Carlos Drummond de Andrade
Podíamos
namorar dentro do carro até a meia- noite sem perigo de sermos mortos por
bandidos e traficantes. Mas, não podíamos falar mal do presidente.
Podíamos ter
o INPS como único plano de saúde sem morrer a míngua nos corredores dos
hospitais.Mas não podíamos falar mal do presidente.
Podíamos
comprar armas e munições à vontade, pois o governo sabia quem era cidadão de
bem,quem era bandido e quem era terrorista. Mas, não podíamos falar mal do
Presidente.
Podíamos paquerar a funcionária, a menina das contas a pagar ou a recepcionista sem correr o risco de sermos processados por assédio "sexual”. Mas, não podíamos falar mal do Presidente.
Não usávamos eufemismos hipócritas para fazer
referências a raças (ei! negão!), credos (esse crente
aí!) ou preferências sexuais (fala! sua bicha!) e não éramos processados por “discriminação”
por isso. Mas, não podíamos falar mal do presidente.
Podíamos
tomar nossa redentora cerveja no fim do expediente do trabalho para relaxar e
dirigir o carro para casa, sem o risco de sermos jogados à vala da
delinquência, sendo preso por estar “alcoolizado”. Mas, não podíamos falar mal
do Presidente.
Podíamos
cortar a goiabeira do quintal, empesteada de taturanas, sem que isso
constituísse crime ambiental. Mas, não podíamos falar mal do presidente.
Podíamos ir a
qualquer bar ou boate, em qualquer bairro da cidade, de carro, de ônibus, de
bicicleta ou a pé, sem nenhum medo de sermos assaltados, sequestrados ou
assassinados. Mas, não podíamos falar mal do presidente.
Hoje
a única coisa que podemos fazer é falar mal do presidente! Que merda...
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