Fernando Alcoforado*
Não há outro caminho para mudar a realidade vivida pelo Brasil nos
campos econômico, político e administrativo a não ser com a realização da
reforma da Constituição para evitar uma ruptura político-institucional no
País e construir uma nova ordem política e administrativa radicalmente
democrática baseada na ética e no desenvolvimento em benefício de toda a população. Não basta a
realização de uma mera reforma política como vem sendo preconizada inclusive
pela presidente Dilma Rousseff. A situação vivida atualmente no Brasil coloca em xeque
não apenas os poderes constituídos, mas também a democracia representativa que
poderão levar à ingovernabilidade das estruturas de poder no Brasil, hoje bastante
desmoralizadas com os sucessivos escândalos de corrupção que estão atingindo
todos os poderes da República.
O Brasil enfrenta um processo de descalabro ético e moral no plano
político institucional nunca visto na história do País. A crescente descrença
da população com relação às instituições políticas é uma grande marca de nosso
tempo porque a grande maioria dos candidatos a cargos eletivos no Brasil não é movida
pelo interesse público, isto é, no sentido de promover mudanças políticas, econômicas e
sociais em benefício da população e do País. A ocupação de cargos eletivos no poder
executivo e no
parlamento passa a se constituir fundamentalmente em um meio para
o eleito prestar serviços aos financiadores de suas campanhas eleitorais, se
enriquecer e auferir as mordomias existentes. São situações inaceitáveis pela maioria da
população brasileira. Inaceitável é também a corrupção no Brasil que é sistêmica
correspondendo ao uso do aparelho do estado por funcionários do governo para fins privados
ilegítimos. As formas de corrupção incluem o suborno ou propina, extorsão, fisiologismo, nepotismo, clientelismo, tráfico de influência, utilização de informação
governamental privilegiada para fins pessoais ou de pessoas amigas ou parentes, compra e
venda de sentenças judiciárias, recebimento de presentes ou de serviços de alto valor
por autoridades e peculato. O estado de corrupção política sistêmica desenfreada é
conhecido como cleptocracia, do que se conclui que o Brasil é governado por
ladrões.
No momento atual, o Brasil não se defronta com um quadro de
ruptura político institucional iminente. Mas, se tudo continuar como está, com
a falência da democracia representativa e a possibilidade de agravamento da
crise econômica no País, o Brasil poderá se defrontar com a possibilidade de
uma ruptura político-institucional com o advento de uma nova ditadura para
colocar “ordem na casa” de consequências imprevisíveis. A crise econômica e a
crise político-institucional, somadas, poderão levar à insatisfação de amplos
setores sociais e criar uma situação Hobbesiana caracterizada pelo caos
econômico e social que só poderia ser solucionada por um governo central forte,
isto é, com a implantação de um sistema ditatorial que precisa ser evitado a
todo custo.
É preciso levar em conta os exemplos da história para prognosticar
eventos políticos futuros. A nova ordem política, econômica e social que passou a
existir no Brasil a partir da Revolução de 1930, que levou ao poder forças políticas
sob a liderança de Getúlio Vargas aconteceu graças à crise econômica mundial de 1929
que afetou profundamente a economia brasileira, bem como à corrupção
desenfreada na República Velha.
O golpe militar de 1964 aconteceu devido, entre outras causas, ao
incremento das tensões sociais ampliadas com a crise econômica vivida pelo
Brasil durante o governo João Goulart. O fim da ditadura militar e a
redemocratização do País resultaram, entre outros fatores, da profunda crise econômica vivida
pelo Brasil na década de 1980. Esses exemplos demonstram que as rupturas
politico-institucionais resultam sempre de crises econômicas as quais são potencializadas
com a existência de crises politico-institucionais.
No momento atual, é um imperativo realizar a reforma da
Constituição que teria o papel de, preventivamente, evitar uma ruptura
político-institucional no País e construir uma nova ordem política e
administrativa no Brasil. A nova Constituição do Brasil deve ser elaborada
através de uma Assembleia Constituinte que não seria integrada pelos atuais membros
do Congresso Nacional porque os mesmos seriam incapazes de fazer uma Constituição
que atenda os interesses da grande maioria da nação. Seus membros seriam eleitos
pela população com a missão exclusiva de aprovar a reforma na Constituição. A realização
de uma nova Assembleia Constituinte no Brasil permitiria corrigir as distorções
da Constituição de 1988 e possibilitar estabelecer novos rumos para o Brasil, não
apenas nos planos econômico, político e social, mas também nos planos ético e moral.
