Fernando Alcoforado*
Não apenas
pensadores como Immanuel Wallerstein, Jacques Attali. Eric Hobsbawn e François Chesnais,
entre outros, prognosticaram ou prognosticam um futuro catastrófico para a
humanidade no século XXI. A eles se juntam mais dois pensadores: John Casti, matemático
e ph.D, especialista em teorias dos sistemas e da complexidade e, Edgar Morin,
antropólogo, sociólogo e filósofo francês, pesquisador emérito do CNRS (Centre National
de la Recherche Scientifique de Paris). Sobre o futuro da humanidade, John Casti
o aborda em seu livro O Colapso de Tudo - Os Eventos Extremos que Podem Destruir
a Civilização a Qualquer Momento (Rio: Editora Intrínseca Ltda., 2012) e Edgar
Morin em seu livro Vers l’abîme ? (Rumo ao abismo ?) (Cahiers
de L’Herne, 2007).
Segundo
John Casti, nossa sociedade está se tornando tão interligada e complexa que o colapso
é quase inevitável. Casti inaugurou no início de 2012 o X-Center, um centro de estudos
sediado em Viena para analisar a possibilidade de desastres e desenvolver modos
de preveni-los. John Casti usa a matemática e modelos de computador para analisar
sistemas complexos, nos quais a ação de diversos indivíduos e organizações se soma
para produzir resultados inesperados. No X-Center, em Viena, John Casti desenvolve
modelos para estudar os possíveis eventos, quais as condições que levam à sua
ocorrência e como impedi-los.
Até agora,
John Casti já realizou uma parceria com o governo da Finlândia, para prever possíveis
cenários catastróficos no país, e começa a estudar a mesma situação na Coreia do
Sul. Segundo seu diagnóstico, Casti afirma que a humanidade vive hoje uma sobrecarga
de complexidade. Todas as infraestruturas necessárias para manter o estilo de
vida atual estão construídas extremamente dependentes umas das outras. Para exemplificar,
Casti afirma que a internet depende da energia elétrica, que por sua vez depende
das usinas de carvão, gás, nucleares ou hidrelétricas, que, por sua vez,
dependem da internet. O problema é que
quando a complexidade se torna grande
demais, o sistema pode entrar em
colapso inesperadamente. Casti chama essa ruptura de um evento X.
Essa
expressão, evento X, é uma abreviação para evento extremo. Além disso, na matemática
o X representa o desconhecido. Todos os eventos X são similares tendo um componente
muito aleatório, que é o gatilho que dá início ao evento, mas é possível prever
o contexto em que ele pode ocorrer. É o que Casti está tentando fazer no
XCenter ao desenvolver alguns modos de antecipar as condições dos eventos X.
Segundo Casti, a humanidade ficou mais vulnerável a um evento extremo. As
infraestruturas mundiais atuais são similares a um castelo de cartas. Por causa
de toda a conectividade entre nossas infraestruturas, não é preciso um choque
muito grande para derrubar todo o sistema. Se alguém pega uma gripe em alguma
parte do planeta, por exemplo, ela pode rapidamente ser transmitida para outra
parte e se tornar uma pandemia global. Estamos mais vulneráveis do que nunca.
Em seu
livro O Colapso de Tudo, Casti apresenta os cenários de uma interrupção generalizada
e duradoura da internet, do esgotamento do sistema global de abastecimento de
alimentos, de um pulso eletromagnético continental que destrói todos os
aparelhos eletrônicos, do colapso da globalização, da destruição da Terra pela
criação de partículas exóticas, da desestabilização do panorama nuclear, do fim
do suprimento global de petróleo, de uma pandemia global, da falta de energia
elétrica e de água potável, de robôs inteligentes que sobrepujam a humanidade e
da deflação global e do colapso dos mercados financeiros mundiais.
Por sua
vez, em seu livro Vers l’abîme? Edgar Morin considera a inevitabilidade
do desastre que ameaça a humanidade em que, segundo ele, o improvável se torna
possível.
O título
do livro sob a forma de interrogação trata da certeza do abismo. “A humanidade evitará
esse desastre ou recomeçará a partir do desastre? A crise mundial que se abre e
se amplifica conduz ao desastre ou à superação?” Edgar Morin prova que a crise mundial
se agravou e o pensamento político dominante é incapaz de formular uma política
de civilização e de humanidade. O mundo está no início do caos, e a única perspectiva
é uma metamorfose, com o surgimento de forças de transformação e regeneração.
