Por
Vitor
Hugo Soares.
É
renomado jornalista baiano
(@bahiaempauta)
Não
poderiam ser mais simbólicos, na acidentada topografia de Salvador, os locais
onde bravos homens do Corpo de Bombeiros e voluntários da Defesa Civil – ao
lado de parentes em desespero – retiraram os corpos da vigésima e da
vigésima primeira vítima dos deslizamentos de encostas e desabamentos de
casarões e prédios na terceira maior cidade do País. São três semanas de temporais,
quase sem parar, neste mês de maio de trapaças e enganos em Brasília. Outono da
desesperança na Cidade da Bahia.
Terça-feira,
na Ladeira da Preguiça (da canção de Gilberto Gil, que Elis Regina consagrou),
via de ligação histórica com a basílica da Conceição da Praia, um muro desabou
do alto da encosta da Ladeira da Montanha (suntuoso observatório da Bahia de
Todos os Santos em dias de sol), e caiu em cima de três casarões na Cidade
Baixa. Um jovem marinheiro de 31 anos, Oberdan dos Santos Barbosa, que morava
no lugar, ficou sob os escombros. O irmão, que escapou, em lágrimas, na TV,
fala dos gritos e apelos de socorro do marinheiro e ele impotente para
salvá-lo. De cortar coração.
No dia
seguinte, o drama se desdobra. No entorno da Praça Cayru, ao lado do Elevador
Lacerda – marca maior entre as atrações da cidade – outros seis casarões vêm
abaixo, na área do Centro Histórico, tombada pelo Instituto do Patrimônio
Histórico Nacional (IPHAN). Sob a montanha de destroços, bombeiros retiram o
corpo de Claudenice Gonçalves, de 51 anos. As imagens dilacerantes dos
bombeiros e voluntários reunidos em um círculo de oração, enquanto as vizinhas
da morta, parentes e moradores choram e gritam indignados seus protestos
pedidos de socorro e "providências das autoridades competentes", são
emblemáticas na representação da dor, abandono e impotência da gente mais pobre
e humilde da chamada "cidadela da resistência da Bahia".
Poucos
metros acima, na Praça Tomé de Souza, fica o prédio da Prefeitura, sob comando
de ACM Neto (DEM), até o verão passado um dos administradores públicos mais bem
avaliados do País. Bem ao lado está a Câmara de Vereadores, a mais antiga do
Brasil - uma miscelânea de partidos e de interesses em choques, a exemplo das
demais casas parlamentares do País, em geral. Quando não tremendos focos de
corrupção e maracutaias expostas nos escândalos federais, municipais e
estaduais de cada dia. Alguns quilômetros adiante, no Centro Administrativo,
fica a Governadoria do Estado, ocupada pelo petista Rui Costa, em área mais
segura aos impactos das chuvas (mas não aos desgastes políticos da inação ou do
jogo de cena).
Até a hora
que escrevo este artigo, na sexta-feira, Claudenice foi a 21ª pessoa retirada
sem vida de escombros na atual temporada de chuvas em Salvador. Nas imagens das
tragédias na Ladeira da Preguiça e no Taboão não aparecem políticos. Nem o
prefeito, nem o governador, nem os vereadores.
A presidente Dilma Rousseff, no entanto, é uma das
ausências mais notadas nestes dias de dor e desamparo dos soteropolitanos. Afinal,
Salvador, que vai sediar no mês que vem o Congresso Nacional do PT, é citada em
prosa e verso, pelos petistas, como "a cidade mais dilmista do Brasil”,
cachoeira de votos para a atual ocupante do Palácio do Planalto, nas duas últimas
eleições presidenciais. Além disso, Dilma é uma habitual frequentadora, com a
família, da deslumbrante e privativa praia de Inema, na Base Naval de Aratu.
Presença nas férias, feriados e feriadões, sempre nos períodos mais ensolarados
e festivos das temporadas de verão em Salvador.
Nos últimos
quase 30 dias de chuvas, ela já sobrevoou o espaço aéreo baiano mais de uma
vez, para participar de inaugurações e convescotes políticos em outros estados
do Nordeste. Mas não desceu na Bahia. Para liderar providências ou mesmo para
um gesto ou palavras quaisquer de solidariedade na hora de grande dor (e mágoa)
da gente da Cidade da Bahia. O
ex-presidente Lula, que costuma afirmar no palanque ter nascido na Bahia, em
outra encarnação, estava com visita marcada para estes dias em Salvador. Mandou
seus assessores cancelarem, sem mais explicações.
Quem desceu
em Salvador, na quinta-feira, 21, foi o senador mineiro Aécio Neves. O
candidato tucano derrotado por Dilma na disputa pela presidência da República,
principal líder oposicionista com mandato no País. Entrevistado na Rádio
Metrópole, no programa de Mario Kertész (radialista e ex-prefeito da capital
baiana), de enorme audiência em todas as camadas da população, na capital e no
interior. "Queria prestar minha solidariedade pessoal para as famílias
atingidas em Salvador. Torço aqui para que as chuvas deixem vocês em paz”,
começou Aécio.
Em seguida,
o senador tucano desceu o malho no governo petista. Revelou que o governo Dilma
só gastou 4% dos recursos destinados ao Plano Nacional de Gestão de Riscos e
Respostas a Desastre Naturais. "O governo federal não gastou nada
com o programa. Congelou. Já com propaganda foram gastos R$ 2,3 bilhões",
condenou o líder oposicionista. Na candente conversa com Kertész, o senador tucano
atirou muito mais no governo. Mas fico por aqui, com um aviso e um alerta: a
Meteorologia prevê mais chuvas e ventos fortes para a Cidade da Bahia. Pelo
menos até domingo (24).
Mãe Senhora
do Perpétuo, socorrei!
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