Cláudio Goldberg Rabin
De São Paulo para a BBC
Brasil
Grupo percorreu a Amazônia peruana atrás de ruínas desconhecidas
por 13 dias
Um americano, um francês, um peruano e um
brasileiro estavam no meio da Amazônia peruana procurando ruínas desconhecidas.
Parece o início de uma piada de salão, mas é a premissa da aventura de uma
equipe de exploradores que ocorreu em julho deste ano para encontrar pistas que
levassem à descoberta de Paititi (conhecida também como El Dorado), uma cidade
da civilização inca jamais encontrada.
A expedição do grupo multinacional por uma região a 150 quilômetros a
noroeste de Cusco contou com 20 pessoas e durou 13 dias. Foi liderada por
Javier Pazo e Benancio Paravecino, ambos da Paykikin Exploraciones Peru, uma
associação franco-peruana.
"Já temos vários pontos que mostram indícios e sinais de uma rota
para Paititi. Mas o avanço é pouco a pouco", disse Pazo.
Por cerca de meio milênio, centenas de pessoas procuraram sem sucesso a
mesma coisa que o grupo agora busca.
Os exploradores reconhecem a dificuldade e comentam sobre o assunto sem
citar localizações exatas. Falam apenas em pistas e suspeitas de rotas que
podem levar à cidade perdida.
Avançar pela selva intocada foi um desafio para os exploradores
Os avanços são difíceis pois trata-se de uma região de selva intocada e
necessidade de autorização do governo do Peru para ter acesso ao local - dentro
do parque de Megantoni.
Ainda hoje há regiões da Amazônia que são desconhecidas, onde pouco
valem imagens por satélites ou sobrevoos de helicóptero. E mesmo nos locais
conhecidos as evidências físicas do passado podem estar soterradas por séculos
de cobertura vegetal.
Outro integrante da equipe era Gregory Deyermenjian, um psicólogo
americano que participou da expedição como parceiro. Deyermenjian é um dos
exploradores mais experientes do mundo e vem estudando e visitando a região
desde os anos 80.
"Sempre quando vou partir para uma nova investigação me dizem
'espero que você encontre dessa vez'. Mas o que estou fazendo é investigar as áreas
associados com a lenda de Paititi", disse.
Grupo seguiu o 'Caminho de Pedra', uma rota de fuga que levaria a
um refúgio inca
Escadaria foi descoberta por exploradores enquanto percorriam a
selva peruana
Na prática, o grupo está seguindo o chamado "Caminho de
Pedra", uma rota de fuga que levaria a um refúgio quase inacessível usado
pelos incas para se protegerem do jugo dos colonizadores espanhóis. Investigam
sobretudo aonde a rota e as estradas vicinais podem levar.
"Não é uma estrada pavimentada, mas marcas com pedras que, embora
não contínuas, indicam uma rota. O que eu sei é que na área da cordilheira de
Pantiacolla há muitas regiões não documentadas e está associada na cabeça dos
nativos com a lenda de Paititi", disse o veterano.
Depois de tantos anos de pesquisa, o explorador acredita na
possibilidade de descobrir um grande sítio arqueológico é muito pequena — mas
existe. "Se encontrar Paititi fosse o objetivo principal de alguém, então
essa pessoa estaria sempre frustrada".
Marcas em pedras indicam o caminho inca que seria usado para fugir
dos colonizadores
Contudo, as informações de localização são vagas, tanto nos documentos
históricos quantoa nos relatos da tradição oral das populações nativas. Existem
interpretações distintas da origem da palavra e mesmo da região onde pode estar
Paititi.
O arqueólogo finlandês Martti Parssinen, professor do Instituto
Ibero-Americano da Universidade de Helsinque, acredita que Paititi era
originalmente um rio e uma província de alguma maneira relacionada a lagos
inundados - daí dificuldade em encontrá-la.
"Boa parte das evidências históricas apontam que a cidade estava
situada em algum lugar ao norte de Mojos e a sudeste de Rurrenabaque",
disse Parssinen, referindo-se a duas regiões na Amazônia boliviana. Outras
hipóteses falam em Paraguai e até na Amazônia brasileira.
Longe da civilização, as estrelas se tornam as protagonistas da
noite
Para além dos desafios burocráticos e teóricos, existem os desafios
humanos. Se há algo de romântico na aventura de caçar indícios incas no meio da
Amazônia, existem o realismo da jornada estafante e do limite do próprio corpo.
São regiões distantes de zonas urbanas e de difícil acesso. O fotógrafo
gaúcho Danilo Christidis, também membro da Paykikin, acompanhou a jornada para
documentá-la.
Foi sua segunda expedição. Na primeira, em 2011, contraiu tifo e perdeu
15kg.
Peruanos auxiliaram exploradores em sua missão na Amazônia
Grupo caminhou de quatro a sete horas por dia em meio à mata úmida
e fechada.
Dessa vez, tudo transcorreu bem, mas não sem dificuldades. Christidis conta
que caminhavam de quatro a sete horas por dia em meio à mata úmida e fechada.
A marcha começava ao nascer do dia e acabava, por segurança, antes da
chegada da noite, numa jornada que partiu dos 1,2 mil metros de altitude e
chegou ao topo de uma cordilheira, a quase 4 mil metros.
"Tem um determinado momento que não é o teu corpo que te carrega. A
pessoa já está tão esgotada, que é a tua cabeça que te leva. É como um
mantra", disse o fotógrafo.
O próprio terreno muda com a altitude: a floresta vai ficando mais fria
e úmida. "Teve um dia que acampamos em um lugar que parecia que estávamos
no meio da água. O chão parecia uma esponja."
Também conhecida como El Dorado, civilização inca jamais foi
encontrada
Outro objetivo era mandar um drone para passar do ponto mais distante do
Caminho de Pedra já alcançado a pé e fazê-lo sobrevoar o vale do Rio Tímpia,
para colher pistas de qual rota seguir numa próxima expedição.
O drone foi capaz de voar 40 quilômetros e chegar a um lago quadrado
ainda desconhecido, mas por um problema os registros fotográficos ainda não
puderam ser extraídos da máquina.
O responsável pelo equipamento foi engenheiro e
fundador da Paykikin, Nicolas Chapon, um francês de 32 anos que se apaixonou
pela selva peruana aos 10 anos depois de assistir o filme Aguirre, a Cólera dos Deuses.
Arqueólogo finlandês acredita que Paititi era originalmente um rio
e uma província de alguma maneira relacionada a lagos inundados
Nova expedição deve explorar rota achada nesta última missão
Para Chapon, a descoberta mais importante foi um desvio perpendicular ao
Caminho de Pedra. A alteração é sinalizada por uma pequena casa na qual os
incas que passavam pela região podiam descansar antes de seguir viagem.
As próximas expedições devem seguir a nova direção. "Nosso objetivo
é encontrar Paititi, mas também é preciso se perguntar o que é Paititi. Talvez
seja um só lugar, talvez sejam muitos locais pequenos. Não sabemos. Estamos
buscando cientificamente", disse Chapon.
Já Pazo, o líder peruano, disse sua motivação é uma questão de orgulho:
"Quero encontrar o que foi feito pelos meus antepassados para que o mundo
veja a grandeza do nosso passado arqueológico".
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