Na crise planetária, a única perspectiva de salvação encontra-se no que trará
simultaneamente conservação e transformação, uma verdadeira metamorfose. Segundo
Morin, essa transformação deve ser desenvolvida no interior de cada indivíduo,
na modificação irremediável das mentalidades.
Morin
afirma que a Modernidade criou três mitos: o de controlar o universo, o do progresso
e da conquista da felicidade. O enorme desenvolvimento da ciência, da
tecnologia, da economia, do
capitalismo, tem aumentado de forma inédita a invenção,
mas também a capacidade de destruição.
A razão herdada do Iluminismo impôs a idéia
de um universo totalmente inteligível.
O progresso científico e técnico permitiu como
sempre a emancipação humana, mas a
morte coletiva também se tornou possível como nunca antes. Golden Age (idade de
Ouro) e idade de horror! Ora aqui está um tema muito atual: o que perdemos
quando ganhamos o progresso? Morin defende a tese de que o progresso traz
consigo a certeza da morte. Este século é a maior promessa e também a maior
ameaça! Os progressos tecnológico, científico, médico, social, se manifestam na
forma de destruição da biosfera, destruição cultural, criação de novas desigualdades
e de novas servidões. O desenvolvimento ignora qualquer coisa que não seja
calculável e mensurável, desintegrando as artes da vida e da sabedoria de
culturas antigas. A racionalização baseada no cálculo é reduzida ao econômico
ignorando a vida, os sentimentos das pessoas.
Morin
defende a tese de que a sociedade mundial ainda não é civilizada, ao contrário,
é bárbara. Barbárie, crueldade, sombra da morte, individualismo ocidental precisam
ser superados por uma revolução na interioridade psíquica das pessoas.
Infelizmente, as políticas governamentais ignoram a necessidade de reforma das
mentes e das pessoas.
Ao lado
disto, uma nova classe dominante e exploradora surgiu, pior do que as
anteriores. Este século é o da maior
promessa e também da maior ameaça. Morin
preconiza que a Sociedade Mundial deve
resistir ao mundo do terror. Nós estamos
diante do afundamento do Iluminismo e
de suas promessas. O imprevisto chegou
representando uma constatação perturbadora.
Isto faz com que seja aberta a necessidade de uma verdadeira transformação na
organização social, por uma sociedade de novo tipo, uma sociedade- mundo.
Fica
bastante evidenciada pelas visões de John Casti e Edgar Morin que a humanidade tem
que construir uma nova sociedade, sociedade-mundo como propõe Morin. Esta sociedade-mundo
que incorpore todos os povos do mundo inteiro só será viável se for conduzida
por um governo mundial democrático e que seja capaz de planejar e controlar os
sistemas caóticos que ameaçam a sobrevivência da humanidade e evitar o colapso
de tudo como prevê Casti. Só assim será possível evitar a depressão da economia
mundial, a exaustão dos recursos naturais do planeta especialmente água e
petróleo, o crescimento desordenado das cidades e a mudança climática
catastrófica global, além do descontrole dos sistemas de internet e de energia
e da emergência de pandemias globais.
O grande
obstáculo ao advento de um governo mundial é representado pelos governos nacionais,
sobretudo pelas grandes potências, que não abrem mão de sua soberania. As grandes
potências não aceitam um governo mundial para continuarem sua dominação em
escala mundial e os governos dos demais países se aferram à defesa de suas soberanias
se opondo à existência de um governo mundial porque acham que ele será exercido
pelas grandes potências com o aprofundamento de sua dominação. Os governantes
de todos os países precisam adquirir a consciência de que o caos que caracteriza
a operação dos sistemas mundiais atuais nos planos econômico e ambiental resulta
de sua ingovernabilidade que só será alcançada com a existência de um governo mundial
ou um consórcio de todos os países do mundo imbuídos do propósito de fazer frente
à ameaça que paira contra a sobrevivência da civilização e da própria
humanidade e promover o progresso em benefício de todos os povos do mundo. Só
assim, a humanidade evitará o abismo do colapso total.
* Fernando Alcoforado,
73, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela
Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de
planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e
planejamento de sistemas energéticos, é autor dos
livros Globalização
(Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova
(Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do
desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,
http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e
Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento
do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA,
Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft
& Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária
(P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para
o progresso do Brasil ecombate ao aquecimento global (Viena- Editora e
Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores
Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba,
2012), entre outros.
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