... o Hornos não os quis lá!
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