quinta-feira, 22 de setembro de 2016

REPENSAR O PARLAMENTARISMO

 Literatura – artigo









                                              Colaboração de Raymundo Pinto.
É desembargador aposentado e imortal
Pela Academia de Letras Jurídicas da Bahia


 

            Até a ex-presidente Dilma Rousseff, ao defender-se no Senado, admitiu que é praticamente impossível governar o país com 35 partidos políticos. Esse reconhecimento por parte de alguém que figurou na cúpula do poder durante um bom tempo – como auxiliar e, depois, como titular – atesta, mais uma vez, a necessidade urgente de aprovar-se uma profunda reforma política. Isso se tornou, sem nenhuma dúvida, um consenso entre os brasileiros. Considera-se inadiável, tendo em vista as eleições de 2018, a inclusão da chamada “cláusula de barreira” na legislação eleitoral. O sistema de exigir, dos partidos, um percentual mínimo de votantes no território nacional e em determinado número de estados, sob pena de perder o registro, prevalece na Alemanha e em outros países com inegável êxito. Já se fez uma tentativa nesse sentido no Brasil, mas o STF, de modo equivocado, julgou a iniciativa inconstitucional, na época. É possível, diante das atuais circunstâncias, que venha a rever sua posição.

            Duas outras medidas essenciais se impõem: o fim das coligações e da proporcionalidade nas eleições para os legislativos federal, estaduais e municipais. Os numerosos exemplos de distorções são evidentes. Partidos nanicos elegem representantes na “carona” de agremiações maiores e certos candidatos, inexpressivos na capacidade de conquistar eleitores, também se elegem porque o partido em que está inscrito lançou como “puxador de votos” um cidadão famoso (pode ser até um palhaço) ou de elevado prestígio.

            A experiência internacional vem demonstrando que o denominado voto distrital corrige em grande parte as injustiças que são cometidas no sistema proporcional. A acusação maior que se faz contra essa forma de votação é a de que, ficando a campanha política restrita a uma determinada região (o distrito eleitoral), haveria a tendência de serem discutidos, com mais ênfase, os problemas ditos “paroquiais”, em prejuízos do debate de importantes questões de âmbito nacional. Em alguns países, a superação de tal aspecto negativo se deu com a implantação do voto distrital misto. Consiste em eleger metade das câmaras legislativas pelos distritos e a outra metade por listas apresentadas pelos partidos. O eleitor teria de votar duas vezes: num candidato de sua escolha (concorrente no distrito) e na legenda de um partido de sua preferência. Argumenta-se que uma das vantagens dessa forma de votação é prestigiar cidadãos honestos e preparados que muitas vezes têm dificuldades – por timidez, temperamento introspectivo ou até falta de recursos financeiros – de divulgar suas ideias ao eleitorado. Os partidos passariam a ter mais força e influência, desde que relacionassem, nos primeiros lugares das listas, nomes de respeito e de comprovados méritos.

            Essas soluções de aperfeiçoamento de nossa legislação eleitoral estão ganhando adeptos e, com a proximidade do pleito presidencial de 2018, certamente vão prevalecer nas discussões futuras de propostas para a reforma política. Permita-me o leitor ir um pouco mais além. Sugiro que se reabra o debate sobre as vantagens do parlamentarismo em relação ao presidencialismo. É certo que no passado o povo brasileiro rejeitou a mudança de regime. Quase toda a América Latina se deixou influenciar pelo sistema adotado nos Estados Unidos. Ali, nesse ponto, prevalece uma cultura bicentenária de fortes raízes históricas. Convoco os interessando no tema que voltem os olhos para as vitoriosas experiências na Europa. Os principais países do Velho Continente, desde que terminada a Segunda Guerra Mundial (1945), vivem há muito tempo com um invejável equilíbrio institucional, graças a um sistema que permite a superação de crises sem traumas ou interrupções da normalidade democrática. No Brasil, transtornos e agitações marcaram os períodos, nas últimas décadas, em que se apeou do poder, por meio de impeachment, dois presidentes da República. O sistema parlamentar foi praticado no nosso país – sem sobressaltos, ressalte-se – durante os quarenta e nove anos de D. Pedro II como imperador.
           
            No parlamentarismo, os membros do Legislativo são forçados a serem mais responsáveis com os mais graves problemas sociais, econômicos e políticos do país. Se o primeiro-ministro escolhido por eles fracassa em sua missão, a forma de substituí-lo é fácil e prática, bastando votar o chamado “voto de confiança”. São evitadas, assim, as crises. Por outo lado, caso os deputados se envolvam num impasse na indicação de um novo primeiro-ministro, o Chefe de Estado – presidente da república ou o rei nas monarquias – tem o poder de dissolver o Parlamento, convocando novas eleições. Tudo feito sem comprometer os princípios democráticos.

            Concluídas as eleições para prefeito e vereadores, oxalá o povo brasileiro realmente se interesse em mudar as velhas e ultrapassadas estrutura e legislação políticas vigentes, discutindo o assunto com seriedade e racionalidade, vencidos os radicalismos ideológicos, bem como as influências malévolas do populismo, da demagogia e do poder econômico. Repensar o parlamentarismo, a meu ver, deve ser um tema que merece inclusão no debate.  


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