(Lou Andreas Salomé)
Por
Consuelo Pondé de
Sena
Há mulheres que marcam sua época, de tal maneira que se tornam exemplos
de conduta desviante e transgressão. É o que me ocorre quando recordo à russa
Lou Andreas Salomé, que se antecipou ao seu tempo e tornou-se símbolo da
rebeldia feminina.
Caçula e filha única de uma família, a vida de Lou Andreas Salomé sempre
gravitou em torno de fortes laços fraternais, pois os cinco irmãos, sendo que
três deles conviveu mais intimamente, vez que o primeiro e o quarto não
alcançaram a velhice. Essa familiaridade, aliada à admiração que por eles
sentia, fizeram Lou Andreas Salomé estar sempre a eles vinculada, num
relacionamento imutável. A escritora e psicanalista russa foi, talvez, a única
grande paixão da vida de Nietsche.
Lou nasceu em S. Peterburg em 12 de fevereiro de 1861. Criada num
ambiente sadio, “revolucionou” os padrões de conduta da época. Não sei se ela
chegou a amar alguém com a mesma intensidade com que foi amada por uns e por
outros.
Era filha de um general, Gustavo Salomé, homem muito afetuoso. Lou tinha
verdadeira fascinação pelo pai, a quem considerava: “o primeiro modelo de
Deus”. Seus pais constituíam um casal muito unido e harmonioso, mas Lou a
considerava uma concorrente no afeto do pai. Por esse motivo as relações entre
mãe e filha nem sempre eram amistosas. Embora desaprovasse a conduta libertária
da filha, nunca lhe negou apoio. É que a conduta da jovem destoava dos costumes
sociais de então. Tão solidária foi com Lou, sua mãe, a quem chamava Muschka,
mesmo com desgosto, sempre a apoiou frente ao mundo. Sonhava com seu casamento
tradicional, protegida “debaixo de véu e grinalda”.
Aos 19 anos a futura escritora e jornalista mudou-se para Roma. Na
Cidade Eterna procurou hospedar-se em casa de Malvida von Meysenbug, onde
conheceu Paulo Ré, que a impressionou fortemente pela aguda inteligência que
exalava. Os passeios pelas ruas de Roma, debaixo do clarão da lua e o faiscar
das estrelas, alimentaram aquela paixão perturbadora. Apaixonaram-se e, durante
cinco anos, viveram um lindo caso de amor. Contudo, Lou não queria ter uma
relação estável, o que contrariava os planos de Paulo Ré. Desejava viver a vida
segundo aquilo que era, aconteça o que acontecer.
Foi em Roma que Lou conheceu Friedrich, sendo curioso que Nietzsche, tão
logo tomou conhecimento de Paulo Ré para ser o terceiro na aliança, “até mesmo
o local da nossa futura trindade foi determinado. Mas Lou não se fixava em
pessoa alguma e, em Paris, na colônia russa, tornou-se amiga de um jovem
imigrante, suspeito do assassinato de Alexandre II, fora deportado para
Sibéria, onde trabalhou quatro anos em serviços forçados e finalmente chegara a
Paris. Sawelli firmou amizade e fez Lou relacionar-se com o círculo russo.
Quando chegou o verão, com seu calor escaldante, o casal escapou para a Suíça,
num trem pequeno e barato de férias. Por trás de Zurique subiram as montanhas e
se instalaram numa cabana alpina, onde se alimentavam de pão, queijo, leite e
frutas. A inquietação da jovem, seu espírito livre, não a permitiram fixar-se
muito tempo naquele local. Voltou à Alemanha, sem dizer adeus ao parceiro.
Não disponho de espaço para narrar a vida daquela mulher, muito menos
sintetizar seu texto biográfico “Minha Vida”. São esboços de algumas
lembranças, publicado em Zurique, em 1951.
Mulher de espírito rebelde e ideias independentes, foi a figura feminina
mais inteligente e divertida que Nietzsche conheceu. Consta que chegou a
pedi-la em casamento, que ela recusou, chegando-se a divulgar que esse teria
sido o motivo do agravamento da doença de Nietzsche. Lou foi amiga e
colaboradora de Freud, Nietzsche e Rainer Maria Rilke. Frequentou os círculos
da intelectualidade da época, tendo sido autora de vários livros, que a imortalizaram.
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