Um dos objetivos dos futuros constituintes seria o de propor uma
nova estrutura de governo com base no sistema parlamentarista para assegurar a
governabilidade e a estabilidade das instituições políticas no Brasil com um renovado
Supremo Tribunal Federal atuando como poder moderador. É evidente que, se existisse
o parlamentarismo no Brasil, seria mais fácil sair do impasse político atual
com a substituição de um Congresso Nacional e um governo incompetente como o de
Dilma Rousseff com a convocação de novas eleições parlamentares. Enquanto o
sistema político brasileiro está engessado com um presidencialismo ineficaz
como o atual, incapaz de ordenar a vida da nação brasileira em novas bases, a
crise econômica se agrava a cada dia que se passa cujos resultados estão aí:
crescimento econômico pífio, inflação acima da meta, desequilíbrios externos,
estagnação da produtividade e, agora também retrocesso no campo das conquistas
sociais.
Outro grande objetivo dos futuros constituintes seria o de
reestruturar a democracia representativa no Brasil que manifesta sinais claros de
esgotamento não apenas pelos escândalos de corrupção nos poderes da República mas, sobretudo,
ao desestimular a participação popular, reduzindo a atividade política a processos
eleitorais que se repetem periodicamente em que o povo elege seus ditos
representantes os quais, com poucas exceções, após as eleições passam a defender interesses de
grupos econômicos em contraposição aos interesses daqueles que os elegeram. Os
fatos da realidade demonstram que a democracia representativa no Brasil e no
mundo, no formato atual, se constitui em obstáculo às mudanças econômicas e
sociais.
A crescente despolitização e descrença da população com relação às
instituições políticas é uma grande marca de nosso tempo. As eleições diretas
no Brasil, antes vistas como um caminho em direção à democracia, passam a ser
reduzidas ao estágio máximo de participação política permitida no Brasil com o
propósito de legitimar os eleitos. A maioria dos candidatos a cargos eletivos
no Brasil não é movida pelo interesse público, isto é, de promover mudanças
políticas, econômicas e sociais em benefício da população. A ocupação de cargos
eletivos no poder executivo e no parlamento passa a se constituir em um meio
para o eleito prestar serviços aos financiadores de suas campanhas eleitorais,
se enriquecer e auferir as mordomias existentes.
Para construir uma nova ordem política e administrativa
radicalmente democrática baseada na ética e no desenvolvimento em benefício de toda a
população, a reforma da Constituição deveria considerar, entre outras medidas,
o seguinte: 1) a substituição do regime presidencialista pelo parlamentarista
com um renovado Supremo Tribunal Federal atuando como poder moderador; 2) a escolha dos membros do
poder judiciário deveria ficar a cargo de uma comissão de alto nível eleita
pela população para este fim e não ficar sob a exclusiva vontade do presidente
da República como ocorre na atualidade; 3) o fim do Senado da República com a
implantação do sistema unicameral; 4) os candidatos a cargos eletivos deveriam
possuir “ficha limpa“; 5) os candidatos eleitos deveriam prestar contas
sistematicamente do seu mandato a seus partidos e ao eleitorado; 6) os partidos
políticos, que hoje funcionam como meros cartórios eleitorais, deveriam operar
com claro posicionamento político-ideológico; 7) os eleitores deveriam exercer
tanto quanto os partidos políticos o controle social dos eleitos, acionando os mecanismos
institucionais necessários à punição daqueles que eventualmente tenham traído o
programa partidário e os interesses do eleitorado se pronunciando sobre sua cassação
ou não através de plebiscito; e, 8) as decisões sobre questões de interesse fundamental
para a população deveriam ser objeto de plebiscito ou referendo.
*Fernando Alcoforado, 74, membro da
Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em planejamento Territorial e
Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário
e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial,
planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos
livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil
e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o
Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento
do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944,
2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006),
Bahia-Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na
Era
Contemporânea (EGBA, Salvador,
2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The
Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co.
KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária
(P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o
progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica,
Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do
Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba,
2012), entre outros.

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