Política
Josias de Souza é um jornalista brasileiro. Exerce o
jornalismo desde 1984. Trabalha na Folha de São Paulo desde 1985. Nesse
período, ocupou diferentes funções - de repórter a secretário de redação do
jornal. Em 2005, era colunista da Folha.
BLOG DE JOSIAS DE SOUZA
UOL
Primeiro, a boa notícia: às vésperas
do encerramento do ano, o ministro Guido Mantega veio à boca do palco para
informar que a economia do Brasil nunca esteve tão sólida. Agora, a melhor
notícia: dentro de 24 horas, não haverá mais Guido Mantega no Ministério da
Fazenda. Mas, atenção, essas são as únicas novidades alvissareiras deste ocaso
de 2014.
Se alguém lhe desejar um ‘próspero
Ano-Novo’ à zero hora desta quinta-feira, 1º de janeiro de 2015, desconfie —é
cinismo, ingenuidade ou desinformação. Hoje, prosperidade é outro nome para
ilusão. Chama-se Joaquim ‘Mãos de Tesoura’ Levy o substituto de Mantega. Ele
chega para desfazer os truques. Depois da tempestade provocada pela contabilidade
criativa, virá a cobrança.
O otimismo é uma obsessão das
passagens de ano. Se, ao mastigar a lentilha, você ficar tentado a entrar na
onda, experimente fazer um exercício mental. Imagine que o Brasil pode
melhorar, deve melhorar, tem que melhorar. Finja que o momento é agora. Simule
otimismo. Faça cara de quem acredita que tudo dará certo em 2015. Muito bem.
Agora, pense no novo ministério da Dilma.
O Kassab nas Cidades, El Cid na
Educação, o filho do Jader na Pesca, o afilhado do Renan no Turismo, o pastor
da Universal no Esporte, o amigo do Valdemar Costa Neto nos Transportes e um
estonteante etcétera… Desanimou, certo? Natural. É impossível pensar no novo
ministério da Dilma e continuar otimista. Não há o menor risco funcionar.
Antes mesmo do Ano-Novo, Dilma decidiu
que, no segundo mandato, será outra mulher. Ela se apalpou e detectou
insuspeitados focos de prosperidade na cintura. Numa noite úmida do verão
brasiliense, acordou sobressaltada no Alvorada. Sonhara que era o Delfim Netto.
Teve de certificar-se de que a escolha de Levy não fizera dela uma neoliberal,
embora precisasse de uma dieta. Se tudo der certo, chega à hora da posse 13
quilos mais magra. No momento, pesa-lhe apenas a consciência.
Alguém que ainda consegue discursar em
defesa da moralidade depois de ter comandado o Conselho de Administração da
Petrobras e de não ter notado que o patrimônio nacional era saqueado pelos
esquemas que acompanham o petismo no poder…, uma pessoa assim tão, digamos,
distraída, é um desafio à oftalmologia, não a presidente reeleita que 2015
mereceria para ser feliz.
Dentro de poucas horas, na cerimônia
de posse, Dilma lerá mais um pronunciamento com as digitais de João Santana.
Apelará para a fantasia que substitui e redime a realidade. Melhor que seja
assim, porque a fantasia é sempre uma opção preferível ao caos. De resto, o
convívio com empulhações é uma velha característica da vida nacional. Por que
discriminar 2015? Não seria justo.
O país vive uma fase de especial vigor
dessa sua peculiaridade. A inflação, os juros e a dívida pública estão nas
alturas. O bom senso e o PIB rastejam próximos de zero. Mas o governo celebra o
pleno emprego. Depois de uma eleição em que brincou de esconde-esconde, a
presidente mostra a faca. Mas não corta direitos dos trabalhadores. Apenas
corrige “distorções”.
Dilma leva ao pé da letra o lema de
sua campanha: governo novo, ideias novas. Em alguns setores, tem-se a impressão
de que, de fato, nada será como antes. Do ponto de vista econômico, Dilma
aderiu a Aécio Neves. Se tudo correr como foi planejado por Lula, a presidente
fará com Levy aquilo que a lógica e o mercado financeiro esperam dela. Na
hipótese de dar certo, a situação vai piorar bastante antes de melhorar.
Pode haver algum desemprego. Mas
ninguém deve se preocupar. O sucesso da dieta afastou o risco de a Dilma ser um
Delfim Netto disfarçado. Ela continua sendo uma governante de esquerda. Mantém
o ideal socialista amparada por uma estrutura parlamentar dominada pelo
reacionarismo. Mas não vai barganhar a alma —mesmo porque ela continua
prometida ao Lula.
Se você quiser, a despeito de tudo,
continuar a crer num “próspero 2015” sem correr riscos, convém simplificar sua
ilusão e adotar certas precauções. Sempre que der de cara com o Paulo Maluf
defendendo o governo, não desanime. A Justiça Eleitoral considerou-o um
ficha-limpa. Ele estará na Câmara em 2015. A reincidência do Maluf é parte da
prosperidade de faz-de-conta.
Leve no bolso do colete uma dose de
ceticismo. Não traz felicidade, mas funciona como uma espécie de Isordil
metafórico. Evita, por exemplo, o infarto dos eleitores de Dilma na hora
que se derem conta de que votaram no aumento do superávit primário. Paciência.
Embora o João Santana não tenha avisado, é assim mesmo. Depois da tempestade,
sempre vem a cobrança.
Para que o ruim não fique ainda pior,
abra bem os olhos na hora da virada. Do contrário, o último a sair de 2014
rouba a luz.
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