NR/ UMA ANÁLISE CRÍTICA E CONSCIENTE DA ECONOMIA
BRASILEIRA
Não é por falta de esforço do governo que a economia brasileira teima em não crescer. São fatores estruturais e conjunturais que explicam as taxas de expansão declinantes do Produto Interno Bruto (PIB) nos últimos dois anos, equivalentes à metade da gestão Dilma Rousseff. A soma desses fatores mostra que o crescimento econômico é limitado pela oferta de bens e serviços e pelo aumento da inflação. Essa limitação, porém, não foi criada espontaneamente, mas é produto de um diagnóstico equivocado feito pela presidente Dilma que deu continuidade à política econômica estabelecida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando a economia do país já havia mudado.
Lula ocupou nos primeiros seis anos de seu duplo
mandato os "estoques" ociosos de oferta que existiam em vários
segmentos da economia quando foi eleito em 2002. Dilma não diagnosticou
corretamente que essa condição havia mudado em 2011 e manteve a política
anterior, buscando avanços onde a capacidade já estava está esgotada. "Não
percebeu que havia herdado - ela sim - uma herança maldita. Assim, não há como
crescer em ritmo necessário, desejável ou sustentável sem que ocorra um novo
ciclo de investimentos e de reformas em segmentos importantes do sistema
produtivo no Brasil".
Essa é a avaliação do ex-ministro Luiz Carlos Mendonça
de Barros que, em entrevista ao Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do
Valor, lançou como pano de fundo para explicar o porquê da percepção
generalizada que existe hoje de que por mais que se faça mais do mesmo, a
economia segue e vai continuar emperrada. Para ele existe uma diferença crucial
entre os governos dos presidentes Lula e Dilma na gestão da economia.
"Para o Lula estava clara a necessidade de
respeitar os princípios de uma economia de mercado, seguindo as leis de oferta
e demanda e respeitando os contratos em que o governo é uma das partes.
Certamente aprendeu isso no longo período em que chefiou o sindicato dos
metalúrgicos no chamado ABC. Já para a presidente Dilma, o crescimento deve ser
liderado pelo Estado por meio de medidas pontuais que, muitas vezes, agridem
regras de mercado e rompem cláusulas de contratos estabelecidos. E esses
critérios soviéticos justificam o recuo dos investimentos privados na primeira
metade de seu mandato. A manutenção dessa política não permitirá ao Brasil
crescer muito mais de 3% ao ano", afirma Mendonça de Barros.
O ex-ministro explica que a grande maioria das forças
positivas que operavam na economia durante o governo Lula perdeu intensidade e
o governo Dilma não percebeu esta mudança. Uma dessas forças - e um componente
estrutural importante para explicar a atividade acanhada atual - é representada
pelos termos de troca do Brasil. Entre 2003 e fins de 2011, os termos de troca
da economia saltaram de 95 para 130. Ou seja, para cada US$ 100,00 de
exportações o Brasil de Lula comprava no exterior o equivalente a US$ 130,00,
contra US$ 95,00 nos anos FHC. Um presente que o país recebeu por conta do
crescimento das importações chinesas.
Como resultado, nos primeiros anos do governo Lula o
superávit comercial chegou a US$ 45 bilhões anuais, provocando uma valorização
fortíssima do real que, de mais de três reais por dólar chegou a R$ 1,60 no
início do governo Dilma. Essas mudanças alteraram o padrão das exportações e
importações brasileiras, provocando um aumento na oferta de bens necessária
para equilibrar o aumento da demanda doméstica provocada pelas políticas
sociais de Lula. Com maior capacidade de importar e com a valorização do real,
o crescimento da demanda interna na casa dos dois dígitos não provocou o
aumento da inflação e manteve em crescimento a massa real de salários.
Os índices de inflação ao consumidor chegaram a ficar
no centro da meta do Banco Central, apesar da expansão acelerada da economia.
As empresas brasileiras, depois de um primeiro momento de cautela com Lula,
passaram a reagir a este período de bonança aumentando de forma importante seus
investimentos. O país viveu durante três ou quatro anos o que se chama de ciclo
virtuoso do capitalismo, ajudado pela política econômica oficial que seguia no
campo macroeconômico o padrão sempre sonhado pelos mercados. Em outras
palavras, o ex-presidente Lula manteve a economia funcionando com regras de
mercado, corrigindo via políticas sociais o viés de concentração de renda que é
o padrão do chamado capitalismo no mundo emergente.
Outra evidência das consequências benéficas da opção
de Lula pela gestão econômica a partir de regras de mercado é a arrancada do
crédito. "Quando se iniciou esse ciclo virtuoso em 2004, o crédito ao
consumo no Brasil era mínimo. Mas ganhou fôlego e dobrou de tamanho em
proporção do PIB. Esta foi uma das forças que, junto com a política de aumentos
reais do salário mínimo, explicam a incrível expansão das chamadas classes
médias no Brasil nos últimos anos. Hoje não se pode esperar a manutenção
daquele ritmo de crescimento das carteiras de crédito dos bancos, pois o
endividamento das famílias chegou ao limite, com a parcela da renda
comprometida com pagamentos de juros e amortizações superando 20% da renda das
famílias."
Mas Mendonça de Barros lembra que esse processo de
expansão das economias de mercado via estímulo ao consumo tem sempre um
horizonte finito de sucesso. Os desequilíbrios, que sempre ocorrem entre
investimento e consumo, acabam por gerar forças contrárias que enfraquecem o sucesso
inicial. Apenas uma nova agenda que fortaleça o aumento da oferta via
investimentos privados pode perenizar os frutos do ciclo de expansão que se
encerra. Neste sentido o exemplo brasileiro não fugiu ao padrão encontrado em
outros países emergentes. E o fim deste ciclo em que aparentemente tudo dava
certo coincidiu com a posse de Dilma no Palácio do Planalto.
Entre os fatores estruturais que dificultam hoje a
expansão da economia, Mendonça de Barros aponta a inflação, que ficou
"mais complicada". "Hoje, a inflação é de serviços e sustentada
pelo nível baixo do desemprego e a preservação da renda. E serviços não dá para
importar. Além disso, por pressão da indústria, o governo promoveu no ano
passado uma desvalorização cambial de mais de 20% que, por azar, veio junto com
o choque de alimentos. Tudo somado, a inflação comeu a renda dos
trabalhadores."
O desempenho da indústria merece particular atenção do
ex-ministro, que coloca o setor entre os fatores conjunturais que explicam a
expansão apática da atividade no país. "Quando se compara o comportamento
da produção industrial no Brasil e nos Estados Unidos nos últimos anos, a
diferença é flagrante". Em 2008 e 2009, período marcado pela crise
financeira global, a produção industrial caiu e muito no mundo todo. Em 2010,
Brasil e Estados Unidos optaram por trilhar caminhos diferentes para recuperar
o crescimento. Nos Estados Unidos, a expansão começou lentamente e a
recuperação só agora se tornou evidente, embora ainda de forma gradual. Não por
outra razão o nível de desemprego é ainda muito alto e o Federal Reserve
continua com sua política de expansão monetária. Mas a recuperação da economia
ganhou tração e deve continuar nos próximos anos.
No Brasil, em 2010, que foi ano de eleição, a
recuperação da produção industrial teve forte expansão inicialmente ao
responder aos agressivos estímulos criados pelo governo, voltando rapidamente
ao patamar pré-crise. "Mas a partir daí, estagnou e não consegue mais
crescer", afirma Mendonça de Barros que vê o crescimento do Brasil
restrito por limitações de oferta e falta de investimentos.
-
Nenhum comentário:
Postar um comentário