Arquitetura
O Centro Histórico de Goiás abrange
a área histórica do município brasileiro de Goiás, antiga
capital do estado de Goiás. A cidade floresceu durante o ciclo do ouro no
século XVIII, mas com o esgotamento das minas entrou em um longo período de
estagnação, acentuado quando perdeu o estatuto de capital em 1937. A
preservação começou na década de 1950, quando alguns monumentos foram tombados
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN),
e em 1978 todo o Centro Histórico foi protegido. Em 2001 sua importância
histórica, arquitetônica e urbanística foi reconhecida pela UNESCO, que
lhe concedeu o título de Patrimônio da Humanidade.
Goiás foi fundada no ciclo das bandeiras,
expedições formadas por paulistas para explorar os sertões do Brasil em busca
de ouro, pedras preciosas e escravos índios. A região foi percorrida por Dias
Pais entre 1673 e 1681 e por Bartolomeu Bueno da Silva em 1683,
encontrando ouro. Contudo, o achado de jazidas muito mais ricas na região de
Minas Gerais chamou mais atenção geral. Somente em 1718, quando foi achado ouro
em Cuiabá, e em 1721 no rio Vermelho, o filho de Bartolomeu
Bueno foi nomeado superintendente das minas da região, iniciando sua
colonização efetiva. Em 1727 foi fundado no local da presente Goiás um povoado,
em 1729 foi erguida uma capela e tornou-se distrito e freguesia, batizada como
Santana de Goiás.
Em 11 de fevereiro de 1736, através de Carta Régia,
a freguesia foi elevada á condição de vila, que recebeu o nome de Vila Boa
de Goiás, mas a instalação só ocorreu em 25 de julho de 1739.2 Em
8 de novembro de 1744 tornou-se a sede da Capitania de Goiás, sendo
governada por dom Marcos de Noronha, conde dos Arcos. Ele e seus
sucessores fizeram várias melhorias na vila, e construíram importantes
edifícios: a Casa de Fundição (1750), o Palácio do Governador (1751), um
quartel militar (o Quartel do Vinte, 1751), a Casa da Câmara e Cadeia (1761) e
o Teatro de São Joaquim (1772-77), além de fontes e outras benfeitorias. Entre
1778 e 1783 foi definido uma nova planta urbana pelo governador Luís da Cunha
Meneses, delineando o modelo da urbanização que perdura até hoje.
Na década de 1770 o ouro das minas começou a se
exaurir, e embora continuasse sendo a capital, a vila entrou em um longo
período de estagnação. A população se ruralizou e no fim do século XIX chegou a
decrescer. Em 1937 deixou de ser capital, função assumida por Goiânia,
fazendo com que muitos habitantes se mudassem para lá e seu desenvolvimento
incipiente entrasse novamente em recesso, o que possibilitou que preservasse
muito de sua configuração colonial.
Nos anos 1950 o IPHAN tombou alguns de seus
principais monumentos e algumas seções do Centro Histórico.1 O
processo enfrentou dificuldades. Segundo Andréa Delgado, ainda traumatizados
com a perda da condição de capital, os habitantes de Goiás de início entenderam
os tombamentos como mais um impedimento para que a cidade se desenvolvesse,
entrasse no ritmo do progresso e adquirisse as características modernas por
cuja ausência ela perdera seu antigo estatuto administrativo para Goiânia,
construída com o fim expresso de ser a nova capital. No entanto, a poetisa
local Cora Coralina nesta mesma época iniciava uma obra que a
tornaria reconhecida em todo o Brasil, onde colocava a cidade, suas memórias,
tradições e seu patrimônio em posição exaltada, como disse em seu Cântico
da Volta sobre a "gente da velha ala" que havia permanecido
ali como "velhas sentinelas que morrem no posto de honra; defensores
tenazes e valentes do que aqui resta, qual seja, o valioso patrimônio histórico
e cultural e as nobres tradições de Goiás". Ela desempenharia um
papel determinante no reconhecimento da cidade como um patrimônio digno de ser
conservado e prestigiado.
Em 1965 foi fundada a Organização Vilaboense de
Artes e Tradições (OVAT), entendendo que a cidade poderia florescer de novo
exatamente através do fomento de seu legado histórico. Elder Camargo de Passos,
fundador e presidente da OVAT, assim disse:
O Museu das
Bandeiras, instalado na antiga Casa da Câmara e Cadeia.
A Procissão do Fogaréu.
O Chafariz de Cauda.
A Procissão do Fogaréu.
O Chafariz de Cauda.
