Brasil: política
Colaboração de Fernando Alcoforado*
Em meados de
1937, após oito anos no poder, Getúlio Vargas deveria seguir o que estabelecia
a Constituição de 1934 e abrir caminho para que as eleições diretas para
presidente fossem organizadas. Três candidaturas se lançaram ao posto: Plínio
Salgado pela extrema direita, Armando de Sales Oliveira representando os
oligarcas paulistas e José Américo de Almeida, candidato sustentado pela
maioria dos governadores estaduais. Enquanto isto, nos bastidores da cena
política, Getúlio Vargas arquitetava alianças favoráveis a um autogolpe de
Estado que o preservaria no poder. Para tanto, contava com expresso apoio de
vários dirigentes do alto comando militar.
Para
realizar o autogolpe, Getúlio Vargas apresentou uma justificativa com a
apresentação de um falso documento chamado Plano Cohen através do qual as
autoridades governamentais anunciaram a descoberta de um terrível golpe de
estado que estaria em gestação objetivando implantar um governo comunista
apoiado pela União Soviética. No dia seguinte à divulgação do Plano Cohen, em 1
de outubro de 1937, o Congresso Nacional declarou o estado de guerra em todo o
país. Em novembro de 1937, com apoio de integralistas, militares e
intelectuais, Getúlio Vargas suspendeu a Constituição de 1934 e colocou todos
os partidos políticos na ilegalidade. O Congresso Nacional, por sua vez, não
ofereceu resistência ao autogolpe realizado contra a democracia. Era o início
do Estado Novo a partir do qual Getúlio Vargas governaria com poderes
ditatoriais.
Em 10 de
novembro de 1937, Vargas instituiu o Estado Novo em um pronunciamento em rede
de rádio, no qual lançou um Manifesto à nação, no qual dizia que o regime tinha
como objetivo reajustar o organismo político às necessidades econômicas do
País. Após a Constituição de 1937, Vargas consolidou seu poder. O governo
implantou a censura à imprensa e a propaganda do governo era coordenada pelo
Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Também houve forte repressão ao
comunismo, amparada pela "Lei de Segurança Nacional", que possibilitou
reprimir movimentos revolucionários como a denominada Intentona Comunista de
1935.
Logo que
decretou o Estado Novo, Getúlio Vargas realizou o anúncio de nova Constituição
para o Brasil, conhecida como “Constituição Polaca” que reafirmou vários
dispositivos que alargaram os poderes do presidente e acabaram com os partidos
políticos que disputavam vagas no Poder Legislativo. Dessa forma, eram lançadas
as bases de sustentação dessa nova ditadura. Além de desmobilizar os grupos
políticos do país, Vargas também reforçou o apoio ao regime ao fortalecer o tom
populista que intermediava sua relação com os trabalhadores. A efetivação dos
direitos trabalhistas e a propaganda positiva dedicada ao governo logo surtiu
efeito quando foram observadas manifestações de oposição mínimas ao Estado
Novo. Vargas era aceito enquanto líder capaz e necessário para se combater a
ameaça comunista e promover o desenvolvimento nacional.
Alguém
perguntaria quais seriam as semelhanças entre o autogolpe de Getúlio Vargas e o
que Dilma Rousseff poderia adotar? No caso de Getúlio Vargas, ele justificou o
autogolpe com a existência do Plano Cohen que objetivava um golpe de estado
para implantar um governo comunista no Brasil apoiado pela União Soviética. No
caso de 2 Dilma Rousseff, seu “Plano Cohen” para justificar o autogolpe seria o
que afirmam os governistas de estar em gestação um golpe constitucional seja
através de impeachment ou de cassação de mandato através do TSE (Tribunal
Superior Eleitoral) para depô-la do poder e promover o retrocesso dos programas
sociais dos governos do PT. O autogolpe de Dilma Rousseff poderia ser colocado
em prática em duas situações: 1) se o impeachment de seu mandato não ocorrer e
houver uma explosão de violência movida pela insatisfação da maioria esmagadora
da nação em todo o País; e, 2) se houver impeachment e ocorrer violência movida
pela resistência patrocinada pelos partidários do atual governo. Se hoje o País
está ingovernável, o nível de ingovernabilidade poderá chegar a níveis máximos
em ambas as situações, fato este que faria com que Dilma Rousseff fizesse uso
do Artigo 136 da Constituição quando passaria a dispor de poderes quase
ditatoriais.
O texto do
Artigo 136 da Constituição do Brasil é o seguinte: O Presidente da República
pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar
estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais
restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e
iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes
proporções na natureza.
§ 1º O decreto que instituir o estado de
defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem
abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a
vigorarem, dentre as seguintes:
I –
restrições aos direitos de:
a) reunião,
ainda que exercida no seio das associações;
b) sigilo de
correspondência;
c) sigilo de
comunicação telegráfica e telefônica; II – ocupação e uso temporário de bens e
serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos
danos e custos decorrentes.
§ 2º O tempo
de duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser
prorrogado uma vez, por igual período, se persistirem as razões que justificaram
a sua decretação.
§ 3º Na
vigência do estado de defesa:
I – a prisão
por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este
comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal,
facultado ao preso requerer exame de corpo de delito à autoridade policial;
II – a comunicação
será acompanhada de declaração, pela autoridade, do estado físico e mental do
detido no momento de sua autuação;
III – a prisão ou detenção de qualquer pessoa
não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder
Judiciário;
IV – é
vedada a incomunicabilidade do preso.
§ 4º
Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o Presidente da República,
dentro de vinte e quatro horas, submeterá o ato com a respectiva justificação
ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta.
§ 5º Se o
Congresso Nacional estiver em recesso, será convocado, extraordinariamente, no
prazo de cinco dias.
§ 6º O
Congresso Nacional apreciará o decreto dentro de dez dias contados de seu
recebimento, devendo continuar funcionando enquanto vigorar o estado de defesa.
§ 7º
Rejeitado o decreto, cessa imediatamente o estado de defesa.
É oportuno
observar que Dilma Rousseff já cogitou decretar o “Estado de Defesa” após a
maior manifestação popular da história do Brasil no dia 13 de março que exigiu
o impeachment da presidente da República. Para instituir o Estado de Defesa,
segundo a Constituição, basta um decreto de Dilma. Já o Estado de Sítio, só
pode acontecer com a aprovação do Congresso Nacional (Ver artigo de Claudio
Humberto Dilma cogitou Estado de Defesa contra protestos disponível no website
, 24/03/2016). Muito provavelmente, a instituição do “Estado de Defesa” não
possibilitaria a Dilma Rousseff se perpetuar no poder como aconteceu com
Getúlio Vargas porque ela é rejeitada por 80% da população brasileira, mas
poderia alongar seu governo moribundo até 2018. O autogolpe de Dilma Rousseff
arrastaria o Brasil muito provavelmente para um estado de guerra civil porque
ela seria incapaz de evitar o colapso do sistema econômico do País com graves
repercussões na esfera política e social.
*Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de
Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento
Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor
nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros
Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a
Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do
Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do
Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento
Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010),
Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento
global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os
Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática
Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015). Possui blog na
Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail: falcoforado@uol.com.br.
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