quinta-feira, 30 de maio de 2013

DILMA FAZ LEITURA EQUIVOCADA DA ECONOMIA

                                                                 

                                        Texto de Ângela Bittencourt, é Articulista da Revista Valor Econômico.

NR/ UMA ANÁLISE CRÍTICA E CONSCIENTE DA ECONOMIA BRASILEIRA


Não é por falta de esforço do governo que a economia brasileira teima em não crescer. São fatores estruturais e conjunturais que explicam as taxas de expansão declinantes do Produto Interno Bruto (PIB) nos últimos dois anos, equivalentes à metade da gestão Dilma Rousseff. A soma desses fatores mostra que o crescimento econômico é limitado pela oferta de bens e serviços e pelo aumento da inflação. Essa limitação, porém, não foi criada espontaneamente, mas é produto de um diagnóstico equivocado feito pela presidente Dilma que deu continuidade à política econômica estabelecida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando a economia do país já havia mudado.

Lula ocupou nos primeiros seis anos de seu duplo mandato os "estoques" ociosos de oferta que existiam em vários segmentos da economia quando foi eleito em 2002. Dilma não diagnosticou corretamente que essa condição havia mudado em 2011 e manteve a política anterior, buscando avanços onde a capacidade já estava está esgotada. "Não percebeu que havia herdado - ela sim - uma herança maldita. Assim, não há como crescer em ritmo necessário, desejável ou sustentável sem que ocorra um novo ciclo de investimentos e de reformas em segmentos importantes do sistema produtivo no Brasil".
Essa é a avaliação do ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros que, em entrevista ao Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor, lançou como pano de fundo para explicar o porquê da percepção generalizada que existe hoje de que por mais que se faça mais do mesmo, a economia segue e vai continuar emperrada. Para ele existe uma diferença crucial entre os governos dos presidentes Lula e Dilma na gestão da economia.
"Para o Lula estava clara a necessidade de respeitar os princípios de uma economia de mercado, seguindo as leis de oferta e demanda e respeitando os contratos em que o governo é uma das partes. Certamente aprendeu isso no longo período em que chefiou o sindicato dos metalúrgicos no chamado ABC. Já para a presidente Dilma, o crescimento deve ser liderado pelo Estado por meio de medidas pontuais que, muitas vezes, agridem regras de mercado e rompem cláusulas de contratos estabelecidos. E esses critérios soviéticos justificam o recuo dos investimentos privados na primeira metade de seu mandato. A manutenção dessa política não permitirá ao Brasil crescer muito mais de 3% ao ano", afirma Mendonça de Barros.
O ex-ministro explica que a grande maioria das forças positivas que operavam na economia durante o governo Lula perdeu intensidade e o governo Dilma não percebeu esta mudança. Uma dessas forças - e um componente estrutural importante para explicar a atividade acanhada atual - é representada pelos termos de troca do Brasil. Entre 2003 e fins de 2011, os termos de troca da economia saltaram de 95 para 130. Ou seja, para cada US$ 100,00 de exportações o Brasil de Lula comprava no exterior o equivalente a US$ 130,00, contra US$ 95,00 nos anos FHC. Um presente que o país recebeu por conta do crescimento das importações chinesas.
Como resultado, nos primeiros anos do governo Lula o superávit comercial chegou a US$ 45 bilhões anuais, provocando uma valorização fortíssima do real que, de mais de três reais por dólar chegou a R$ 1,60 no início do governo Dilma. Essas mudanças alteraram o padrão das exportações e importações brasileiras, provocando um aumento na oferta de bens necessária para equilibrar o aumento da demanda doméstica provocada pelas políticas sociais de Lula. Com maior capacidade de importar e com a valorização do real, o crescimento da demanda interna na casa dos dois dígitos não provocou o aumento da inflação e manteve em crescimento a massa real de salários.
Os índices de inflação ao consumidor chegaram a ficar no centro da meta do Banco Central, apesar da expansão acelerada da economia. As empresas brasileiras, depois de um primeiro momento de cautela com Lula, passaram a reagir a este período de bonança aumentando de forma importante seus investimentos. O país viveu durante três ou quatro anos o que se chama de ciclo virtuoso do capitalismo, ajudado pela política econômica oficial que seguia no campo macroeconômico o padrão sempre sonhado pelos mercados. Em outras palavras, o ex-presidente Lula manteve a economia funcionando com regras de mercado, corrigindo via políticas sociais o viés de concentração de renda que é o padrão do chamado capitalismo no mundo emergente.
Outra evidência das consequências benéficas da opção de Lula pela gestão econômica a partir de regras de mercado é a arrancada do crédito. "Quando se iniciou esse ciclo virtuoso em 2004, o crédito ao consumo no Brasil era mínimo. Mas ganhou fôlego e dobrou de tamanho em proporção do PIB. Esta foi uma das forças que, junto com a política de aumentos reais do salário mínimo, explicam a incrível expansão das chamadas classes médias no Brasil nos últimos anos. Hoje não se pode esperar a manutenção daquele ritmo de crescimento das carteiras de crédito dos bancos, pois o endividamento das famílias chegou ao limite, com a parcela da renda comprometida com pagamentos de juros e amortizações superando 20% da renda das famílias."
Mas Mendonça de Barros lembra que esse processo de expansão das economias de mercado via estímulo ao consumo tem sempre um horizonte finito de sucesso. Os desequilíbrios, que sempre ocorrem entre investimento e consumo, acabam por gerar forças contrárias que enfraquecem o sucesso inicial. Apenas uma nova agenda que fortaleça o aumento da oferta via investimentos privados pode perenizar os frutos do ciclo de expansão que se encerra. Neste sentido o exemplo brasileiro não fugiu ao padrão encontrado em outros países emergentes. E o fim deste ciclo em que aparentemente tudo dava certo coincidiu com a posse de Dilma no Palácio do Planalto.
Entre os fatores estruturais que dificultam hoje a expansão da economia, Mendonça de Barros aponta a inflação, que ficou "mais complicada". "Hoje, a inflação é de serviços e sustentada pelo nível baixo do desemprego e a preservação da renda. E serviços não dá para importar. Além disso, por pressão da indústria, o governo promoveu no ano passado uma desvalorização cambial de mais de 20% que, por azar, veio junto com o choque de alimentos. Tudo somado, a inflação comeu a renda dos trabalhadores."
O desempenho da indústria merece particular atenção do ex-ministro, que coloca o setor entre os fatores conjunturais que explicam a expansão apática da atividade no país. "Quando se compara o comportamento da produção industrial no Brasil e nos Estados Unidos nos últimos anos, a diferença é flagrante". Em 2008 e 2009, período marcado pela crise financeira global, a produção industrial caiu e muito no mundo todo. Em 2010, Brasil e Estados Unidos optaram por trilhar caminhos diferentes para recuperar o crescimento. Nos Estados Unidos, a expansão começou lentamente e a recuperação só agora se tornou evidente, embora ainda de forma gradual. Não por outra razão o nível de desemprego é ainda muito alto e o Federal Reserve continua com sua política de expansão monetária. Mas a recuperação da economia ganhou tração e deve continuar nos próximos anos.
No Brasil, em 2010, que foi ano de eleição, a recuperação da produção industrial teve forte expansão inicialmente ao responder aos agressivos estímulos criados pelo governo, voltando rapidamente ao patamar pré-crise. "Mas a partir daí, estagnou e não consegue mais crescer", afirma Mendonça de Barros que vê o crescimento do Brasil restrito por limitações de oferta e falta de investimentos.
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