"Aí na
década de sessenta nós criamos a OVAT, Organização Vilaboense de Artes e
Tradições, que era um grupo de pessoas ligadas à cultura e à arte e começamos a
planejar o que seria Goiás para o futuro. De que ela poderia viver, de quê? Nós
partimos a pesquisar e ver que o passado de Goiás era um passado muito rico em
tradições, em arte, em cultura, em história. Desde a fundação até 1937, a vida
do Estado rolou aqui dentro. Então, quer queira, quer não queira, isso já é um
ponto fantástico. E nós tínhamos vários prédios que estavam aí abandonados, que
estavam deixados, emprestados a órgãos públicos, a escolas, a 'n' coisas. Aí
nós começamos a fazer um levantamento histórico.[...] Nós vimos que o futuro de
Goiás era o passado".
Desde então foram empreendidas várias ações de
resgate da memória local. Foi reaberto o Gabinete Literário fundado em 1864, a
prática dos saraus foi retomada, foram feitas pesquisas para a identificação de
manifestações folclóricas tradicionais, várias edificações foram restauradas,
foi criado o Museu de Arte Sacra, instalado na Igreja de Nossa Senhora da
Boa Morte, que se tornou o principal ícone da cidade, a Semana Santa reincorporou
a tradicional Procissão do Fogaréu, e a OVAT passou a ministrar palestras
públicas sobre o patrimônio e a história locais. A cidade passou a ganhar
visibilidade e então os turistas começaram a chegar.
Com a fundação de Brasília na mesma
época, que fica na região, Goiás iniciou uma fase ascendente e houve um pequeno
surto de novas construções, mas em 1978 todo o Centro Histórico foi tombado
pelo IPHAN, o que o salvou da desfiguração que afetou muitas outras cidades
brasileiras de herança colonial. Em 1983 o IPHAN instalou o escritório da
Diretoria Regional, fortalecendo sua atuação no local. Em 1997 pela primeira
vez o cargo de diretor foi assumido por um nativo de Goiás, Salma de Paiva, e a
partir de então foi organizado um movimento para reconhecer a cidade como
Patrimônio da Humanidade, que incluiu a elaboração de um substancioso dossiê
com um levantamento extensivo do patrimônio material e imaterial, onde se fez
referência também às relações da cidade com o meio ambiente, enfatizando
sua harmoniosa integração. Também foram realizadas várias melhorias nas
condições de conservação de ruas e habitações, a fiação elétrica aérea foi
substituída por uma subterrânea e o rio Vermelho recebeu obras para
despoluição.
O movimento atingiu seus objetivos com a
oficialização do título pela UNESCO em 2001. A UNESCO ampliou o escopo do tombamento do IPHAN incluindo uma zona no
entorno do centro mais antigo, composta de edificações em sua maioria do século
XIX em estilo eclético e art nouveau. Na descrição
da UNESCO.
"A cidade
é caracterizada pela harmonia de sua arquitetura, devido às proporções e tipos
dos edifícios. Ao mesmo tempo, a história da sua construção pode ser lida na
variação dos estilos, passando da tipologia típica do século XVIII até a
arquitetura eclética do século XIX. Em seu perfil e arquitetura a cidade
histórica de Goiás é um exemplo superlativo de um modelo de cidade europeia
admiravelmente adaptada às características climáticas, geográficas e culturais
da América do Sul. Ela representa a evolução de uma forma de estrutura e
arquitetura urbana típica das fundações coloniais na América do Sul, fazendo
pleno uso de materiais e técnicas locais e conservando seu cenário excepcional.
O perfil urbano é um exemplo de desenvolvimento orgânico de uma cidade de mineração,
adaptada às condições locais. Embora modesta, tanto a arquitetura pública como
a privada formam um todo harmônico, graças ao uso coerente de materiais e
técnicas vernaculares".
Na apreciação de Wilson Paulus,
"A
cidade de Goiás ocupa um importante espaço no rol da cultura goiana, ao sediar
eventos, como o Festival Internacional de Cinema Ambiental (FICA), a
Procissão do Fogaréu, Festival Gastronômico, dentre outros, atraiu e ainda
atrai um público diferenciado e preocupado com questões culturais e naturais.
Com o processo de consolidação de berço da cultura goiana, a cidade de Goiás
foi privilegiada com muitas iniciativas que contemplassem seu status,
tudo isso foi de extrema importância para sua legitimação enquanto Patrimônio
da Humanidade"
Hoje Goiás tem no turismo uma de suas maiores
fontes de renda, mas seu grande potencial ainda está por ser mais bem
explorado, havendo deficiências estruturais, econômicas e administrativas que
impedem um maior crescimento do setor.
