Sociedade
David Robson
Da BBC Future
GETTY
É praticamente
impossível para a maioria de nós imaginar que ser bonito demais pode ser algo
negativo, a ponto de prejudicar vários aspectos da vida de alguém.
Mas para uma dupla de psicólogas da Universidade da Carolina do Norte em
Charlotte, nos Estados Unidos, que analisaram centenas de estudos sobre o
assunto realizados nas últimas décadas, a beleza traz suas maldições.
Diante das evidências coletadas, Lisa Slattery Walker e Tonya Frevert
perceberam que, de maneira superficial, a beleza é algo que carrega uma espécie
de aura. "Quando vemos alguém com um atributo positivo, nosso
subconsciente, por associação, acredita que aquela pessoa também tem outras
qualidades", explica Walker. "Isso é uma característica que
identificamos nas primeiras interações de um bebê com o mundo".
Para a Psicologia, essa associação intuitiva explicaria o fenômeno
coletivo da premissa de que "tudo o que é bonito é bom". Walker e
Frevert descobriram uma grande quantidade de estudos que mostraram que alunos
mais bonitos em escolas e universidades tendem a ser julgados por professores
como os mais competentes e inteligentes – e isso se reflete em suas notas.
Além disso, a influência dessa premissa tende a aumentar com o passar
dos anos. "Ocorre um efeito cumulativo: ao ser bem tratado, você se torna
mais autoconfiante e tem pensamentos mais positivos e mais oportunidades para
demonstrar sua competência", afirma Frevert.
'Efeito penetrante'
Ser bonito pode ajudar na carreira, mas mulheres tendem a ser
vistas como menos competentes
No ambiente de trabalho, seu rosto pode realmente selar o seu destino.
Considerando-se todas as variáveis, foi descoberto que as pessoas mais
atraentes tendem a ganhar melhor e a subir mais rápido na carreira do que
aqueles considerados fisicamente pouco interessantes.
Um estudo feito com alunos de um curso de MBA dos Estados Unidos mostrou
que a diferença entre os salários dos mais bonitos e dos menos atraentes do
grupo variava de 10% a 15% - o que significa um acúmulo (ou perda) de até US$
230 mil ao longo da vida laboral. "As vantagens de uma pessoa bonita
começam na escola e a acompanham durante toda a carreira", conclui Walker.
Até nos tribunais, a beleza parece exercer seu fascínio. Réus mais
bonitos têm mais chances de obter penas mais leves ou até serem absolvidos.
Da mesma forma, se aquele indivíduo que entrou com o processo for mais
atraente, é para ele que a balança da Justiça tende a pender, fazendo com que
ganhe seu caso e consiga indenizações maiores. "É um efeito
penetrante", define Walker.
Prejudicial à saúde
Pesquisas mostram que beleza pode intimidar e provocar inveja e
isolamento
Apesar de a beleza ser algo favorável na maioria das circunstâncias, há
situações em que ela ainda atrapalha. Enquanto homens bonitos podem ser
considerados bons líderes, certos preconceitos de gênero costumam atrapalhar as
mulheres atraentes, diminuindo suas chances de serem contratadas para cargos
mais elevados, que requerem autoridade.
E, como é de se esperar, os bonitões também são vítimas de inveja. Um
estudo revelou que se você é entrevistado para um emprego por alguém do mesmo
sexo, corre mais risco de não ser considerado para a vaga se o recrutador achar
que você é mais bonito do que ele.
Mais preocupante ainda é o fato de a beleza poder prejudicar a saúde: as
doenças são encaradas com menos seriedade quando afetam os bonitões. Ao
tratarem de pacientes com dores, por exemplo, os médicos tendem a descuidar das
pessoas mais bonitas.
A "bolha" criada em volta da beleza também pode criar um certo
isolamento. Uma pesquisa americana mostrou que as pessoas tendem a se afastar
quando cruzam com uma mulher bonita na rua – talvez em um gesto de respeito,
mas tornando a interação mais distante.
"O fato de uma pessoa ser atraente pode transmitir uma noção de que
ela tem mais poder sobre o espaço à sua volta, mas isso pode fazer com que os
outros sintam que não podem se aproximar dela", afirma Frevert.
Um exemplo interessante disso foi a recente informação, divulgada pelo
site de encontros britânico OKCupid, de que pessoas que aparecem lindas em seus
perfis conseguem menos pretendentes do que aquelas cujas fotos apresentam
algumas imperfeições, e, portanto, são menos intimidadoras.
Atalho 'pouco confiável'
Por isso, como você pode imaginar, ser bonito ajuda, mas não é um
passaporte carimbado para a felicidade.
Frevert e Walker, no entanto, enfatizam que as influências da beleza são
superficiais e não estão arraigadas em nossa biologia, como alguns cientistas
já sugeriram.
"Temos um conjunto completo de padrões culturais sobre a beleza que
nos permite dizer se alguém é ou não atraente – e através dos mesmo padrões,
começamos a associá-la com competência", diz Walker.
De certo modo, trata-se de um atalho cognitivo para uma rápida
avaliação.
"Assim como muitos dos outros atalhos que usamos, esse também não é
muito confiável", rebate Frevert.
E é relativamente fácil diminuir o impacto da beleza – por exemplo, se
um departamento de recursos humanos recolher mais detalhes sobre a experiência
do candidato antes de fazer uma entrevista, sem se deixar influenciar tanto por
sua aparência.
Infelizmente, Frevert ressalta que concentrar-se demais na aparência
também pode ser prejudicial se isso criar estresse e ansiedade – mesmo entre
aqueles que já são abençoados com esse atributo. "Se você ficar obcecado
com a beleza, isso pode alterar suas experiências e relações", afirma ela.
Leia a versão original em inglês dessa reportagem no site BBC Future.
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