terça-feira, 20 de novembro de 2012

ODOIÁ, SAUDAÇÃO À YEMANJÁ - RITOS E PRECEITOS DO CANDOMBLÉ

Luiz Carlos Facó*

                 Ontem, eu e meu compadre Hélbio Palmeira, fomos deitar nossos tributos à festejada rainha das águas salgadas: Yemanjá. Uma tradição que cumprimos há quarenta e cinco anos, ou pouco mais, sem cometermos deslizes ou faltas. Odoiá!
                Solfejei, no momento, depositando buque de rosas nos balaios recipiendários dos presentes os versos do imortal Caymmi, que dizem, salvo engano:
                Dia 2 de fevereiro.
                Dia de festa no mar
                Eu quero ser o primeiro
                pra salvar Yemanjá.

                Escrevi um bilhete pra ela
                pedindo pra ela me ajudar
                Ela então me respondeu
                Que eu tivesse paciência de esperar

                O presente que eu mandei pra ela,
                de cravos e rosas, vingou.
                - Chegou! Chegou! Chegou!
                Afinal que o dia dela chegou.

                Em Salvador é assim. Ninguém se omite em saudar Yemanjá. Místicos, católicos, evangélicos, espíritas, ímpios, todos se irmanam em torno do Orixá, mãe de todos os demais. Numa devoção que cresce a cada ano. São milhares de pessoas que acorrem às praias do Rio Vermelho, para jogar seu presente ao mar. Coisas simples: um frasco de alfazema, bijuterias, moedas, retratos, um cartão, uma carta, um espelhinho – Yemanjá é muito vaidosa – flores, como se fora ouro, incenso e mirra. Cada um deles portando uma mensagem de amor, agradecendo graças recebidas ou requerendo mais um auxílio para si, terceiros, até mesmo os sem intenções definidas, a não ser aquelas visando agradar e reverenciar a senhora das águas. Um costume copiado dos povos da antiguidade, habituados em oferendar a deuses criaturas imoladas e esculturas feitas em cerâmica ou metais preciosos.
                Sou testemunho do arrepio que a aproximação da data dos festejos provoca na pele dos soteropolitanos. Não só na pele, mas em todo o seu ser. Parece coisa feita, como dizem os da terra.
                Nos Terreiros de Candomblé, a animação antecede a festa em dias. As equédes – filhas-de-santo – os alabês – tocadores de atabaques, o rum, rumpi e o lê – os ogãs – oficiantes -  ialorixás e babalorixás – mães e pais de santos, preparam seus instrumentos, luzem suas contas – ibiris – colares, ajeitam suas melhores roupas ritualísticas para a festança. Todos preparam o ébo – oferenda – de milho branco com azeite, cebola e sal, comida preferida da entidade. Por fim, dançam com o abebé – leque simbólico, em prata – numa coreografia que reproduz o movimento das marés.
                Nas casas dos não iniciados, dos poucos afeitos às praticas do candomblé, o burburinho ocorre na cozinha, onde se prepara a galinha de xinxim, o vatapá, o acarajé, o abará, o efó, o caruru para o almoço do dia. Em mutirão, , atêm-se no esmero da escolha da pinga e no cuidado em gelar a cerveja a serem servidas, dês que o presente da homenageada já esteja comprado e embrulhado. Sem que o embrulho receba qualquer tipo de nó, porquanto os assim embalados, mesmo com papeis finos e bonitos, não serão aceitos pela mãe de todos.
                Além dessa euforia, frisson, comuns a todos os segmentos sociais, as pessoas procuram se vestir de branco e azul. Usar pedras marinhas como adereço, além de conchas e cristais transparentes, símbolos da rainha do mar.
                Todas senão a maioria das festas populares ocorridas em chão baiano, originaram-se no catolicismo. Só os festejos de Yemanjá, sincretizada em Nossa Senhora da Conceição, nasceu nas senzalas, no seio do povo, entre os negros vindos das diversas nações africanas: egbas, gégis, krumanos, tapas, angolas, minas, timinis e galinhas. Fato esse que me faz reforçar a crença no poder da força popular.
                 Neste dia, mês e ano – 2 de fevereiro de 2011 – os meus pedidos foram impessoais. Não invoquei ao Orixá qualquer benefício pessoal. Nada de pedido de riqueza, pois a que possuo é incalculável (pois jamais taxada pelo leão do imposto de renda): meus amigos. Por isso mesmo, para eles voltei as minhas preces. Em particular para dois deles, que, acaso leiam essas reflexões, saberão terem sido o alvo das minhas orações.
*Crônica extraída do livro a ser laçado em breve: Memória a Conta-Gotas.
LEIAM SEMPRE: “MUITOS HOMENS INICIARAM UMA NOVA ERA NA SUAS VIDAS A PARTIR DA LEITURA DE UM LIVRO.” (HENRY DAVID THOREAU)

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