Goiás foi erguida sobre as colinas que flanqueiam o
rio Vermelho. A margem direita formou-se como uma área popular, onde se destaca
a Igreja do Rosário, dedicada aos escravos. Na margem esquerda foi fundado o
centro administrativo do povoado, onde se localizam seus edifícios mais
importantes, incluindo a Catedral de Santana, a Câmara, o Palácio do
Governador, mais conhecido como Palácio do Conde dos Arcos, o quartel, a
Casa de Fundição e a Praça do Chafariz. Devido ao seu crescimento limitado ao
longo de dois séculos, a arquitetura colonial do Centro Histórico sofreu poucas
modificações, o que possibilitou sua caracterização como Patrimônio da
Humanidade.
Detalhe de um São Miguel de Veiga Valle no Museu de
Arte Sacra da Boa Morte.
Palácio do Conde dos Arcos
Palácio do Conde dos Arcos
Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte. O
principal cartão-de-visitas da cidade, a igreja tem pequenas dimensões e
feições graciosas. Construída em 1779 com várias técnicas (tijolo, adobe,
pau-a-pique e pedra), traz um estilo Barroco típico, com uma porta
única e três janelões no nível superior com verga em arco
abatido, bloco coroado por um frontão ornamental de volutas. Sua nave
tem forma de octógono irregular. Hoje ali funciona o Museu de Arte Sacra da Boa
Morte, com importante coleção de peças coloniais, incluindo a maior reunião de
esculturas de José Joaquim da Veiga Valle, importante santeiro.
Antiga Casa da Câmara e Cadeia. Trata-se
de edifício de dois pavimentos, com traços austeros, sem ornamentos, construído
em taipa de pilão. Erguido em 1761 no topo de uma colina, tem ambientação que
favorece uma impressão de monumentalidade. Hoje abriga o Museu das Bandeiras.
Igreja de Nossa Senhora do Carmo.
Construção de 1786 de grande simplicidade, com uma porta, duas janelas e
frontão triangular, contrastando com seu interior bem decorado.
Igreja de Nossa Senhora d'Abadia. Data de
1790, composta de nave, sacristia, coro e consistório, tem também fachada
singela e frontão discreto, mas possui o interior mais rico dentre as igrejas
locais, incluindo um altar em talha dourada e um teto pintado.
Palácio do Conde dos Arcos. Antiga
sede do governo, data de 1751 mas sua fachada revela inspiração neoclássica,
resultado de reformas no século XIX, com um pórtico com o tradicional frontão
triangular e uma platibanda substituindo o primitivo beiral.
Catedral de Santana. Edificada
a partir 1929 sobre as ruínas da antiga Matriz, tem uma fachada neoclássica simplificada,
elaborada em parceria com o IPHAN, concluída em 1998.
Quartel do XX. Grande quartel
militar edificado em torno de um pátio aberto. Sua construção data de 1747,
sendo a fusão de uma série de habitações privadas. É o mais antiga edificação
oficial do estado, mas passou por várias modificações para atingir sua
configuração atual, que no entanto ainda preserva muitos traços do século
XVIII.
Sobrado da Real Fazenda. Grande
casarão de características coloniais, um tanto modificadas no século XIX. Foi
adquirido no século XVIII por ordem do Marquês de Pombal para sediar
a Real Fazenda. Destacam-se suas sacadas no piso superior, seu portal de pedra
e sua sala-forte com pranchões reforçados de madeira, onde se guardava o
tesouro do Estado.
Casa de Fundição. Data de 1750 mas
recebeu várias alterações internas e externas na década de 1920, resultando em
um aspecto eclético, com uma entrada imponente em arco e colunas.
Chafariz de Cauda. Grande fonte
pública de porte arquitetural, com frontão em volutas e pilastras terminadas em
pináculos.
Chafariz da Carioca. Fonte de
pedra quase enterrada no solo, sendo a primeira construída na cidade. Tem um
frontão simples em triângulo.
Casa do Bispo. Grande casarão de
características coloniais.
Casa de Cora Coralina.
Residência da famosa poetisa de Goiás, também no estilo colonial típico,
datando do fim do século XVIII. Além destes monumentos o Centro Histórico
possui um expressivo casario dos séculos XVIII e XIX.
Devido à sua localização às margens do rio
Vermelho, o Centro Histórico tem sérios problemas para sua conservação,
sofrendo enchentes periódicas. Em fins de 2001, pouco depois de sua declaração
como Patrimônio da Humanidade, o Centro foi inundado, vários edifícios
históricos desabaram e a cidade entrou em estado de calamidade pública. Em
2011 fortes chuvas fizeram outros estragos.
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