quinta-feira, 25 de junho de 2015

AONDE LULA QUER CHEGAR?

Política


Por Paulo Roberto Sampaio
Jornal – Tribuna da Bahia

 Sem participação direta no governo Dilma, embora seja seu criador, o ex-presidente Lula parece ter descoberto uma forma de se valer do delicado momento do governo da presidente para ir descolando sua imagem da dela, a ponto de se tornar um crítico tão ácido quanto os oposicionistas. E o que Lula pretende com isso?
Habilidoso e mestre na arte de fazer política, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva escolheu um ambiente neutro e uma plateia avessa a escândalos e apupos para sua primeira saraivada de críticas duras ao governo Dilma, definido, por ele, como bastante negativo: um encontro com líderes religiosos, realizado no auditório do seu Instituto Lula.
Depois de alguns rodeios para não parecer missa encomendada, até porque na plateia existiam outros mais qualificados para a celebração do ato ecumênico, Lula começou expondo as contradições que a presidente Dilma acabou produzindo em relação às afirmativas que fez durante a campanha eleitoral. "Tem uma frase da companheira Dilma que é sagrada: ‘Eu não mexo no direito dos trabalhadores nem que a vaca tussa’. E mexeu".
A plateia que podia esperar até uma espécie de defesa do ex para a atitude da criatura, por conta do delicado momento vivido pela economia nacional, foi surpreendida com outra frase, que revela contradições no que Dilma diz e no que Dilma faz.

"Tem outra frase de Dilma que é marcante, que diz o seguinte: ‘Eu não vou fazer ajuste, ajuste é coisa de tucano’. E fez. E os tucanos sabiamente colocaram Dilma falando isso (no spot de TV) e dizendo que ela mente. Era uma coisa muito forte. E fiquei muito preocupado", afirmou Lula,  tentando ser piedoso, já que a plateia abrigava muitos piedosos.
Na verdade, o ex tratou de tirar da oposição a primazia da crítica, até porque ela é universal no país, como o próprio Lula fez questão de anotar:  "Acabamos de fazer uma pesquisa em Santo André e São Bernardo, e a nossa rejeição chega a 75%. Entreguei a pesquisa para Dilma, em que nós só temos 7% de bom e ótimo", disse Lula, revelando uma aparente preocupação, seguida de um gesto de conforto ao revelar que disse a Dilma que a pesquisa não deveria desanimá-la.
"Isso é para você saber que a gente tem de mudar, que a gente pode se recuperar", disse um Lula que quando usa a primeira pessoa do plural parece atenuar a crítica, mas na verdade o faz para não parecer contraditório, já que sua imagem de criador ainda está muito ligada à da criatura, ainda que estejam se afastando a cada dia.
Dilma fez questão de fazer à sua semelhança seu segundo mandato, afastou lulistas de carteirinha da sua volta e o maior exemplo foi o ministro Gilberto Carvalho, uma encarnação de Lula no Planalto. Sendo ouvido cada vez menos, Lula parece ter concluído de que há espaço dentro do PT, e da própria sociedade, para resgatar seu patrimônio eleitoral, antes que a presidente o destrua totalmente. E é o que faz.
Que o diga mais uma frase lapidar do ex, mestre nessa arte: "Dilma está no volume morto, o PT está abaixo do volume morto, e eu estou no volume morto. Todos estão numa situação muito ruim. E olha que o PT ainda é o melhor partido. Estamos perdendo para nós mesmos", criticou o ex-presidente, minimizando a força da oposição, principalmente a tucana.
Numa só estocada, Lula atingiu  Dilma, o partido e os adversários tucanos. E, estrategicamente, também se imolou. Mas a expressão "volume morto" tinha um objetivo forte: uma dura referência à crise de abastecimento de água em São Paulo, o mais rico estado do país e governado pelos tucanos, mas que, apesar disso, vive uma seca que faz lembrar a do sertão que Lula tão bem conhece.
Quem, nadando em dinheiro, como Alkimin e a tucanada que o cerca, morre na seca sem saber enfrentar o problema, imagine governando um país com tantos bolsões de miséria e com uma seca tão cruel a castigar impiedosamente o semiárido e o sertão nordestino? Lula deixou implicitamente a estocada no ar.
De quebra, aproveitou a semana para antecipar, como uma tentativa de criar uma preventiva blindagem, que a investigação da Lava-Jato não tarda a chegar a ele. Posou, antecipadamente, de vítima no caso e de crítico independente do governo.
Se chegou a admitir estar no volume morto, quem sabe não caminha para a ressuscitação? Ao menos na plateia, formada por tantos líderes religiosos, todos conhecem a história de outro filho de Deus que fez o mesmo há dois mil e poucos anos. Por que não crer num novo milagre agora?

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